No último final de semana, o governo japonês emitiu alerta de identificação de uma nova variante do coronavírus mapeada em quatro pessoas que estiveram em Manaus. A Fundação Oswaldo Cruz Amazônia (Fiocruz Amazônia) sequenciou o genoma dessa nova versão do vírus e concluiu que a cepa é fruto da evolução de uma linhagem que já circulava no Amazonas entre os meses de dezembro de 2020 e janeiro de 2021.
O estudo liderado por Felipe Naveca, virologista e pesquisador do Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia), aponta que a variante B.1.1.28 circulava no Estado amazonense desde abril do ano passado. Contudo, até novembro, ela apresentava taxa constante de evolução na proteína spike do coronavírus (a chave que permite a entrada do vírus nas células).
— Essa nova variante tem uma série de mutações que ainda não foram encontradas. E algumas delas envolvem transformações na proteína spike, responsável pela interação inicial com a célula humana. O Sars-CoV-2 evolui mais lentamente do que outros vírus RNA, porque eles têm a capacidade de controle da sua evolução. Por isso, esse caso chama bastante atenção. Essa variante que estamos estudando agora acumulou muitas mutações em um intervalo de tempo curto.
Fernando Spilki, coordenador da Rede Coronaômica do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e professor de Virologia na Feevale, explica que são normais mudanças nas características dos vírus. Essas transformações podem acontecer quando o vírus se reproduz ou por oportunidade.
— Se eu tenho variabilidade suficiente, uma grande quantidade de vírus circulando e um grande número de casos da doença, abro caminho para que novas variantes surjam. Além disso, a mutação pode ocorrer por um obstáculo, uma pressão. Quer dizer, a doença busca se adaptar ao sistema imunológico da pessoa para tentar perseverar. A linhagem que consegue vencer essa barreira perdura e tem seus genes levados adiante. Esse é o principal objetivo de qualquer evolução biológica, e o coronavírus está achando esse caminho – esclarece.
O pesquisador da Fiocruz relata que são duas mutações na linhagem B.1.1.28, a mais popular no Amazonas e no Brasil, que merecem atenção porque já foram associadas a um maior grau de transmissibilidade no Reino Unido, por exemplo. Mas essa análise requer tempo.
— O surgimento de diferentes linhagens que carregam mutações K417N, E484K, N501Y no domínio de ligação do receptor da proteína spike em diferentes países ao redor do mundo sugere mudanças na evolução do Sars-CoV-2. Se essas mutações conferem alguma vantagem seletiva para a transmissibilidade viral, devemos esperar aumento da frequência dessas linhagens virais no Brasil e no mundo nos próximos meses — pontuou.
Naveca afirma também que não dá para confirmar ainda se a nova cepa circula em grande quantidade no Amazonas ou em qualquer outra região do país, e que para se chegar a esta resposta é preciso aumentar o número de amostras estudadas.
Spilki vai ao encontro da linha de raciocínio de Naveca ao dizer que há indícios de que a cepa brasileira pode vir a apresentar grau de transmissibilidade ou resistências aos imunizantes que estão sendo aplicados, mas isso requer estudo:
— Temos que manter o sinal de alerta ligado, porque essas variantes circulam muito rápido, Para se ter uma ideia, uma cepa encontrada no Rio de Janeiro é predominante aqui no Rio Grande do Sul. Das 92 amostras sequenciadas no Estado, 47 eram da linhagem do Rio de Janeiro. Em relação às vacinas, também temos esse indicativo com base em estudos de fora que mostram que a mutação E484K consegue escapar dos anticorpos produzidos. Por isso, é importante testar essas cepas para fazer ajustes e atualizações nas vacinas.
O pesquisador da Fiocruz diz que a proteção contra a nova variante mapeada segue os mesmos preceitos da versão antiga: uso de máscara, lavagem de mãos e distanciamento.
— Independentemente de o vírus ser mutante ou não, é importante reforçar que o coronavírus não atravessa máscara, não resiste à água e sabão e que a transmissão é evitada com distanciamento social. A transmissão da doença diminuirá com a queda do contato pessoal entre as pessoas — alerta.