Na contramão do cenário global, o Brasil registrou um aumento médio de 6% ao ano na taxa de suicídio entre jovens, no período de 2011 a 2022. Já os índices de notificações por autolesões na faixa etária de 10 a 24 anos cresceu 29% a cada ano nesse mesmo intervalo de tempo. Esses dados foram evidenciados por um estudo desenvolvido pelo Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), em colaboração com pesquisadores de Harvard, e publicado na The Lancet Regional Health – Americas, na última quinta-feira (15).
Conforme a pesquisa, os números envolvendo jovens são maiores do que aqueles relacionados à população geral — nesse segundo grupo, a taxa de suicídio teve crescimento médio de 3,7% ao ano, enquanto a de autolesão foi de 21%. Para obter os resultados, a equipe de pesquisadores analisou informações do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Sistema de Informações Hospitalares (SIH) e do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan).
De 2011 a 2022, o Brasil registrou 147.698 suicídios, 720.480 notificações de automutilação e 104.458 internações por automutilação, sendo que os dois primeiros tópicos apresentaram crescimento. Adultos do sexo masculino (25 a 29 anos) e idosos (mais de 60 anos) são os mais afetados pelo suicídio, mas os maiores aumentos percentuais foram observados entre os jovens.
Flávia Jôse Alves, pesquisadora do Cidacs/Fiocruz e da Harvard Medical School, explica que o objetivo do estudo foi avaliar se havia uma mudança no padrão de crescimento dessas taxas de notificações, internações e mortalidade ao longo do tempo. Por isso, utilizaram essas três bases de dados públicas.
— Vimos que as taxas de suicídio estão aumentando ao longo do tempo, com um padrão constante de crescimento. Vem crescendo de 2011 até o final da série e o que chama a atenção é o crescimento nas faixas etárias mais jovens. Mas, analisando essas três bases, também conseguimos ver que há uma iniquidade de acesso aos serviços de saúde, por exemplo — aponta a líder da investigação.
A desigualdade citada por Flávia está relacionada aos indígenas — o estudo também avaliou os números de cada raça e etnia no país. A pesquisadora ressalta que, mesmo tendo as maiores taxas de notificação de automutilação e suicídio, esse grupo possui os menores índices de hospitalização na comparação com a população geral. Isso evidencia que os indígenas têm uma maior dificuldade para chegar aos serviços de urgência e emergência.
Aumento nas Américas, apesar da redução global
Na escala global, há registro de uma redução de 36% no número de suicídios em todo o mundo. Contudo, a região das Américas foi na contramão, apresentando um aumento de 17% nos casos no período de 2000 a 2019. Nesse intervalo de tempo, a taxa do Brasil cresceu 43%.
Flávia enfatiza que esses dados são de estudos anteriores e acrescenta que há uma escassez em alguns países, que não conseguem coletar essas informações, principalmente de autolesões que não tenham um desfecho total. Diante disso, chama a atenção para a existência das bases de dados brasileiras e para a necessidade de adotar medidas específicas para os grupos mais atingidos.
— A Organização Mundial de Saúde (OMS) coloca que uma das questões principais é ter esses dados. Precisamos ter e o Brasil tem. E essa análise mostra que as políticas públicas de prevenção e os planos de ação precisam pensar nessa perspectiva, abarcando a população geral, mas também estratégias mais focadas em populações específicas — finaliza a pesquisadora.
Procure ajuda
Caso você esteja enfrentando alguma situação de sofrimento intenso ou pensando em cometer suicídio, pode buscar ajuda para superar este momento de dor. Lembre-se de que o desamparo e a desesperança são condições que podem ser modificadas e que outras pessoas já enfrentaram circunstâncias semelhantes.
Se não estiver confortável em falar sobre o que sente com alguém de seu círculo próximo, o Centro de Valorização da Vida (CVV) presta serviço voluntário e gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio para todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo e anonimato. O CVV (cvv.org.br) conta com mais de 4 mil voluntários e atende mais de 3 milhões de pessoas anualmente. O serviço funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados), pelo telefone 188, e também atende por e-mail, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil (confira os endereços neste link).
Você também pode buscar atendimento na Unidade Básica de Saúde mais próxima de sua casa, pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), no telefone 192, ou em um dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) do Estado. A lista com os endereços dos CAPS do Rio Grande do Sul está neste link.