O último mês do ano chega e os primeiros versos da canção que se tornou clichê no período não vêm apenas aos ouvidos em lojas de departamento: “então, é Natal, e o que você fez?”. Por simbolizar uma mudança de ciclo, se tornou comum refletir sobre os projetos de vida desenvolvidos e aqueles que não saíram do papel. Este segundo caso pode ocasionar sensações que levem à ansiedade, frustração e, até depressão. Especialistas já chamam a síndrome de fim de ano de “dezembrite”.
Para muitas pessoas, é neste curto espaço de tempo, próximo à virada de ano, que se faz a leitura do que foi vivido nos últimos 12 meses. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que o Brasil é o país com o maior número de pessoas ansiosas: 9,3% da população. Eventuais não cumprimentos de algumas resoluções elaboradas no ano anterior podem trazer situações e pensamentos negativos, potencializando este cenário. Pode ser desde uma dieta não iniciada, um curso não concluída ou uma conquista desistida no meio do caminho.
Segundo a psicóloga Aline Tayná de Carvalho, este momento em que se idealiza resolver problemas pessoais e profissionais para organizar o ano seguinte traz desgastes físicos e emocionais.
— Assim como o fim do ano representa alegria, conquistas e comemorações, também pode trazer tristeza, frustração, decepção, entre outros sentimentos, que interferem diretamente no desempenho pessoal e na qualidade de vida.
Para Aline, é importante se atentar aos sinais que corpo e mente dão sobre as pressões e expectativas que criamos no fim do ano, de que é preciso encerrar esse ciclo com sucesso e suprir todas as expectativas próprias e também do outro:
— Não é um mês ou uma época do ano que vai nos dizer se alcançamos ou não nossos objetivos, mas a forma como vivemos cada etapa, e como nos sentimos ao longo de cada conquista. Por isso, estipule pequenas metas, priorize sua saúde, pratique atividade física e busque ajuda profissional ao perceber sinais que têm interferido em seu bem-estar, pois nossa saúde é um bem precioso e precisamos colocá-la como prioridade — sugere a especialista.
Corpo responde à pressão
A “dezembrite” pode desencadear diversas manifestações corporais típicas da ansiedade. Entre os sintomas, costumam aparecer irritabilidade, falta de ar, palpitação, náuseas, dores de cabeça, pensamentos acelerados, atitudes compulsivas, angústia, que interferem diretamente no cotidiano.
— Diante de tais sinais, precisamos estar atentos para que a ansiedade não avance para um quadro depressivo e/ou, no contexto de trabalho, para a Síndrome de Burnout — alerta a psicóloga Aline.
Redes sociais contribuem
O psicólogo Rodrigo Collares classifica esse período do ano como uma “dança emocional entre a celebração e a introspecção”, em que as festividades simbolizam mais do que simples comemorações.
— O peso do tempo passado e as expectativas do futuro convergem, criando um espaço para questionamentos profundos sobre autorrealização e propósito.
Segundo ele, as redes sociais ocupam papel de destaque neste cenário, pois nelas é possível observar expressões públicas de felicidade, alegria e gratidão, desencadeando uma retrospectiva coletiva onde as façanhas positivas ganham especial destaque.
— No entanto, para aqueles que enfrentaram duras adversidades ao longo do ano, essa exposição virtual pode servir como um espelho que reflete as conquistas alheias e, também, as sombras de suas próprias dificuldades. Esse contraste, muitas vezes, instiga um profundo exame interno, precipitando uma crise de ansiedade, depressão ou angústia — explica.
Menos cobrança
Collares enfatiza que a transição para o ano novo impõe uma ponderação simultânea sobre o futuro e o passado, o que pode ser um processo doloroso para muitas pessoas.
— Essas questões emergem de forma significativa no consultório nessa época do ano, além de, sem dúvida, haver aumento na busca por terapia — relata o psicólogo.
O especialista indica a busca por auxílio profissional se sintomas de ansiedade se intensificam e se tornam recorrentes.
— É muito importante que as pessoas tirem o peso que as situações ritualísticas têm. Trace suas metas com calma, evite autocobrança ou comparações, e se cuide com carinho, preze por um ritual de autocuidado generoso consigo mesmo — orienta.