Já admitida em locais como o Rio de Janeiro e o Distrito Federal, e sob análise em outras regiões do país, a flexibilização do uso de máscara ao ar livre ainda não tem perspectiva oficial para ser adotada no Rio Grande do Sul. Recentemente, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, defendeu publicamente a abolição dessa medida de prevenção em espaços abertos e já tratou do assunto com o governador Eduardo Leite.
Em um post publicado no dia 31 de outubro em uma de suas redes sociais, Leite declarou: "Mesmo que o melhor momento da pandemia e o avanço da vacinação nos permitam considerar retirar a obrigatoriedade do uso de máscaras em alguns espaços, nada pode ser feito pelo Estado por conta de exigência da lei federal 14.019/2020, que se mantém vigente”.
Especialistas vinculados ao comitê científico estadual, que não discutiu o tema de maneira formal até o momento, têm posições divergentes sobre a mudança de protocolo neste momento da pandemia.
O infectologista do Hospital de Clínicas, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e membro do comitê Luciano Goldani afirma que estudos recentes apontam um risco muito baixo de contaminação pelo coronavírus em espaços abertos e arejados como ruas, praças e parques.
– A chance de infecção ao ar livre é muito pequena, desprezível. Acho que, nesse momento, poderíamos flexibilizar o uso nesses ambientes – opina Goldani.
Um artigo publicado este ano pelo The British Medical Journal afirma, com base na revisão de diferentes estudos epidemiológicos, que “a baixa concentração de Sars-CoV-2 ao ar livre devido à ventilação natural” faz com que a transmissão externa "contribua muito pouco para as epidemias de covid-19”.
Goldani observa que a diminuição de risco não se aplica a situações de aglomeração como shows ou estádios de futebol, por exemplo. Nesses casos, é preciso manter todos os cuidados possíveis.
Há visões ainda mais cautelosas. Para o epidemiologista do Hospital de Clínicas Ricardo Kuchenbecker, que também integra o comitê científico, os indicadores da pandemia seguem em nível alto demais para permitir qualquer desestímulo ao uso dos equipamentos de proteção.
– Os níveis de circulação do vírus, considerando novas infecções e internações, segue elevado – argumenta Kuchenbecker.
Nesta quarta-feira (3), o Rio Grande do Sul soma 443 pacientes internados com covid em UTIs e 461 em leitos clínicos, em uma situação de estabilidade. A vacinação já beneficiou 79% da população com pelo menos uma dose, e 61,5% com esquema completo de imunização. A aplicação dos imunizantes já ajudou a reduzir em 95% a média de mortes desde o pico da pandemia, em março, mas o acumulado semanal de óbitos ainda oscila em um patamar considerado elevado - entre 130 e 170 vítimas semanais.
Especialistas contrários à flexibilização neste momento lembram que ainda há risco de contaminação ao ar livre, embora menor, e a flexibilização pode ser entendida por parte da população como uma mensagem de que a pandemia acabou – o que ainda não é verdade.
Pandemia ainda não acabou
A professora de Epidemiologia da UFRGS Suzi Camey, membro dos comitês científico e de dados vinculados ao Piratini, afirma que, pelo que vê nas ruas, “cada um está decidindo o risco que quer correr” e propõe uma saída intermediária.
– Acho que o papel dos governos nesse momento é continuar informando que recomenda o uso (de máscara) quando não for possível manter o distanciamento. Mesmo em um parque, por exemplo, ainda não dá para sentar em rodinha e compartilhar chimarrão sem máscara. Mas caminhar sem máscara em uma rua com pouco movimento tem baixo risco.
Para Suzi, o mais importante é manter a obrigatoriedade do uso dos protetores faciais nas situações de maior perigo, embora deixar esse item de lado sempre traga alguma elevação de risco:
– É possível você estar na rua sem máscara, cruzar com alguém infectado e se infectar? Sim, apesar de pouco provável. Uma pessoa que tolera bem a máscara, não faz parte de grupos de risco e está vacinada pode avaliar que, mesmo assim, vai manter a máscara porque não quer correr o risco de se infectar e transmitir para um idoso. Outra pessoa pode decidir não usar. Para mim, o foco agora é em ambientes fechados ou com muita gente. Nos estádios, por exemplo, deve ser obrigatório o uso de máscara em todos os momentos e ter fiscalização.
Secretarias municipais de Saúde pretende discutir o tema
O Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Rio Grande do Sul (Cosems/RS) pretende colocar a eventual flexibilização do uso de máscaras ao ar livre em discussão com o governo estadual neste mês, em data ainda incerta.
– Isso será levado para discussão com a Secretaria Estadual da Saúde em tempo oportuno. A pauta sobre esse tema deve ocorrer em novembro, mas ainda sem data – afirma o presidente do Cosems/RS e titular da pasta em Canoas, Maicon Lemos.
Até o momento, há um entendimento no Piratini de que a lei federal 14.019, que prevê a utilização do equipamento em áreas de acesso público, impede o Rio Grande do Sul de reverter essa obrigação. A visão da Procuradoria-Geral do Estado é de que uma norma estadual não teria poder jurídico para anular a legislação nacional – embora outros Estados, como o Rio de Janeiro, tenham aprovado projetos regionais contrariando a determinação federal que deve se estender enquanto vigorar o estado de calamidade.
Conforme a assessoria de comunicação da SES, “discussões e avaliações sobre todas as questões que envolvem a pandemia são permanentes e, especificamente sobre o uso de máscara, seguimos a lei federal que obriga a utilização”. Recentemente, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, defendeu publicamente a abolição dessa medida de prevenção em espaços abertos e já tratou do assunto com o governador Eduardo Leite.
Conforme a SES, por enquanto a exigência segue mantida.