Um recente aumento no registro de óbitos por covid-19 faz com que o Rio Grande do Sul ocupe o segundo lugar no ranking nacional da taxa de mortalidade semanal provocada pela pandemia em relação à população de cada Estado.
Os gaúchos ficam atrás apenas do Espírito Santo no índice de óbitos informados nos sete dias anteriores a esta quinta-feira (11) por cem mil habitantes, o que acende um sinal de alerta entre profissionais de saúde. Esse agravamento, porém, não é acompanhado por uma elevação no número de pacientes internados em leitos clínicos ou de terapia intensiva (UTI). Entre as hipóteses cogitadas para o avanço estão uma oscilação pontual ou uma maior mortalidade entre pessoas mais suscetíveis, como idosos que não tenham tomado a dose de reforço.
Conforme dados do Boletim Regional e do Cenário Covid-19/RS, elaborados pelo governo estadual, ao longo dos últimos sete dias os gaúchos acumularam 202 registros de óbito por data de notificação. Isso resultou em uma média de 1,77 vítima semanal por cem mil habitantes – segundo pior índice nacional nesse período atrás somente dos capixabas, com 1,97 (veja no infográfico abaixo).
Por conta disso, a média de vidas perdidas, que vinha oscilando ao redor de duas dezenas ao dia, chegou a 25 na terça-feira e a 29 quarta (dado mais recente disponível até o começo da tarde desta quinta-feira) no RS. A cifra mais recente representou salto de 48% em comparação a 14 dias atrás e confirmou tendência de alta já verificada na véspera. Ainda não há explicações definitivas para as causas desse fenômeno, que, mesmo pontual, contraria tendência nacional de queda na mortalidade.
Um fator positivo é que essa elevação não vem acompanhada de uma piora generalizada nos indicadores da pandemia. O número de internados segue em situação de estabilidade nas unidades de terapia intensiva (UTIs) e apresenta até uma leve queda nos leitos clínicos (veja os dados no gráfico logo abaixo). Se as hospitalizações estivessem crescendo, haveria um risco muito maior de crescimento sustentado da mortalidade.
Entre as possíveis explicações para o salto no registro de vítimas estão um eventual represamento de notificações, já que dia 2 de novembro foi feriado, que estariam sendo contabilizadas agora. Dois fatores limitam o alcance dessa possibilidade: entre as 40 vítimas registradas na quarta-feira, por exemplo, 33 morreram nos sete dias anteriores. Além disso, outros Estados brasileiros não tiveram o mesmo aumento recente, embora o feriado tenha sido nacional.
Outra hipótese é um aumento da mortalidade entre os grupos mais vulneráveis, como idosos que completaram o esquema vacinal há mais de seis meses e não tomaram dose de reforço. Uma análise das hospitalizações na UTI do Hospital Conceição, em Porto Alegre, oferece algumas pistas sobre isso: de 64 pacientes admitidos em estado crítico desde o começo de setembro até esta quinta, 35 já haviam completado o esquema vacinal. Porém, entre esse grupo, 19 doentes haviam se imunizado há mais de seis meses e não buscaram o reforço.
– Isso reafirma a importância de se comparecer a uma unidade de saúde para tomar mais uma dose – avalia a epidemiologista e coordenadora do Núcleo Hospitalar de Epidemiologia do Hospital Nossa Senhora da Conceição, Ivana Varella.
Outro indício que ressalta a importância de turbinar o efeito da imunização vem da região de Pelotas. O governo estadual emitiu na quarta-feira um alerta a essa zona, por meio do Sistema 3 As, devido ao crescimento de internações por coronavírus. Essa mesma região é a última colocada no Estado em relação ao percentual de idosos acima de 70 anos com a dose de reforço: 27,5% de adesão, contra uma média estadual de 45,1%.
– Ainda é um período curto de aumento para falar em tendência. Precisamos de mais tempo para ver se não volta a estabilizar. Mesmo levando em conta a vacinação, os modelos apontam para uma tendência de estabilização, de queda de braço entre a vacinação e o aumento das atividades. Entretanto, algumas regiões chamam atenção e estamos investigando como está a adesão à dose de reforço, pois os idosos acima de 70 anos continuam sendo o público mais vulnerável – observa a professora de Epidemiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Suzi Camey.
O coordenador do Grupo de Trabalho (GT) Saúde do Piratini, Pedro Zuanazzi, afirma que será preciso monitorar os próximos dias para ter mais clareza sobre os rumos da pandemia. Zuanazzi lembra que o Rio Grande do Sul já observou variações pontuais nas notificações por data de registro dos óbitos, sujeitas a variações também por conta da maior ou menor demora no processo de inserção dos dados no sistema informatizado.
– O ideal é monitorarmos como evoluem os óbitos por data de início dos sintomas. Porém, como leva um tempo até esses dados entrarem no sistema, é preciso aguardar um período de 14 dias para observarmos com mais segurança o que de fato está ocorrendo – afirma o coordenador.
As informações compiladas por data de início dos sintomas da covid até duas semanas atrás indicavam, até aquele momento, um cenário de estabilidade. Será preciso seguir acompanhando os dados para entender melhor o panorama atual.
Dados de internação em UTIs comprovam efeito protetor das vacinas
O crescimento recente na notificação de óbitos por coronavírus no Rio Grande do Sul, embora o Estado seja um dos líderes da vacinação no país, com 79% de toda a população imunizada, não deve ser visto como indício de ineficácia dos imunizantes.
Informações dos dois principais hospitais do Estado, compiladas por GZH, comprovam o fator de proteção garantido pelas vacinas – que já ajudaram a reduzir em 95% a média de vítimas diárias entre março e o começo deste mês entre os gaúchos. O Clínicas e o Conceição, localizados em Porto Alegre, internaram 159 pacientes com coronavírus em UTIs de adultos desde o começo de setembro até esta quinta-feira.
Deste universo, quase a metade dos pacientes (45%) não tinha se imunizado ou estava com esquema vacinal incompleto, embora represente apenas 18,5% da população acima de 18 anos. Em situação oposta, enquanto as pessoas integralmente imunizadas somam 81,5% dos adultos na sociedade, respondem por 55% dos hospitalizados sob terapia intensiva – em grande parte, idosos com outras complicações de saúde ou sem a aplicação da dose de reforço.
– Essa elevação discreta nos óbitos por covid no Estado pode ser apenas uma oscilação. Não notamos um aumento na admissão no nosso centro de terapia intensiva. O que percebemos é que quem entra com vacina é geralmente mais idoso, com idade mediana de 69 anos e mais comorbidades. Quem não tem vacina é geralmente mais jovem, com idade mediana de 52 anos – revela a epidemiologista e assessora da Diretoria Médica do Hospital de Clínicas Jeruza Lavanholi Neyeloff.