Erros como os que teriam tirado a vida de um recém-nascido no Hospital Centenário, em São Leopoldo, estão longe de ser casos isolados. Falhas de profissionais no cuidado de pacientes, equívocos na medicação, problemas nas cirurgias e infecções hospitalares levaram à morte 54,7 mil pessoas em instituições de saúde do país no ano passado, de acordo com o Anuário da Segurança Assistencial Hospitalar, do Instituto de Pesquisa Feluma da Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais e o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar.
Ou seja: a cada hora, seis brasileiros morrem em razão de "eventos adversos graves" nos hospitais, número próximo ao de mortes violentas no país, que é de sete por hora. Dessas, 36,2 mil poderiam ter sido evitadas com a adoção de procedimentos adequados, mostra o levantamento.
— Esse número é altíssimo. Como procedimentos hospitalares são gerenciados por profissionais capacitados, há métodos e treinamentos que poderiam reduzir esse volume — afirma o médico Sérgio Ruffini, coordenador do projeto Qualis-RS de Acreditação e Segurança do Paciente da Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do Rio Grande do Sul (Fehosul).
Entre os eventos fatais com maior frequência, estão infecção generalizada, troca de medicamentos, falhas nas cirurgias, lesões causadas por pressão do local do ferimento e complicações na injeção de alimentos e remédios.
Especificamente em relação aos acessos, Ruffini explica que a adoção de protocolos internacionais de segurança podem reduzir em 90% os riscos de erro. São procedimentos simples, mas vitais: confirmar nome do paciente, medicamento, dosagem e via de acesso, por exemplo. Há também recomendações para diferenciar as cores de mangueiras e o formato das bitolas para sondas de alimentação e acesso de medicamentos, justamente para para evitar que a falta de atenção leve à injeção da substância errada.
Alguns procedimentos são obrigatórios, estabelecidos pelo Ministério da Saúde, mas outros dependem da iniciativa de cada hospital, como adesão a programas internacionais de acreditação. E alguns hospitais são mais atrasados do que os outros na adoção dessas práticas.
— Geralmente, um erro no acesso é resultado de uma série de falhas, que podem ser equipamentos inadequados, excesso de pacientes por profissional, falta de treinamento ou falha na comunicação — explica o enfermeiro Daniel Menezes de Souza, presidente do Conselho Regional de Enfermagem no Estado (Coren-RS).
Falhas podem gerar indenização
De acordo com Souza, nos últimos três anos foram abertos 29 processos administrativos para avaliar a conduta de enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem no Coren-RS. Como muitos ainda estão em curso, não há estatística de quantos levaram à advertência, censura pública, suspensão temporária ou cassação do registro profissional.
Falhas que levem um paciente à morte ou causem danos graves à sua integridade física podem, ainda, tornar hospitais e profissionais alvos da Justiça. Quem se sentir lesado em um atendimento, ou familiares de alguém que tenha morrido por erro de médico, enfermeiro ou auxiliar poderá pedir indenização por danos morais e materiais. O valor das ações oscila entre R$ 100 mil e R$ 200 mil, mas os processos costumam ser morosos, muitas vezes se estendendo até o Supremo Tribunal Federal (STF).
– Neste caso, vítima ou familiar devem levantar todas informações possíveis: exames, lista de medicamentos, cópia de prontuário médico e até laudo independente de um médico ou enfermeiro comprovando que houve equívoco – orienta Rafael Robba, advogado especializado em direito da Saúde do escritório Vilhena Silva Advogados, de São Paulo.