Em meio à campanha de vacinação contra a covid-19, 57.147 crianças e adolescentes em todo o país foram imunizados com doses para adultos, não autorizadas para aplicação em menores de 18 anos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Os equívocos ocorreram em todas as unidades federativas.
Os dados constam em manifestação enviada na terça-feira (18) ao ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), pelo advogado-geral da União, Bruno Bianco. Segundo ele, os números foram retirados da Rede Nacional de Dados da Saúde, na qual Estados e municípios são obrigados a registrar informações inseridas em todos os cartões de vacinação.
Ainda de acordo com Bianco, o Ministério da Saúde enviou dois ofícios aos Estados e ao Distrito Federal, em setembro e em novembro do ano passado, questionando os dados sobre a aplicação de vacinas não aprovadas pela Anvisa em menores de 18 anos e também se haveria erros na inserção das informações que pudessem ser retificadas, mas não obteve respostas.
Em nome da União, Bianco pediu a Lewandowski que conceda uma liminar (decisão provisória) para obrigar Estados e municípios a interromper qualquer campanha de vacinação de crianças e adolescentes que esteja em desacordo com as diretrizes da Anvisa e do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19.
A AGU argumenta que, embora as informações contidas na Rede Nacional de Dados da Saúde necessitem de apuração conjunta com os Estados para confirmação ou eventual correção, os números já configuram indícios suficientes para justificar a medida cautelar, pois "podem vir a revelar, nas hipóteses mais extremas, casos de negligência gravíssima na aplicação de vacinas".
Bianco pede ainda que Lewandowski ordene Estados e municípios a identificarem todas as crianças e adolescentes que receberam vacinas equivocadamente, para que sejam inseridas no sistema de farmacovigilância e tenham identificados possíveis efeitos adversos. O procedimento é uma recomendação da Anvisa.
Lewandowski é relator de uma ação de descumprimento de preceito fundamento (ADPF) aberta pela Rede ainda em 2020, relativa a atrasos na contratação de vacinas pelo governo federal. Na prática, a ação se tornou um meio de fiscalização sobre o andamento da vacinação no país, após ter recebido sucessivos pedidos de liminar sobre o tema.
Faixas etárias
De acordo dados da Rede Nacional de Dados da Saúde, 2,4 mil crianças de até 4 anos foram vacinadas contra a covid-19 – ainda que a imunização nessa faixa etária não tenha nenhum respaldo da Anvisa ou do próprio Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação.
Além disso, 4,4 mil crianças entre cinco e 11 anos teriam recebido vacinas de outros fabricantes que não a Pfizer/BioNtech, única aprovada pela Anvisa para aplicação nessa faixa etária.
Os dados também apontam a aplicação da vacina da Pfizer, mas em sua versão para adultos, em 18,8 mil crianças entre cinco a 11 anos no lugar de doses pediátricas aprovadas pela Anvisa para essa faixa etária e cujas primeiras remessas só chegaram ao Brasil este ano.
No caso de adolescentes entre 12 e 17 anos, 29,3 mil receberam doses de farmacêuticas – AstraZeneca, Sinovac ou Janssen – que ainda não receberam autorização da Anvisa para aplicação nessa faixa etária.
Entre os casos mais graves, a AGU cita a aplicação de doses para adultos e também já vencidas da vacina da Pfizer em 49 crianças no município de Lucena, na Paraíba. Segundo o órgão, o Ministério da Saúde apura o caso para eventual responsabilização criminal.