O aumento do número de casos confirmados de coronavírus e de mortes decorrentes da doença no país têm chamado atenção e preocupado as autoridades nas últimas semanas. Em entrevista ao programa Timeline, da Rádio Gaúcha, na manhã desta segunda-feira (22), o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta comentou sobre o agravamento da pandemia e a atuação do Brasil diante deste cenário.
Para ele, o maior erro do país foi ter, desde o início, mensagens dúbias em relação ao problema, sem uma explicação clara da gravidade do que estava acontecendo:
— Muita gente acreditou que não precisava usar máscara, que o distanciamento social era bobagem. E o final do ano foi Réveillon, depois férias, depois balneário, depois Carnaval, e essa doença gosta de aglomeração.
Ao comentar o aumento dos casos no Rio Grande do Sul, o ex-ministro citou a possibilidade de uma nova cepa do coronavírus, afirmando que isso precisa ser estudado e que o Estado tem de mergulhar um pouco mais na análise genética das cepas.
Uma das hipóteses cogitadas para o agravamento da pandemia em regiões como Amazonas, o oeste de Santa Catarina, o interior de São Paulo e, nos últimos dias, o Rio Grande do Sul, é a disseminação de novas cepas do coronavírus classificadas como P1 e P2.
Juntas, conforme análises genéticas compiladas pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em janeiro, já representam mais da metade dos casos de covid-19 analisados no país. As duas somaram 77% dos sequenciamentos realizados no período.
Assim como outros especialistas, Mandetta disse que está vendo muitos jovens chegarem aos hospitais com uma carga viral muito alta, em quadros graves da doença, e defendeu que a proteção a vida é o que deve unir a população.
— Esse esforço de solidariedade para proteger a sua casa e a casa de todo mundo eu acho que é a única coisa que pode nos unir neste momento. Não haverá união por causa de governo A ou B, por causa de situação de comércio ou empresa, a união vai ser gerada pelo apelo à vida — salientou.
Atraso na vacinação
Para o ex-ministro, o Brasil cometeu um erro primário e “quase infantil” em relação à vacina contra a covid-19. Ele afirmou que nenhum laboratório do mundo teria condições de produzir 100% das doses que o Brasil precisa e nem de entregá-las de uma vez só, já que dependem de processos de fabricação, e que o país desperdiçou três boas chances de adquirir imunizantes entre agosto e setembro de 2020:
— A primeira (chance) foi o Consórcio Mundial. O Brasil poderia ter pedido 50% das doses que seriam entregues, mas primeiro falou que não ia participar e depois pediu a cota mínima, só 10%.
O segundo erro, de acordo com Mandetta, foi o país não ter negociado diretamente com os laboratórios que mostravam que estavam perto de desenvolver uma vacina eficiente, como Pfizer e Moderna. Além disso, enfatizou que o Brasil limitou o desenvolvimento das doses em uma corrida entre a Fundação Oswaldo Cruz (FioCruz) e São Paulo, com a CoronaVac, mas que o resultado seria o mesmo, independentemente de quem ganhasse.
— Nós estamos andando de charrete e o vírus está andando de Ferrari. A velocidade que o vírus se espalha é muito maior do que a velocidade em que a gente consegue vacinar — lamentou.
Já o terceiro erro está relacionado ao envio de pacientes de Manaus para todas as capitais brasileiras sem biossegurança e sem plano, opinou o ex-ministro. Segundo ele, isso estimulou a população de Manaus a sair da cidade e buscar outras localidades que tivesse uma condição mínima, já que lá faltou algo básico: o oxigênio.
— Essa história da condução do Ministério da Saúde é uma sucessão de erros: erro na prevenção, no atendimento, no custeio dos leitos, e agora um erro crasso na vacina, que vai custar caro para a economia, para o comércio, para a cultura, para as empresas e, principalmente, para as pessoas dos grupos maiores de risco — disse ele.
Mandetta também lamentou o alto número de mortes, que ainda pode aumentar, e afirmou que o problema da vacina foi agravado por erros mesquinhos, por falta de visão e de conhecimento do sistema de saúde:
— Teríamos todas as condições de dar um show (na vacinação), porque o país tem uma rede muito boa para vacinar, mas não tem doses. Você tem um avião cheio de passageiros, você tem o destino para chegar, compromissos para fazer, e o piloto esqueceu de abastecer.