Os últimos dias têm sido de preocupação para as equipes das emergências de Porto Alegre, que têm notado aumento da procura por atendimentos relacionados a doenças respiratórias somados aos casos de covid-19.
Essa percepção é reforçada por dados da Secretaria Estadual da Saúde (SES) analisados por GZH, que apontam para um crescimento do número de novos casos de coronavírus no Rio Grande do Sul desde o fim de abril, em oposição à queda que vinha sendo verificada em levantamentos anteriores. Conforme GZH mostrou no domingo, a média móvel de contaminações por covid-19 saltou 26,7% na comparação com as duas semanas anteriores.
À reportagem, a Secretaria Estadual de Saúde também informou ter registrado, até sexta-feira, 13.250 notificações de SRAG, sendo 8.369 para Sars-Cov-2 e 260 para Influenza, entre outros motivos.
Superlotação na emergência pediátrica
Patrícia Miranda Lago, chefe do Serviço de Emergência e Medicina Intensiva Pediátrica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, afirma que tem sido rotina a emergência funcionar com o dobro e até mesmo o triplo da capacidade. Na manhã desta segunda, de acordo com a médica, havia 25 crianças na emergência, que tem nove leitos. A maioria dos pacientes estava internada em virtude de bronquiolite, asma e pneumonia. Casos de covid-19 também foram registrados na emergência nos últimos dias, mas estão longe de ser a principal causa de internações no setor, aponta.
Patrícia explica que é normal que as doenças virais aumentem a partir de março, mas que, neste ano, fatores atípicos contribuíram para a superlotação da emergência: diminuição de leitos infantis e a retomada do convívio social.
— Passamos dois anos em que as crianças não tinham contato com outros doentes por causa da pandemia. Elas não saíam de casa e, assim, estavam protegidas. Como a covid-19 diminuiu, elas foram liberadas para ir à escola, a creches — diz a médica.
Outro fator pode explicar o aumento de atendimentos na rede de saúde: também por causa da pandemia, pais deixaram de vacinar os filhos e de levá-los a consultas com pediatras nos últimos meses. Assim, as crianças tiveram prejuízos no sistema imunológico e estão mais expostas à ação de vírus.
— As taxas de vacinação caíram absurdamente. Não podemos evitar que as crianças tenham doenças respiratórias no inverno, mas podemos fazer que os casos não sejam tão graves — diz Patricia.
Covid-19: aumento de casos positivos
Na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Moacyr Scliar, vinculada ao Grupo Hospitalar Conceição, na zona norte de Porto Alegre, houve aumento no número de positivados para covid-19 nos últimos dias. Em abril, 7% dos testes feitos na UPA resultaram positivo. Neste mês, foram 15%. O cenário piora quando avaliados os últimos dois dias: 25% de todos os testes deram positivo para covid-19. Renata Alampi Moreira, médica responsável pela unidade, acrescenta ainda que os atendimentos por doenças respiratórias passaram de cerca de 130 por dia para 150.
— Orientamos a procurar o pronto-atendimento para os casos mais graves. Muitas vezes atendemos pessoas com sintomas leves, que poderiam ser resolvidos em uma unidade básica. Nossa demanda tem sido alta nos últimos dias, o que aumenta o tempo de espera — explica, ressaltando que os pacientes mais graves são aqueles com o esquema vacinal da covid-19 incompleto.
No Hospital Moinhos de Vento, as doenças respiratórias foram responsáveis por mais da metade das internações de crianças entre o último sábado e a manhã de ontem. No período, os profissionais atenderam 200 crianças com sintomas relacionados principalmente a bronquiolite, pneumonia e asma. João Ronaldo Krauzer, chefe do Serviço de Pediatria do hospital, diz que o cenário para os próximos dias preocupa:
— Em março é normal o aumento de atendimentos (relacionados a doenças respiratórias), mas não o que tivemos em abril. No início de maio, está sendo igual ao mês de abril. Há dias que atendemos 200 crianças. É muita coisa. Antes da covid-19 havia bastante atendimento, mas não nesse volume.
Krauzer entende que o aumento de casos de covid-19 coincidiu com o retorno das aulas presenciais, e relaciona a alta demanda à chamada falta de memória imunológica das crianças, que são acometidas por vírus como a Influenza A, algo que seria reduzido se o esquema vacinal dos pacientes estivesse em dia. Outro fenômeno notado pelo médico é quanto à ida a emergências quando o paciente sente os primeiros sintomas:
— É uma procura exagerada. Tem paciente que começa com febre às 8h e, às 10h, já está na emergência. Ele vem no primeiro sintoma sem antes ficar em observação por 48 horas. Isto está ligado a ansiedade e medo que a covid-19 gerou nas pessoas. Colocamos mais médicos, mas é difícil dar conta — resume.