O avanço da variante Ômicron já causa uma explosão de casos e internações no Brasil. Números do Observatório Covid Fiocruz atestam que em sete unidades da Federação a ocupação dos leitos de UTI covid-19 ultrapassa 80%; o Distrito Federal chegou na terça-feira (25) à ocupação máxima. Além disso, o país registrou o maior número de mortes desde novembro e a maior taxa de transmissão do vírus desde julho de 2020. Para especialistas, o momento é de preocupação e de reavaliar as medidas de prevenção e de restrição de aglomeração.
Sobre ocupação dos leitos de UTI destinados à covid-19, os números da Fiocruz mostram que o porcentual está acima de 80% em Distrito Federal, Espírito Santo (80%), Goiás (82%), Mato Grosso do Sul (80%), Pernambuco (81%), Piauí (82%) e Rio Grande do Norte (83%). Em São Paulo, é de 65% no Estado e de 71%, na capital (dados do dia 25). No Rio de Janeiro, a situação é um pouco mais preocupante: 62% no Estado, mas 96% na capital.
No Rio Grande do Sul, a taxa de ocupação dos 301 hospitais era de 61,9% na manhã desta quarta-feira (26), conforme painel da Secretaria Estadual da Saúde (SES/RS). Dos 3.078 leitos de UTI, 429 pessoas estavam internadas por covid e 131 com suspeitas. Havia ainda 1.346 pacientes em tratamento intensivo por outras doenças e condições.
— Não é a mesma situação que tivemos há um ano. Hoje, o número total de leitos é muito menor que em agosto. Além disso, tenho muita fé na vacina, não acredito que vamos reviver o que já vivemos, com pessoas chegando aos hospitais sem respirar, praticamente mortas — afirmou a pesquisadora Margareth Portela, do Observatório Covid-19/Fiocruz.
— Mas não dá para menosprezar que existe um crescimento e que seguimos vivendo como se não houvesse uma pandemia; as pessoas estão tratando isso como se fosse uma "gripezinha" e não é. Precisamos de novas medidas — acrescenta.
Além disso, o novo Boletim Infogripe Fiocruz mostra que 25 das 27 unidades da Federação apresentam tendência de crescimento de casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) nas últimas seis semanas. Nas capitais, 23 das 27 apresentam igualmente sinal de crescimento.
— Certamente estamos vivendo uma explosão de casos da Ômicron, e isso já era mais ou menos esperado pelo que acompanhamos no restante do mundo; a variante é dos vírus mais infecciosos de que se tem notícia — afirmou o presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, Flávio Guimarães, pesquisador da UFMG.
— Acho que o momento é de repensarmos algumas estratégias; não acho que seja necessário um lockdown, mas não é possível seguir com o processo de abertura.
Transmissão
O Imperial College de Londres, referência em análise da crise sanitária, apontou nesta terça-feira que a taxa de transmissão (RT) no Brasil está se expandindo e já é a maior desde julho de 2020: 1,78. Isso significa que cada 100 pessoas contaminadas infectam outras 178. Na semana passada, esse indicador estava em 1,35 — após os números ficarem quase um mês sem ser calculados, pelo apagão de informações no Ministério da Saúde. Somente quando esse índice fica abaixo de um pode-se dizer que a doença está arrefecendo; agora, está acelerando.
— É descontrole total — diz a integrante do Comitê de Combate ao Coronavírus da UFRJ e especialista em gestão em saúde Chrystina Barros.
— Nosso modelo matemático baseado exclusivamente na taxa de transmissão indica lockdown, mas isso, por si só, não é suficiente. De qualquer forma, há outras medidas a serem implementadas, como a obrigatoriedade do uso de máscaras em espaços abertos, restrição do número de pessoas em locais fechados e também no transporte público. Não dá para cancelar o carnaval e manter o Maracanã com 50 mil pessoas — completa.
Mortes e casos
O novo avanço da pandemia também é notado nos balanços dados diários do consórcio de veículos de imprensa, que inclui o Estadão. O Brasil registrou 489 novas mortes pela covid-19 na terça-feira, maior número desde 12 de novembro.
A média semanal de vítimas, que elimina distorções entre dias úteis e fim de semana, ficou em 332, mantendo tendência de crescimento pelo 14.° dia consecutivo. O número de novas infecções foi de 199.126, o terceiro maior número da pandemia. A média móvel de testes positivos atingiu um novo pico e está em 159.789.
Risco futuro
Segundo especialistas, a situação atual só não é mais grave por dois motivos. Um é que a Ômicron é aparentemente menos virulenta que suas antecessoras. Outro - sobretudo - é porque o vírus agora se espalha em uma população já amplamente vacinada. Por isso, o número de casos graves e mortes não cresceu na mesma proporção que o número de novas infecções.
O número de pessoas vacinadas com ao menos uma dose contra a covid-19 no Brasil chegou nesta terça-feira, a 163.389.955, o equivalente a 76,06% da população total, segundo o consórcio de veículos de imprensa — e 148,5 milhões receberam a segunda dose ou um imunizante de aplicação única, o que corresponde a 69,15%.
Mas, se a disseminação do vírus se mantiver nessa velocidade, pode haver sobrecarga nos sistemas de saúde. Há também o risco do surgimento de uma nova variante.
— A Ômicron prevalece nas vias aéreas superiores, não desce muito para os pulmões. Além disso, a variante é mais suscetível ao interferon, que é uma molécula produzida pelo organismo que ajuda no combate ao vírus. Por isso, ela não causa tantos casos graves e mortes — explica Flávio Guimarães. —Mas, se não limitarmos a circulação do vírus, os casos graves e as mortes vão aparecer: é uma questão matemática. E se o vírus continuar se multiplicando de forma descontrolada, novas variantes podem surgir.
DF: 90% de internados não completaram vacinação
A taxa de ocupação de leitos de UTI para tratamento de covid-19 chegou a 100% no Distrito Federal. Segundo a Secretaria de Saúde local, 90% dos internados são pessoas que não se vacinaram ou que estão com o ciclo vacinal incompleto.
Às 9h40, não havia leitos disponíveis para adultos na rede pública, segundo o painel oficial. Anteontem, a taxa de ocupação durante todo o dia permaneceu acima dos 90%.
No momento, o DF tem 83 leitos de UTI para o tratamento de pacientes com covid, mas 25 estão bloqueados por falta de equipe médica disponível para atendimento. As duas unidades que estavam vagas foram ocupadas. Ao todo, dez pacientes aguardavam na lista de espera para tratamento. Na rede privada, dos 123 leitos exclusivos para pacientes com covid, 72 estavam ocupados na manhã desta terça (60%).
O governo do DF montou um plano de ação para expandir a rede de leitos, que prevê a expansão dos 83 leitos atuais na rede pública para até 217, conforme a necessidade de atendimento, contratando leitos.
— Estamos ingressando, todos os dias, com algo em torno de dez leitos, vamos dar conta de segurar toda a saúde — disse o governador Ibaneis Rocha.