A determinação do Ministério da Saúde para aplicar a terceira dose de vacina contra a covid-19 em idosos acima dos 70 anos e imunossuprimidos a partir de 15 de setembro estabelecerá o uso de imunizantes diferentes daqueles recebidos nas duas doses anteriores — medida conhecida como intercambialidade vacinal.
Deverão buscar terceira dose todos com 70 anos ou mais que tomaram a segunda há seis meses e os imunossuprimidos (como transplantados ou em quimioterapia contra câncer) que receberam a segunda aplicação há 28 dias — independentemente de terem sido vacinados com AstraZeneca, CoronaVac, Janssen ou Pfizer.
A maior parte dos brasileiros acima dos 70 anos foi vacinada com a CoronaVac, produzida pelo Instituto Butantan. A orientação do Ministério da Saúde é de que prefeituras apliquem a terceira dose com a Pfizer, devido à grande remessa prevista para os próximos meses: 170,8 milhões entre agosto e dezembro, conforme cronograma oficial mais recente. O Ministério ainda citou que há vários estudos atestando que a Pfizer provoca boa resposta na terceira aplicação.
Na falta do imunizante, poderão ser usadas AstraZeneca ou Janssen — a CoronaVac ficou excluída da terceira aplicação. Em nota técnica, a Secretaria Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19 do Ministério da Saúde explica que o sistema imune fica mais protegido quando pessoas que tomaram duas doses da CoronaVac recebem a terceira dose de outro imunizante. "Um estudo em modelo animal avaliou o emprego da terceira dose com reforço homólogo ou heterólogo, tendo sido observada maior resposta imune com os esquemas heterólogos (reforço com vacina de vetor viral ou RNA mensageiro)", diz a nota.
Mas o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmou que a exclusão da CoronaVac para terceira dose é política, e não técnica.
— A CoronaVac acrescenta, como terceira dose, um aumento de até cinco vezes a estimulação de anticorpos, então isso não está baseado em regra técnica, é uma preferência do ministro para atingir a CoronaVac — afirmou Covas.
O Butantan enviou nota a GZH na qual destaca que dois estudos conduzidos pela SinoVac, fabricante da CoronaVac, indicam que "uma dose adicional (da CoronaVac), administrada após 28 dias, seis meses ou oito meses após a segunda dose, induz uma forte resposta imunológica em adultos e idosos saudáveis".
Covas ainda afirmou nesta segunda-feira (30) que, em vez de concluir a entrega de doses dessa vacina ao Ministério da Saúde em agosto, fará em setembro – ainda dentro do prazo do contrato.
Na última sexta-feira, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) enviou questionamentos ao Butantan sobre a necessidade ou não de reforço para pessoas que tomaram a CoronaVac. O procedimento foi feito também com Pfizer, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e Janssen. A despeito dos pedidos de informação, a escolha de qual imunizante será empregado na terceira dose e de quem irá recebê-la fica a cargo do Ministério da Saúde, destaca a Anvisa por e-mail.
“Tendo em vista o atual cenário da pandemia no Brasil, a Anvisa decidiu recomendar ao PNI que considere a possibilidade de indicar uma dose de reforço, em caráter experimental, para grupos que receberam duas doses da CoronaVac, priorizando públicos-alvo como pacientes imunocomprometidos ou idosos”, afirmou a agência reguladora.
Questionada se usará a CoronaVac na terceira dose, a Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS) afirmou que segue as orientações do Ministério da Saúde, que, por sua vez, não respondeu aos questionamentos até a publicação desta reportagem.
Outros países
A terceira dose é adotada em diferentes nações – inclusive naquelas onde idosos receberam duas doses de Pfizer (Israel, por exemplo), Moderna (Estados Unidos) e AstraZeneca (como no Reino Unido) –, seja com o mesmo imunizante ou com a intercambialidade.
Uma das explicações da ciência é de que, ao aplicar vacinas de tecnologias distintas (medida chamada de intercambialidade, como estipula o governo federal), o organismo é estimulado a produzir novas linhas de defesa.
AstraZeneca e Janssen usam a tecnologia de vetor viral: uma proteína do Sars-Cov-2 é inserida dentro da carcaça de outro vírus, que funciona como veículo para levar a proteína ao organismo e ensinar como se defender do coronavírus real.
A Pfizer usa a tecnologia de RNA mensageiro: leva instruções para o organismo fabricar uma proteína que está presente no Sars-Cov-2, de modo a ensinar o sistema imune a se proteger quando encontrar o vírus de fato.
Já a CoronaVac usa a tecnologia de vírus inativado: o Sars-Cov-2 é “morto” e sua carcaça é usada para ensinar o organismo a se defender do vírus de verdade.