A chegada do frio em Porto Alegre prevista para os próximos dias tem colocado em alerta autoridades médicas que atuam na pediatria. Isso porque nas últimas semanas, antes mesmo do período tradicional de internações por doenças respiratórias, a demanda por atendimento nas emergências pediátricas já é considerada alta.
GZH consultou três dos principais hospitais pediátricos da capital gaúcha. Todos eles afirmam ter notado um movimento acima do normal para o período de outono. Em alguns casos, as instituições já operam com superlotação.
No Hospital de Clínicas, desde o início de abril, o número de crianças internadas é superior à quantidade de leitos disponíveis. Até a última segunda-feira (18), havia 20 atendimentos para nove leitos, uma taxa de ocupação de 222%. A chefe do Serviço de Emergência e Medicina Intensiva Pediátricas do Clínicas, Patrícia Miranda do Lago, chama a atenção para a antecipação do aumento de doenças respiratórias, movimento que normalmente ocorre em maio, mas que, desta vez, está acontecendo desde março. Segundo ela, trata-se de uma tendência global, e que ainda está sendo investigada.
— Ainda não se sabe exatamente se essa antecipação está relacionada ao baixo índice de vacinação, ao aumento da agressividade dos vírus, ou ainda reflexo da pandemia. Não há um um fator único, mas o que sabemos é que não é um fenômeno isolado e tem ocorrido em vários lugares do mundo — explica.
A procura antecipada por atendimento se reflete também em outras emergências da Capital. No Hospital da Criança Santo Antônio, do Complexo Hospitalar da Santa Casa, foram registrados 3,2 mil atendimentos no mês de março, número 120% maior do que o que é considerado normal nesse período. Em 10% desses casos, foi necessária internação.
A maioria das crianças que tem chegado às emergências nas últimas semanas foi contaminada pelo chamado vírus sincicial (VSR), causador de doenças como a bronquiolite, uma inflamação aguda dos bronquíolos terminais, que são pequenas ramificações que conduzem o ar para dentro dos pulmões. Uma das características que mais preocupa a diretora médica adjunta do hospital Santo Antônio, Aline Medeiros Botta, é a grande quantidade de recém-nascidos, com até três meses de vida, que são encaminhados em estado grave.
— Quem está todos os dias na emergência observa que aumentou significativamente o número de bebês internados. Vemos que as pessoas passaram de uma fase de preocupação extrema na pandemia de cuidados com as crianças para uma despreocupação. A gente vê nas redes sociais fotos de bebês recém-nascidos em festas de aniversário ou bebês recém-nascidos recebendo visita de criança de seis meses. Não podemos ter esse tipo de situação. Durante o inverno, recém-nascidos não devem receber visitas, nem ir a lugares fechados com muita gente, pelo menos até os três meses de idade.
O coordenador da emergência do Hospital da Criança Conceição, José Roberto Saraiva, destaca outro fator para que as emergências fiquem sobrecarregadas. Segundo ele, muitos pais levam seus filhos para os hospitais quando sintomas leves se manifestam. Nesses casos, a orientação é que sejam buscadas Unidades de Básicas de Saúde (UBS). Em Porto Alegre, são 130 postos espalhados pela cidade.
— É fundamental que haja um trabalho de orientação para as famílias, pois muitas até vão para os postos, mas depois acabam indo para as emergências mesmo quando não há necessidade. Caso continue assim, é uma questão de tempo para que os hospitais entrem em colapso — afirma o coordenador do hospital, que registrou, nos últimos 30 dias, um aumento de 50% no número de internações.
Operação Inverno
Em um contexto de aumento das internações em emergências adultas e pediátricas, a prefeitura de Porto Alegre pretende dar início no mês de maio a chamada Operação Inverno, ação anual que busca reforçar a quantidade de leitos e de pessoal durante os meses mais frios do ano.
Para esse ano, a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) busca disponibilizar 150 leitos clínicos para reforçar o atendimento para adultos e crianças. O número que será destinado para cada segmento ainda não foi definido. Também está em andamento o processo para recrutar profissionais que irão trabalhar de forma provisória nas emergências. A data de início da operação deverá ser divulgada ainda neste mês.
— Nós estamos observando o aumento nas Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs), embora ainda não seja tão expressivo. Mas sabemos que no inverno vai se acentuar, e estamos buscando dar início a operação o quanto antes — declara o Diretor de Atenção Ambulatorial Hospitalar e Urgências da secretaria, Favio Tellis.
Restrições no Vale do Sinos
No Rio Grande do Sul, já existem hospitais que necessitam restringir as atividades nas emergências pediátricas em razão da alta demanda. É o caso do Hospital Regina, em Novo Hamburgo. Desde a última sexta-feira (14), estão sendo priorizados apenas casos graves.
Segundo o hospital, na última semana houve um aumento significativo da procura por atendimento no hospital. A instituição acredita que o motivo seja a mudança de temperatura. Ainda não há prazo para acabar a restrição. A orientação é que pais e responsáveis de crianças que apresentem sintomas mais leves procurem um pediatra ou uma clínica de saúde de referência.