A tragédia climática no Rio Grande do Sul afetou mais de 2,1 milhões de pessoas. Centenas de milhares delas tiveram que deixar suas casas em função da chuva intensa e do avanço dos rios que inundaram bairros em quase 90% dos municípios gaúchos. Com a possível redução do nível da água nas próximas semanas, quem ficou desabrigado poderá voltar para sua residência, mas precisará adotar diversos procedimentos para tentar recuperar seu lar com segurança.
Pensando nisso, a Unisinos elaborou um guia com dicas de cuidados ao retornar para casa, com o objetivo de melhor instruir as pessoas que passarão por este momento.
— O guia foi feito por uma equipe multidisciplinar da Universidade pensando em acolher e auxiliar os colaboradores da Unisinos que foram afetados, mas também as outras pessoas, dando algumas orientações sobre o que fazer no momento da volta para casa após a enchente, no quesito saúde, limpeza, contato com a água, alimentação, energia e etc. A ideia é dar apoio bio-psico-social às pessoas e fortalecer as famílias em um momento de dor — afirma Miriam Ferragini Müller, assistente social da Unisinos.
Volta para casa
Se certifique de que é seguro voltar e de que a área está de fato liberada pelas autoridades locais. Preste atenção se não há postes ou fios elétricos caídos no entorno da sua residência. Para evitar choques elétricos, também é essencial se certificar de que a eletricidade da residência está desligada.
Para proteger sua saúde, também evite contato direto com a água e a lama, sempre se protegendo com luvas, botas e máscaras. Caso não tenha os itens recomendados, improvise com sacos plásticos.
Avalie a residência
Mantenha a residência arejada e faça uma avaliação de quais imóveis e objetos podem ser recuperados. Aqueles que têm superfícies absorventes devem ser descartados, como é o caso de colchões e sofás. Já estruturas que não têm superfície absorvente, como metais e vidros, podem ser reutilizados após higienização com água e sabão e desinfecção com álcool 70% ou solução de água sanitária.
Pisos, paredes e bancadas que tiveram contato com água e lama da enchente devem ser higienizados com água e sabão e desinfetados com solução de água sanitária.
Cuidado com vetores e pragas urbanas
Enchentes e alagamentos costumam favorecer o surgimento de vetores e pragas urbanas causadoras de doenças. Por isso, é importante verificar se não há animais peçonhentos, como cobras, aranhas e escorpiões, antes de entrar em casa - lembre-se que eles podem estar em qualquer parte da residência, principalmente em lugares escuros.
Para evitar o aparecimento de ratos, baratas e mosquitos transmissores de doenças, é recomendado armazenar alimentos em recipientes fechados ou lacrados, jogar o lixo fora periodicamente em sacos plásticos e local adequado, vedar buracos e vãos que possam servir de entrada e abrigo para roedores e outras pragas, e não deixar água acumulada em nenhuma parte da casa ou do quintal.
Além disso, deve-se limpar o interior e os arredores da casa usando luvas, botas e calças compridas. Em caso de infestações, é indicado procurar assistência na prefeitura de sua cidade. Já se ocorrer um acidente, como ser picado pelo animal, é preciso solicitar atendimento médico o mais rápido possível e permanecer em repouso. Lave o local com água e sabão e mantenha o membro mais elevado do que o restante do corpo.
Hora da limpeza
Utilize produtos de limpeza com embalagens íntegras, seguindo as instruções dos rótulos. Tudo que for utilizado para fazer a higienização dos locais e dos objetos (como panos e vassouras) deve ser descartado após o uso, devido ao risco de contaminação. Não use produtos caseiros ou sem procedência, pois não os mesmos não têm eficiência comprovada e podem causar intoxicação.
Para limpeza, utilize água e sabão. Mas se o intuito for desinfetar faça uma solução de água sanitária com água potável: para cada litro de água, adicione duas colheres de sopa (20 ml) de água sanitária.
Avalie os reservatórios de água
Se a sua casa tiver poço ou cisterna, antes de consumir a água procure um especialista para que análises laboratoriais garantam que ela está potável. Já se você possui caixa d’água, limpe-a com água e sabão e, depois, desinfete-a.
Para limpar a caixa d’água e demais recipientes de armazenamento, o primeiro passo é retirar toda a água. Depois, higienize utilizando água potável/filtrada e sabão. Encha novamente com água potável/filtrada e adicione duas colheres de sopa de água sanitária para cada litro de água. Feche o recipiente, deixe repousar por 30 minutos e depois lave abundantemente com água potável/filtrada.
Atenção ao consumir água
Durante uma inundação, é possível que a água não esteja em condição adequada de consumo em algumas residências. Isso exige que sejam adotados procedimentos básicos para garantir sua qualidade, já que a ingestão de água contaminada pode causar diarreias e doenças parasitárias. Se você não conseguir contatar os órgãos competentes para a análise da sua água, é possível tomar algumas medidas para consumi-la de forma segura:
- Não beba se a água estiver turva;
- Sempre filtre e ferva a água antes de beber. Para filtrar, utilize filtro doméstico, coador de papel ou pano limpo;
- Caso não possa fervê-la, trate a água para consumo com hipoclorito de sódio (2,5%): para cada litro de água, adicionar duas gotas de hipoclorito de sódio e deixar repousar por 30 minutos. Esse tempo de repouso é o que garante a eliminação da bactéria.
Cuidados com alimentos
Não é recomendado consumir alimentos que tiveram contato com a água ou a lama de enchentes e que ficaram sem refrigeração por mais de duas horas. Então, faça uma limpa nos armários e na geladeira. Frutas, legumes e verduras que estiverem aptas para consumo devem ser higienizadas e desinfetadas com solução de água sanitária.
Não se deve utilizar água sanitária que contenha alvejante e perfume para desinfetar alimentos, água e recipientes que armazenam água para consumo humano. Já no preparo de refeições, utilize apenas água potável.
Doenças e ferimentos
O contato com água contaminada oferece riscos à saúde. Uma das doenças mais preocupantes nesse cenário é a leptospirose, uma enfermidade infecciosa transmitida pela exposição direta ou indireta à urina de animais – principalmente ratos – infectados pela bactéria Leptospira. A contaminação humana ocorre por meio de cortes ou arranhões, dos olhos, nariz ou boca.
O período de incubação – intervalo entre a transmissão da infecção até o início das manifestações dos sinais e sintomas – varia de um a 30 dias. Portanto, além de tomar banho após o contato com a água, é preciso ficar atento aos sinais. Se apresentar febre, dor de cabeça e dor no corpo, procure um atendimento médico.
Em caso de ocorrer alguma lesão na pele (corte, ferimento, perfuração) por objeto metálico durante a limpeza ou acesso à residência, também é indicado procurar com urgência o serviço de saúde mais próximo para tratar o machucado e tomar a vacina contra o tétano.