Depois de uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) identificar alto risco de desabastecimento de insulina análoga de ação rápida no Sistema Único de Saúde (SUS) a partir de maio, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) do Rio Grande do Sul informou que, no momento, está com o fornecimento de insulina regularizado.
Em nota enviada à reportagem de GZH, o Ministério da Saúde confirmou que há dificuldade para aquisição do medicamento, que é utilizado no tratamento de diabetes tipo 1, mas afirmou que a situação está sendo tratada com “máxima prioridade” para garantir o atendimento da população.
O relatório do TCU, que foi publicado na semana passada, atrela o risco de falta da insulina ao fracasso por ausência de propostas de dois pregões, realizados em 23 de agosto de 2022 e em 26 de janeiro deste ano, para aquisição do medicamento; ao estoque insuficiente do produto; e à dificuldade em adquirir novas unidades. A auditoria foi realizada por solicitação do Congresso Nacional “para investigar eventuais irregularidades existentes nas compras, entregas e armazenamento” dos medicamentos utilizados no tratamento do diabetes.
Na segunda-feira (3), o Ministério da Saúde também emitiu uma nota informativa sobre o assunto aos Estados. O documento esclarece que diversos tipos de insulina estão disponíveis para o tratamento do diabetes tipo 1, incluindo as humanas e as análogas. A tecnologia incorporada ao SUS é a insulina análoga de ação rápida, em caneta, que abrange as substâncias descritas como listro, asparte e glulisina, administrada nas refeições ou quando há necessidade de pronta correção dos níveis de glicose no sangue.
A nota afirma que foi realizada a distribuição do medicamento para abastecimento de todas as unidades federativas no primeiro trimestre deste ano. Depois disso, o estoque remanescente foi distribuído de forma equitativa a todos os Estados, permitindo o abastecimento da rede até o final de abril, considerando os dados das Secretarias Estaduais de Saúde informados em fevereiro.
Estoques no RS
Questionada sobre a situação dos estoques gaúchos, a SES informou que a insulina é distribuída pelos municípios aos usuários. Por isso, a reportagem de GZH consultou a situação de algumas cidades para verificar a quantidade de unidades disponíveis e o número de pacientes atendidos pelo SUS.
Na terça-feira (4), a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Porto Alegre informou que o Centro Logístico de Medicamentos Especiais recebe os medicamentos provenientes da SES e que a reposição do estoque de termolábeis ocorre a cada 10 dias. De acordo com a nota, o estoque de insulina na Capital é suficiente para atendimento da demanda dos pacientes com processo ativo (725 pessoas) até a próxima reposição, com exceção da insulina lispro. O município afirmou que não recebeu nenhum comunicado ou resposta aos seus questionamentos sobre o assunto.
Em Caxias do Sul, as insulinas são entregues aos 323 pacientes que utilizam pela Farmácia Especializada. De acordo com a Secretaria de Saúde do município, há uma entrega de unidades prevista para ocorrer na próxima quarta-feira, 12 de abril. O quantitativo em questão é suficiente para um mês de tratamento, ou seja, o município ainda não registra falta. A SMS de Caxias também informou que, até terça-feira, não havia recebido comunicados sobre eventual desabastecimento.
A Secretaria de Saúde de Canoas também informou que a farmácia do município havia buscado mais unidades de insulina com o Estado e que até quarta-feira tinha estoque do medicamento. De acordo com a assessoria, há em torno de 120 pessoas com processos administrativos para obter insulina “e todos esses sempre têm a garantia do recebimento do medicamento”.
Em Santa Maria, esses medicamentos são dispensados aos usuários pelas farmácias SUS do município (Farmácia Municipal Central e Farmácia Distrital Wilson Paulo Noal). No total, 320 pessoas utilizam a insulina de ação rápida e, atualmente, a cidade conta com 836 canetas em estoque, o que seria suficiente para cerca de um mês e meio. Em relação ao risco de falta, o município informou que não recebeu nenhum comunicado sobre possível desabastecimento.
Já a 3ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS), que abrange 21 municípios gaúchos, como Pelotas e Rio Grande, afirmou que tem insulinas em estoque para atender todo o mês de abril. No total, 402 pacientes da região recebem o medicamento. A 6ª CRS, por sua vez, que envolve cidades como Passo Fundo e Carazinho, informou que é abastecida com insulinas mensalmente e que repassa os medicamentos para suas 62 cidades com essa mesma frequência. Atualmente, segundo a coordenadoria, os municípios estão abastecidos, no mínimo, até o final da primeira quinzena deste mês, "quando começaremos a distribuir novamente o que vamos receber”.
Entenda o caso
De acordo com o relatório do Tribunal de Contas da União, em resposta aos questionamentos realizados pela equipe de auditoria sobre a estimativa dos meses de duração do estoque atual de insulinas, o Departamento de Assistência Farmacêutica do Ministério da Saúde informou que possuía 196.015 unidades de insulina análoga de ação rápida 100 U/mL, o que é equivalente a 28 dias da programação de distribuição do segundo trimestre de 2023. Por outro lado, há um total de 638.255 unidades aprovado para todas as unidades federativas.
O documento destaca que o estoque atual já é decorrente de aditivos realizados aos contratos atuais e, por isso, a quantidade disponível atende somente às necessidades de abril, “havendo real possibilidade de desabastecimento a partir do mês de maio”. No entanto, acrescenta que, diante do fracasso dos pregões, o Ministério da Saúde iniciou um processo de dispensa de licitação emergencial para aquisição de 1.346.826 unidades do produto em 31 de janeiro deste ano, com o objetivo de atender a demanda da rede SUS por um período estimado de 180 dias.
Questionado sobre o assunto na segunda-feira (3), o Ministério da Saúde informou que, “atualmente, a rede de serviços do SUS está abastecida com as insulinas de aquisição do Ministério da Saúde para tratamento de diabetes”. Já nesta quinta (6), a pasta confirmou a dificuldade de aquisição do medicamento, afirmando que, “por falta de capacidade de oferta dos fornecedores internacionais com registro no Brasil, não foram apresentadas propostas para atender à demanda do Ministério da Saúde nos pregões abertos pela pasta”.
Diante da situação, o Ministério disse ter realizado um pregão emergencial para a compra de empresas com registro em agências internacionais qualificadas de regulação sanitária e certificadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) que puderam participar junto com as que possuem registro no Brasil, além de estar elaborando, em parceria com os Estados, “um levantamento dos estoques e processos vigentes de compra para acompanhar todo processo com transparência”. A pasta também afirmou que pode ressarcir os Estados mediante compras descentralizadas.
O Ministério da Saúde ainda destacou que está com uma estratégia de apoio à produção local de produtos essenciais para o SUS, “que é a única forma de reduzir permanentemente a dependência em relação à volatilidade do mercado internacional”, que as insulinas regulares mais consumidas estão com estoque adequado e que a situação da insulina análoga de ação rápida está sendo tratado com “máxima prioridade junto aos fornecedores internacionais para garantir o atendimento da população”.
O documento acrescenta que o processo aquisitivo de caráter emergencial com a participação de empresas estrangeiras, que tem como objetivo atender a demanda por 180 dias, se encontra atualmente em fase de qualificação técnica, ou seja, avaliação dos documentos enviados pelas companhias. Caso as tratativas para a aquisição da caneta não tenham resultados positivos ou exijam maior tempo de execução para o atendimento da rede SUS, o Ministério da Saúde considera como alternativa para evitar o desabastecimento a aquisição de frascos de insulina, de forma excepcional, ou a substituição da insulina análoga de ação rápida pela insulina regular.
*Colaborou Rebecca Silva