Mesmo no Brasil, onde a confiança na eficácia das vacinas é alta, segundo a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), a disseminação das fake news tem resultado em questionamentos sobre a real necessidade de imunizar crianças e também da importância de novas doses para os adultos.
— A circulação de informações é mais rápida do que a capacidade e a disponibilidade das pessoas de serem mais criteriosas. Muitos ficam sem saber o que fazer, até porque é mais fácil acreditar em uma notícia falsa do que ir atrás da informação correta. Acreditar no absurdo não é novo, o novo é a capacidade de disseminação das fake news — salienta a pediatra Isabella Ballalai, presidente da SBIm.
Isabella explica que ter a vacinação como alvo é algo especialmente prejudicial porque, mesmo que as notícias falsas convençam apenas uma pequena parcela da população, a eficácia de toda uma campanha acaba afetada.
— Esse tipo de notícia, quando não acaba levando à não vacinação, pode causar um atraso na imunização de muitas pessoas. Isso resulta em uma não homogeneidade na cobertura vacinal, elevando os riscos de transmissão de doenças contagiosas — diz a pediatra.
O avanço desses movimentos há alguns anos tem preocupado o Ministério da Saúde, que observou queda no índice de cobertura de alguns imunizantes oferecidos no Sistema Único de Saúde (SUS). Em 2016, por exemplo, a cobertura da segunda dose da vacina tríplice viral, que protege contra sarampo, caxumba e rubéola, não teve adesão de 23,3% do público-alvo.
Esse tipo de notícia pode causar um atraso na imunização de muitas pessoas, elevando os riscos de transmissão de doenças contagiosas.
ISABELLA BALLALAI
presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm)
— Notícias falsas fazem um estrago danado. A vacinação, nas últimas duas décadas, preveniu mais de 30 milhões de óbitos. A OMS calcula que, a cada ano, haja redução de dois a três milhões de mortes graças à imunização. Então, recomendamos que, quando as pessoas virem notícias que procurem promover o pânico, se informem melhor junto aos órgãos oficiais, com sociedades científicas, para ter informações verdadeiras — diz a também pediatra Ana Goretti Maranhão, do programa de imunização do Ministério da Saúde.
A representante do Ministério da Saúde avalia que o grande perigo da disseminação de fake news é a possibilidade de que doenças historicamente erradicadas no Brasil voltem a ser registradas. Isso porque, mesmo com a erradicação do vírus em um país, a existência da doença em qualquer parte do mundo, devido à globalização, torna possível que o vírus volte a se espalhar. O fato de não termos tido contato com doenças como a poliomielite nos últimos anos, defendem as autoridades, não deve fazer com que a sociedade baixe a guarda em relação à imunização.
Depois que se espalha...
O caso de um pesquisador britânico representa bem o que uma notícia falsa pode fazer. Em 1998, o médico Andrew Wakefield publicou na revista científica The Lancet que a vacina da tríplice viral — que protege contra caxumba, sarampo e rubéola — estava relacionada ao desenvolvimento de uma síndrome intestinal e sintomas de autismo em crianças. Em 2010, foi descoberto que Wakefield havia forjado os dados da pesquisa, o que resultou na sua perda de registro para atuar e em um processo criminal. Mas o estrago na saúde pública, especialmente no Reino Unido e nos Estados Unidos, já estava feito, e até hoje circulam informações falsas de que vacinas podem causar autismo.
Cuidado!
Médicos reforçam o apelo para que os pacientes discutam com profissionais especializados as possíveis alternativas para seus problemas, jamais abandonando o tratamento recomendado ou deixando os medicamentos indicados de lado em favor das informações vistas em alguma notícia circulando online.
Recomendações
Acredite em notícias publicadas por órgãos oficiais de saúde e sociedades médicas.
Procure sempre conferir em mais de uma fonte, principalmente em temas polêmicos ou de grande repercussão, como uma possível cura para o câncer.
Diante de uma solução mágica para uma doença, converse com seu médico. Mostre para ele o que viu e pergunte se — e por que — aquilo não funciona.
Desconfie de
Mensagens alarmistas: "A verdade que o Ministério da Saúde não quer que você saiba".
Informações teoricamente exclusivas que não encontram repercussão em veículos sérios: "Vazaram informações secretas da OMS que a mídia tenta esconder".
Textos que colocam em dúvida campanhas consagradas de autoridades de saúde: "Governo distribui vacinas porque quer que você adoeça".
Supostos depoimentos de pessoas curadas por um tratamento sem qualquer comprovação científica: "O suco natural que me livrou do câncer".
Informações creditadas a "um amigo que trabalha na Fiocruz", por exemplo, que não citam claramente a fonte.