Já pensou se um simples exame de sangue conseguisse predizer o risco de uma pessoa com covid-19 sofrer ou não complicações da doença e ir parar em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI)? Essa é a ideia do Immune Biomarkers of Outcome from COVID-19 (marcadores imunológicos no prognóstico de covid-19, em tradução livre), estudo realizado em uma parceria da Universidade de Plymouth, na Inglaterra, com o sistema público de saúde do país.
Usando amostras de sangue de pacientes em diferentes estágios da doença e com respostas distintas à infecção, os pesquisadores querem traçar um perfil imunológico desses indivíduos a fim de se antecipar a um possível agravamento do quadro. Paula Boeira, 32 anos, é a pessoa responsável por receber e fazer todo o processo que envolve o sangue dos pacientes. Natural de Caxias do Sul, a biomédica formada na Feevale mora desde 2013 no Exterior. Primeiro, viveu na Holanda e, em janeiro de 2017, se mudou para a Inglaterra, onde finaliza o doutorado em Ciências Biomédicas com ênfase em hepatologia.
— Ainda não compreendemos por que uma pessoa jovem, de 20 anos, vai ter covid-19 e ficar bem, sem sintomas, enquanto outra, da mesma idade e sem comorbidades, vai para o hospital e até para a UTI — justifica.
Por isso, o projeto saiu do papel em abril de 2020, quando os laboratórios fecharam em razão do lockdown, mas os pesquisadores foram absorvidos pelo sistema de saúde para dar continuidade às investigações.
— Nosso grupo de hepatologia começou a pensar em como poderia ajudar. Trabalhar com vírus respiratório nunca foi nossa especialidade, mas trabalhamos com sistema imunológico. Então, pensamos em usar o que sabemos no combate à pandemia. Foi inteligente a decisão de usar os cientistas que estavam presos em casa em vagas do sistema de saúde pública — considera Paula, explicando que, com o fechamento total, o hospital público forneceu um espaço para que esses pesquisadores seguissem trabalhando.
Dessa forma, conta, o grupo iniciou o processo de coleta de amostras. Essa atividade acontece por meio de uma rede de apoio que conta com a ajuda de enfermeiros, que auxiliam na localização, coleta e autorização do uso das amostras para fins científicos.
Há tantos anos vivendo longe do Brasil, Paula nota uma diferença gigantesca no tratamento que os pesquisadores recebem por aqui e na Europa. Do outro lado do oceano, fala, os cientistas sempre foram muito valorizados, especialmente pelos governos. Além deles, os profissionais da saúde eram saudados semanalmente com aplausos para agradecer pela dedicação aos pacientes.
— Isso serviu para abrir os olhos. Espero que o governo decida investir mais em ciência. No entanto, ainda temos um longo caminho para a ciência ser reconhecida como merece no Brasil — observa.
Em respeito à ciência, os ingleses não dão ouvidos à desinformação e respeitam piamente os decretos de lockdown, diz:
— É muito triste ver a resposta do governo brasileiro a essa situação. Aqui, quando houve uma piora, o governo impôs fechamentos. Ninguém entrava nem saía. No Brasil, continua vida normal e, agora, temos uma resposta disso: o topo da lista de mortes diárias.
Sem projetar o cenário que está por vir, Paula acredita que a descoberta de um americano com superanticorpos possa ser um caminho interessante a ser seguido. Fora isso, enfatiza, não acredita em outra opção a não ser o lockdown até o controle da situação. O estudo do qual faz parte ainda está em andamento.