Voluntários que participaram de dois estudos de desenvolvimento de vacinas contra a covid-19 em Porto Alegre seguem sem o registro das doses no aplicativo ConecteSUS. Estão nessa situação pessoas que integraram testes dos imunizantes Clover e Covifenz.
O impasse ocorre porque, até o momento, os imunizantes não foram aprovados para uso, mas apenas para teste clínico, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Assim, apenas podem constar como imunizados indivíduos que receberam doses de vacinas com autorização para uso no Brasil, como é o caso da Astrazeneca e Pfizer, por exemplo. Por participar dos testes, os recrutados também não receberam o Certificado Nacional de Vacinação Covid-19 dado à população em geral.
Em outubro de 2021, o Ministério da Saúde (MS) informou que o problema seria resolvido ao assegurar que os voluntários poderiam emitir o comprovante pelo aplicativo ConecteSUS. "Para que a dose seja registrada, os imunizantes devem ter sido aprovados ou autorizados emergencialmente pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)", disse a pasta em nota à época. A aprovação não ocorreu com nenhum dos imunizantes testados na Capital. Dessa forma, os voluntários também não têm acesso ao comprovante por meio do aplicativo.
Vacina Clover
A vacina Clover, da Clover Biopharmaceuticals, da China, recrutou cerca de 12 mil pessoas no Brasil; 1,6 mil delas no Rio Grande do Sul, onde o estudo foi conduzido no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). A situação causou desconforto em alguns participantes, de acordo com o infectologista Eduardo Sprinz, responsável pelo trabalho da Clover no Clínicas. Isso ocorreu mesmo com o fornecimento de um documento que indica a participação no trabalho e que, segundo ele, é válido como um comprovante oficial de vacinação contra a covid-19.
— Fizemos uma declaração aos voluntários, mas algumas pessoas se sentiram incomodadas e foram se vacinar na rede pública. Muitos queriam ter o registro (no ConecteSUS), mas outras não achavam importante — diz Sprinz.
De acordo com o infectologista, a mesma situação ocorreu com outras vacinas antes que os imunizantes fossem aprovados pela Anvisa. Por questão de contrato, o especialista não divulga detalhes sobre os resultados do estudo da Clover, mas os define como "animadores". Foi verificado que o imunizante é capaz de produzir anticorpos contra todas as variantes do vírus, inclusive a Ômicron.
— Ela servirá muito para doses de reforço. Das que testamos, é a mais segura e a que teve menos efeito colateral, além de ter preço acessível. Há uma série de dados positivos que reforça a aprovação dela. A Organização Mundial da Saúde (OMS) ajudou no financiamento, então certamente é uma candidata a ser uma vacina para todo o mundo — explica.
De acordo com o profissional, os dados do estudo conduzido no Clínicas estão compilados e o relatório final está pronto. Agora, para dar andamento ao processo, o laboratório chinês deve submeter o material para avaliação da Anvisa. Não há um prazo para isso ocorrer.
Covifenz, da Medicago
O outro estudo conduzido em Porto Alegre foi do imunizante Covifenz, da Medicago, do Canadá. Iniciado em 2021, o trabalho envolveu 31 mil voluntários em todo o mundo. Em Porto Alegre, 1.368 pessoas foram recrutadas no Hospital Moinhos de Vento, que não teve responsabilidade pelo desenvolvimento da vacina.
Sobre a comprovação de participação nos testes, a empresa canadense diz que trabalha em cada país em que o estudo foi conduzido para obter a certificação vacinal para todos os participantes que receberam o imunizante. "No Brasil, ainda não foi realizada a submissão (do estudo) à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). E, por este motivo, uma grande parcela dos participantes deixou o estudo para receber as vacinas disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS)", disse por meio de nota.
De acordo com o laboratório, a equipe que coordena a pesquisa orientou os participantes a receberem o ciclo vacinal completo por meio do SUS e, assim, finalizar a participação no estudo, pois os dados necessários para a análise da vacina já haviam sido coletados.
"A equipe do estudo está apoiando os participantes no processo de receber a vacinação pelo SUS e as doses de reforço que forem necessárias, deste modo, cumprindo o registro no ConecteSUS", acrescenta a nota.
À reportagem de GZH, a Anvisa disse não ter responsabilidade pelo registro das doses no Certificado Nacional de Vacinação. Quanto aos imunizantes citados na notícia, o órgão esclareceu que o andamento do estudo, a previsão de conclusão dele e apresentação de dados à Anvisa depende dos pesquisadores responsáveis. O contato também foi feito com o Ministério da Saúde, que não respondeu até o momento.