Em meio à elevada cobertura vacinal, a nova onda de covid-19 causada pelas subvariantes BQ.1 e XBB em países como França, Alemanha, Reino Unido e Japão provoca menor impacto do que o registrado em outros picos. O cenário no Exterior, em momentos anteriores da pandemia, antecipou o que ocorreria no Brasil e no Rio Grande do Sul.
Em países onde essas “netas” da Ômicron causaram repique de casos, a nova onda durou de seis a oito semanas, entre setembro e novembro. Houve grande elevação no número de casos, mas aumento reduzido de hospitalizações e mortes. O impacto foi muito longe do registrado com Delta e Gama - e um pouco menor do provocado pela Ômicron original.
Na Europa, a onda em alguns países perde força, após iniciar em setembro, ou ainda mantém alta, a depender da nação. Há a particularidade de início de outono, quando a temperatura esfria, a população se mantém mais em locais fechados e a transmissão de gripe e de outras doenças respiratórias cresce.
Diversos locais recomendaram o uso de máscaras em ambientes fechados e realizaram campanhas de conscientização sobre a importância da dose de reforço, mas não houve determinação de lockdown ou restrições à movimentação, como em outros momentos.
A França, que ainda enfrenta uma nona onda de coronavírus, mantêm o uso de máscaras obrigatório em estabelecimentos de saúde e agora discute a exigência no transporte público. O último boletim semanal da Organização Mundial da Saúde (OMS), da quarta-feira passada (23), aponta que o número de casos cresceu, na semana anterior, 23% e o de mortes, 9%.
Nos Estados Unidos, vários Estados registram aumento de hospitalizações, como Califórnia, Nova York, Texas, Colorado e Indiana. No Colorado, houve crescimento de 105% no número de casos em apenas duas semanas, segundo a rede de televisão NBC.
Por outro lado, a tendência é de queda no Reino Unido, onde o número de infecções apresenta redução de 7% ao longo da semana e o de mortes, diminuição de 32,7%, segundo os dados mais recentes do governo britânico. Na Alemanha, o pico de mortes foi em 2 de novembro, com 281 mortes registradas em um dia - em setembro, eram cerca de 100 por dia, segundo dados do Our World in Data.
Na Ásia, a covid-19 mantém alta. Na China, o repique provoca protestos da população, que reclama contra a política de covid zero e rigorosas quarentenas. No Japão, o último boletim da OMS aponta que o número de casos cresceu 18% em uma semana e o de mortes, 27%.
As novas cepas trazem pouca preocupação individual a pessoas saudáveis e vacinadas, mas podem elevar o risco de indivíduos vulneráveis: idosos, imunossuprimidos, como transplantados e pessoas em tratamento para câncer, e indivíduos com calendário vacinal atrasado.
— Sabemos que, nesses países, a taxa de hospitalização e de letalidade é no mínimo 40 vezes inferior à época pré-vacinação. Algumas pessoas serão hospitalizadas e morrerão, mas não enfrentaremos um pavor como antes. As pessoas vacinadas, sem doenças importantes, não terão grande malefício, do ponto de vista individual. Mas a doença é diferente para cada pessoa — afirma o médico Eduardo Sprinz, chefe da Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).
Ele observa que o uso de máscaras deve ser recomendado para grupos de risco e pessoas que convivem com indivíduos de saúde mais vulnerável, além da atualização do calendário vacinal. Até esta segunda-feira, o Rio Grande do Sul tinha 5,9 milhões de pessoas que já deveriam ter buscado alguma das doses de reforço, segundo dados da Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS).
Dado o intervalo de tempo para crescimento, pico e redução de onda, Sprinz, que também é professor de Infectologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), espera pico da onda em dezembro.
— A gente imagina que os casos vão aumentar mais e que, a partir da sexta semana, comecem a diminuir. Isso seria na metade de dezembro. Ainda teremos um aumento de casos nas próximas duas semanas — diz o médico infectologista.
As subvariantes BQ.1 e XBB, que ocupam cada vez mais espaço no Brasil, apresentam capacidade de transmissão acima da Ômicron original, mas sem indícios de apresentarem maior letalidade.
Estudos vêm apontando que ambas as cepas escapam das defesas geradas por contaminações ou doses anteriores. As novas variantes mutam em uma área capaz de fugir da defesa de nossos anticorpos, que são a primeira linha de defesa contra o vírus no corpo.
Todavia, as vacinas ainda funcionam para mobilizar o segundo “exército” de proteção, de células T. É por isso que vacinados ou pessoas que tiveram covid-19 antes devem adquirir doença leve, mas dificilmente ficarão mal o bastante para irem ao hospital.
Para elevar o nível de anticorpos no sangue, a comunidade científica pede que a população se vacine e ainda pressiona o governo brasileiro a aprovar e distribuir as vacinas bivalentes, desenhadas contra a Ômicron e já em uso em países ricos. É uma lógica igual à das vacinas contra gripe, atualizadas todos os anos.
Em nota divulgada no dia 11, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) alertou sobre a nova onda e pediu que o governo aprove as novas vacinas e distribua medicações já aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em uso em países ricos.
O virologista Fernando Spilki, professor da Universidade Feevale, destaca que a expectativa é de um grande crescimento de casos nas próximas semanas e pede mais cuidado entre a população.
— Na Alemanha, foi uma onda com número de casos surpreendente que só perdeu para a primeira onda da Ômicron. Temos alguns motores aqui, com a movimentação da Copa e aglomerações de fim de ano. Não vai ser um surto de grande elevação, mas talvez uma epidemia um pouco mais prolongada — afirma.
E o RS?
O Rio Grande do Sul dá sinais de nova onda de coronavírus, com tendência de aumento na maioria dos indicadores, conforme dados do Ministério da Saúde fornecidos pela Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS) e analisados por GZH nesta segunda-feira (28).
Na última sexta-feira (25), o Estado voltou a registrar média móvel de mais de 1 mil novos casos por dia, o que não ocorria há três meses, desde o início de setembro. É cinco vezes o registrado no início de novembro. O número real é maior devido à baixa testagem entre a população, alertam especialistas.
As hospitalizações também estão em alta, mas em patamares distantes de outros picos. O número de leitos clínicos, para pacientes de gravidade moderada, era de 238 nesta segunda-feira - aumento de 46% em uma semana e de 193% em um mês.
Nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), para pacientes gravíssimos, eram 45 pessoas - crescimento de 18% em uma semana e de 67% em um mês. O número de mortes por coronavírus em solo gaúcho não cresceu, mantendo média de três vítimas diárias.