Com a decisão do governo do Estado de desobrigar crianças de seis a 11 anos de utilizarem a máscara, as escolas estão com um desafio: entender se devem ou não seguir exigindo o acessório em sala de aula.
O decreto divulgado no sábado (26) torna a máscara obrigatória somente para maiores de 12 anos. O documento não faz qualquer menção ao uso por crianças em ambiente escolar. A orientação anterior às instituições de ensino seguia legislação federal e exigia o acessório de todos os alunos, com exceção dos menores de três anos.
Na interpretação do presidente do Sindicato do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinepe/RS), Bruno Eizerik, o decreto torna facultativo o uso da máscara e dá autonomia para as escolas definirem se vão ou não continuar cobrando essa proteção das crianças.
— Cabe a cada escola definir se vai exigir ou não o uso da máscara para as crianças. Não é que não se utiliza mais a máscara. Ela pode ser exigida ou não — pondera Eizerik.
O decreto estadual é acompanhado de um parecer técnico elaborado pelo Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS) que ressalta que, seguindo entendimento da Organização Mundial da Saúde (OMS), a máscara para crianças entre seis e 11 anos é apenas recomendada, não obrigatória, e seu uso deve considerar se não há prejuízos para os pequenos.
À reportagem de GZH, a diretora do CEVS, a epidemiologista Cynthia Molina Bastos, disse que é um equívoco entender que o decreto libera as crianças de até 11 anos de usarem o acessório em sala de aula.
— A interpretação está sendo de que liberou geral, mas não é isso. A recomendação é para o uso de máscara. O que se abre é a possibilidade de, existindo problemas de desenvolvimento por causa da máscara, que se crie alguma alternativa. Antes, não existia essa possibilidade — diz.
Uma nova nota técnica orientando as escolas do Estado deve ser divulgada até terça-feira (1º). O documento, garante Cynthia, vai ressaltar que a proteção para crianças até 11 anos segue recomendada e que, caso o acessório acarrete em prejuízo para algum aluno, isso deve ser considerado.
Na avaliação da epidemiologista, não é oportuno que as escolas deixem de estimular o uso da máscara.
— Para as escolas, não é interessante tirar a máscara. Isso vai aumentar o risco de contágio. Só que o decreto não se restringe à escola, ele vale para todos os espaços públicos — diz.
Repercussão
A Rede La Salle, que conta com cinco escolas particulares em Porto Alegre e 14 no resto do Estado, informou que, diante de um decreto que desobriga o uso de máscara, não há como seguir exigindo o acessório das crianças até 11 anos.
No entanto, segundo a coordenadora da Educação Básica da instituição, Elisa Medeiros, será feita uma intensa campanha para que as famílias entendam a importância de manter essa proteção.
— Se tem uma legislação que diz que não é mais obrigatório o uso da máscara pelas crianças no Rio Grande do Sul, a escola não pode mais obrigar. O que vamos fazer é um trabalho de conscientização, fomentando o uso da máscara. Ainda temos casos de covid, inclusive em crianças — diz Elisa.
O Colégio Santa Doroteia, também da rede particular de Porto Alegre, informou que deve seguir o decreto estadual e permitir que as famílias decidam se querem ou não mandar os filhos de máscara para a escola. Segundo a diretora administrativa do colégio, Janaina Kunzler, alguns pais e responsáveis já haviam manifestado interesse em que o acessório deixasse de ser obrigatório.
— Há uma grande tendência de seguir o decreto, permitindo que as famílias tenham a decisão. Não vamos tornar a máscara obrigatória, sendo que temos um decreto que permite flexibilizar. A escola, agora, está empenhada em definir como isso vai se dar, como vamos fazer essa orientação às famílias. Também precisamos saber se mais algum protocolo vai mudar — diz Janaina.
Para o presidente do Sinepe, a decisão de tonar a máscara facultativa para as crianças é precipitada. A repercussão, segundo ele, tem sido significativa.
— No momento em que o governo muda o decreto, ele praticamente libera. Como presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares, recebi ligações de todos os Estados perguntando se era verdade que o Rio Grande do Sul tinha liberado a máscara para crianças. Recebi ligação de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná — conta Eizerik.
A Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul (SPRS) divulgou uma nota manifestando preocupação com a decisão do governo. Na avaliação da entidade, a flexibilização da máscara para crianças pode passar a mensagem de que o cenário está tranquilo, quando ainda há um alto número de contágios.
"A entidade vê como equivocada a medida, por conta do elevado número de casos de covid-19 ainda registrado. O receio é que o afrouxamento seja percebido pela população como um desestímulo aos cuidados ainda necessários, entre eles a manutenção do uso de máscaras. Além disso, pode prejudicar os números da vacinação infantil que já estão abaixo do esperado", diz a nota.
O que diz o decreto
Em decreto publicado na noite de sábado (26), o governador Eduardo Leite estabeleceu que, em território estadual, o uso da máscara só é obrigatório para quem tem 12 anos ou mais, decisão que passou a valer deste então.
Junto do decreto, foi anexado um parecer técnico do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS), que integra a Secretaria Estadual da Saúde (SES), avaliando os benefícios da máscara para as crianças. O documento frisa que existe consenso, por parte de especialistas, que o acessório não é conveniente para os pequenos de até dois anos, já que pode causar sufocamento.
No caso de crianças até cinco anos, o parecer técnico observa que há divergências, mas que a decisão pelo uso da máscara deve levar em consideração se o pequeno consegue permanecer com o acessório e se há supervisão para que o utilize de forma correta.
Por fim, o parecer entende que, para crianças de seis a 11 anos, a máscara deve ser apenas recomendada, e não obrigatória. Seu uso precisa analisar critérios como o nível de transmissão da covid-19, a capacidade do pequeno de manusear o acessório, entre outros cenários.