O consumo de opiáceos, derivados do ópio e usados em remédios para controlar a dor (neste caso, vendidos sem receita médica, ilegalmente portanto), cresce e seu consumo no Brasil já é maior do que o crack, por exemplo. Este é um dos dados apresentados no 3º Levantamento Nacional sobre o Uso de Drogas pela População Brasileira (Lnud), realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e que está no centro de um impasse entre governo federal — que o engavetou — e a comunidade científica. As informações são do jornal O Globo, que teve acesso à integra do estudo. Conforme os dados da pesquisa, 4,4 milhões de brasileiros já fizeram uso de opiáceo pelo menos uma vez na vida, o que representa 2,9% da população.
Estes números vêm à tona no momento em que o governo federal endurece as regras para drogas ilícitas — a proposta aprovada no Senado e no aguardo de sanção presidencial regula temas como a possibilidade de internação compulsória de dependentes químicos e o aumento da pena mínima para traficante que comandar organização criminosa, de cinco para oito anos de reclusão.
Segundo os dados deste levantamento da Fiocruz, cerca de 1,3 milhão de brasileiros declararam já ter usado crack uma vez na vida, número consideravelmente mais baixo do que os que afirmaram já ter utilizado algum tipo de opiáceo. Entretanto, pesquisadores afirmam que a comparação dos dados entre um e outro deve ser feita com cautela, já que o uso do crack se dá, sobretudo, em cena aberta, em que a maioria dos usuários está em situação de rua, enquanto a pesquisa da Fiocruz usou a metodologia do inquérito domiciliar, em que o sujeito responde face a face a uma entrevista. Foram feitas 16 mil entrevistas em 351 cidades brasileiras.
Falta de comparação com estudos anteriores é apontada como problema
Desde 2017, quando o levantamento foi concluído, a pesquisa é mantida em sigilo, tornando-se pública agora apenas depois de a imprensa acessar os documentos. Segundo o Ministério da Justiça, órgão que encomendou o trabalho, o estudo não pode ser "reconhecido" pelo governo, pois não teria cumprido a exigência de comparabilidade com estudos anteriores (de 2001 e 2005), feita no edital de R$ 7 milhões que custeou o estudo. A Fundação, em resposta, apresentou dois suplementos oferecendo comparações, alertando, no entanto, que os estudos adotam amostras distintas.
Especialistas ouvidos pela reportagem do jornal O Globo afirmam que o engavetamento só pode ser explicado por ele não confirmar que o Brasil vive uma epidemia de drogas, como costuma afirmar o ministro da Cidadania, Osmar Terra. Ao jornal carioca, o ministro afirmou que não iria se pronunciar sobre este assunto.