Uma dificuldade para aprender a ler e a escrever pode comprometer não só o processo de alfabetização de crianças e adolescentes, mas também a autoestima e a socialização. Considerada o distúrbio de aprendizagem mais comum, a dislexia é uma condição neurobiológica que afeta diretamente a capacidade de leitura. Cerca de 10% da população mundial convive com o distúrbio.
Por ter um impacto extremamente relevante no desenvolvimento, orientar e informar famílias e professores a respeito da dislexia pode mudar completamente o destino dos mais jovens. A partir de um diagnóstico precoce, é possível promover intervenções logo nos primeiros anos escolares, o que pode diminuir as limitações em decodificação dos símbolos.
O que é dislexia?
A dislexia é uma condição genética e hereditária, portanto, caso haja pessoas na família com esse distúrbio diagnosticado, existe possibilidade de o gene passar para as próximas gerações. Não há consenso sobre o que causa essa limitação, mas a comunidade científica acredita que exista alguma modificação cromossômica que vai afetar as trocas neurotransmissoras nas atividades de leitura e escrita.
O psicólogo Luiz Gustavo Simi, pesquisador e coordenador de projetos da Associação Brasileira de Dislexia, afirma que há uma diferença importante de funcionamento no cérebro daqueles que têm dislexia para os que não têm. De acordo com Simi, exames de ressonância magnética conseguem provar que, nos disléxicos, a região do lobo temporal, que tem como uma de suas funções a aprendizagem, não ativa em atividades de leitura e escrita.
— Entretanto, todas as outras regiões do nosso cérebro compensam essa ausência do lobo temporal, mas eles não são responsáveis por desempenhar essas tarefas. Isso faz com que, na prática, ocorram as trocas, omissões, inversões, aglutinações das letras, tanto na leitura quanto na escrita — explica.
Sinais de dislexia
O disléxico não tem nenhum problema de cognição, sua limitação se reserva especificamente à decodificação de símbolos, letras e números. Por isso, uma das premissas para diagnosticar a dislexia é a alfabetização concluída, mesmo que esse processo demore muito mais na comparação com quem não sofre do distúrbio.
Antes do período escolar, essa limitação pode se apresentar na forma de falta de atenção, atraso no desenvolvimento da fala, dificuldade em aprender rimas e músicas. Durante o aprendizado de leitura e escrita, as limitações se mantêm e podem ser observadas mais claramente em atividades que envolvem a escrita e a leitura, como copiar livros ou quadros, por exemplo. A pobreza de vocabulário e elaboração de frases curtas e imaturas ou longas e vagas, além de fraco conhecimento de rimas ou de aliterações (palavras com sons iguais no início), também são indícios.
Uma das disfunções da dislexia é o déficit fonológico, que é a dificuldade de associar as letras aos sons, especialmente aquelas que têm mais de uma sonoridade, casos de s, z, r, c, x, por exemplo.
O desenvolvimento da coordenação motora fina e grossa também é um desafio para os disléxicos. Portanto, aprender a desenhar e pintar, assim como a execução de movimentos de dança e ginástica também podem ser atividades mais complexas, assim como distinguir esquerda e direita.
Diagnóstico e intervenções
A confirmação de um caso de dislexia passa pela avaliação de uma equipe multidisciplinar, envolvendo profissionais das áreas da fonoaudiologia, psicologia, neuropsicologia e psicopedagogia. Também são feitos exames e uma série de testes.
— Vale ressaltar que um dos critérios para o diagnóstico de dislexia é o nível de inteligência. A gente tem a informação de que 62% dos pacientes apresentam um nível de inteligência acima da faixa etária. Ou seja, são pessoas que possuem todos os recursos cognitivos e intelectuais preservados.
O termo mais adequado para as ações que promovem uma melhora na qualidade de vida de um disléxico é intervenção e não tratamento, já que esta condição não é considerada uma doença. Após o diagnóstico, as famílias são orientadas a buscarem o acompanhamento de profissionais capacitados em uma série de treinamentos que buscam estimular o cérebro a funcionar de uma forma diferente.
— A intervenção fonoaudiológica tem que ser periódica e sistemática, tem que acontecer toda a semana, no mínimo uma vez, para que o paciente seja submetido a um treino, que vai fazer com que, mediante as estratégias e alternativas propostas, esse cérebro passe a criar novas conexões para utilizar cada vez mais o lobo temporal. Quanto mais a criança ou adolescente passar a usar o lobo temporal, menos ela vai errar e maior vai ser a sua confiança — afirma Simi.
Conscientização
O psicólogo Simi afirma que uma pesquisa mundial apresenta o dado de que 60% das pessoas com dislexia não têm o diagnóstico formalizado. O psicólogo entende que essa estatística revela que há pouca informação sobre a condição e, consequentemente, dificulta o trabalho de conscientização sobre a dislexia, que seria a chave para evitar o sofrimento de tantas pessoas.
Produção: Állisson Santiago