Um mês após o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubar, em decisão histórica, a restrição de que homossexuais doem sangue, a prática ainda é uma barreira encarada pela comunidade gay. Hemocentros e hospitais têm recusado a coleta quando o doador homem responde “sim” à pergunta: “Você teve relações sexuais com outros homens nos últimos 12 meses”?
O estudante Mathias Menezes experimentou a frustrante tentativa no último dia 13, no Hospital de Clínicas. Aos 25 anos e distante de grupos de risco de covid-19, decidiu doar pelo respaldo do Supremo, mas saiu do prédio com uma resposta negativa. “Enquanto muito sangue poderia ser utilizado para salvar vidas, eles apenas desperdiçam isso por uma abordagem retrógrada e de desrespeito ao ser humano. Até quando?”, desabafou nas redes sociais.
— Parece uma coisa tão básica, enquanto cidadão, mas, na realidade, não temos os mesmos direitos dos demais. Me senti constrangido, como se estivesse fazendo alguma coisa errada. Dá a sensação de que gays são alienígenas – ressente-se.
Relatos semelhantes têm chegado ao movimento LGBT Somos. O argumento para a recusa está na portaria do Ministério da Saúde que ainda proíbe a doação, apesar do entendimento do STF. As regras seguem ancoradas na ideia de que há maior incidência de HIV e comportamentos de risco nessa comunidade, o que aumentaria a possibilidade de contaminação de receptores.
— É preciso mentir se quiser ajudar a salvar uma vida ou a repor o estoque de um banco de sangue? — questiona Gabriel Galli, um dos coordenadores do Somos.
Procurado, o Ministério da Saúde informou que a coleta de sangue de homossexuais será permitida assim que sair o acórdão – a decisão final de um tribunal superior – do Supremo. O STF afirmou que não há prazo para a publicação do documento. Pelo regimento, teria de ser tornado público até 60 dias após o julgamento.
Já a Secretaria da Saúde do Estado disse, em nota, que a mudança nos critérios de doadores depende de manifestação da Coordenação-Geral de Sangue, vinculada ao ministério, e da consequente mudança na legislação sanitária.