Autoridades, médicos e representantes dos ministérios públicos estadual e federal fizeram nesta quarta-feira (16) um pronunciamento coletivo, em Santa Maria, para garantir que há empenho no combate ao surto de toxoplasmose que assola o município e para reforçar a necessidade de ações de prevenção por parte da população. Também confirmaram a informação, publicada por GaúchaZH na terça-feira (15), de que cinco fetos morreram na cidade, dois deles já com confirmação de que a causa foi a enfermidade.
O pronunciamento coletivo, realizado na sede do Ministério Público Federal, ocorreu um dia depois de vir a público um documento, elaborado por 13 infectologistas locais, com críticas severas à forma como as autoridades vêm lidando com o surto. Na nota técnica, os especialistas apontavam irresponsabilidade por parte da prefeitura, cobravam respostas sobre a investigação das causas e descreviam um cenário de pacientes em situação alarmante.
A partir da entrega do documento ao MPF e da repercussão que ele teve na sociedade, levantando dúvidas sobre a segurança da população, autoridades locais reagiram com a manifestação pública desta quarta-feira (16), durante a qual foi divulgado um informativo aos santa-marienses (veja ao fim desta publicação). Participaram o prefeito, a secretária municipal de Saúde, um dirigente da Secretaria Estadual da Saúde, representantes do MPF e do Ministério Público Estadual e profissionais de saúde. Apesar dos temores da sociedade, manteve-se a política de não revelar quais são os 19 bairros onde foram registrados casos de toxoplasmose, quantos casos houve em cada um desses bairros e a linha de tempo de notificações, que permitiria à população saber se o surto está em ascensão ou declínio.
Os dados oficiais apontam até o momento 271 casos confirmados de toxoplasmose no município, mas infectologistas trabalham já com mais de 600 infectados.
Bruna Pfaffenzeller, procuradora da República em Santa Maria, abriu os trabalhos informando que, a partir da manifestação dos infectologistas, o MPF abriu um instrumento administrativo "para verificar as medidas tomadas pelos órgãos" e "evitar novos surtos".
— Queríamos saber o que cada ente fez, porque o silêncio pode parecer inação. O grande resultado é aprimorar os fluxos de comunicação e informação entre médicos que estão atendendo e todas as equipes do Estado e do municipio, que as informações sejam qualificadas. Parecia haver um hiato comunicativo. Estamos todos aqui para mostrar que estamos atuando juntos, que somos um time no combate a uma doença que pode ter consequências graves. Santa Maria pode virar exemplo de combate a um surto severo. Queremos ser notícia positiva — disse ela.
Parecia haver um hiato comunicativo. Estamos todos aqui para mostrar que estamos atuando juntos, que somos um time no combate a uma doença que pode ter consequências graves. Santa Maria pode virar exemplo de combate a um surto severo. Queremos ser notícia positiva.
BRUNA PFAFFENZELLER
Procuradora da República em Santa Maria
Um dos principais alvos da nota técnica dos infectologistas, o prefeito de Santa Maria, Jorge Pozzobom, afirmou que o trabalho feito "é sério e responsável". Os infectologistas, no documento, acusaram o prefeito de passar a ideia de que a água não é a origem da contaminação. Pozzobom nega que tenha feito isso:
— Fico extremamente tranquilo de que estamos cumprindo com nosso dever como órgão público. Hoje o Brasil inteiro está falando da toxoplasmose em Santa Maria, mas temos tranquilidade de que fizemos tudo ao nosso alcance.
No documento, os infectologistas cobraram informações sobre a investigação da origem da contaminação. Queriam saber o que revelam os dados que foram encaminhados ao poder público sobre as pessoas que adoeceram. GaúchaZH tem insistido, junto às autoridades municipais e estaduais, para ter acesso a esse tipo de informação – por exemplo, quais são os 19 bairros com registro de casos e quantos pacientes há em cada um desses bairros. Também pediu para saber qual a quantidade de notificações ocorridas a cada semana, desde o início, para informar à população se o surto está em declínio, estável ou em ascensão. Prefeitura e governo do Estado se recusaram a passar os dados.
Na manhã de terça-feira (15), GaúchaZH recebeu a resposta da prefeitura, por e-mail. Alexandre Streb, superintendente da Vigilância em Saúde de Santa Maria, sustentou que "não é possível informar o quantitativo dos pacientes por bairro", já que "este é um dado parcial, e a interpretação por parte da população pode ser equivocada". Também não forneceu dados sobre a evolução dos casos. GaúchaZH voltou a fazer questionamento sobre o tema, repetidas vezes: "Como é possível que a prefeitura não tenha, até o momento, nenhuma distribuição de casos por bairros? Quais são os 19 bairros atingidos? Como é possível que não se tenha um levantamento de notificações a cada semana? Como é possível que não saiba dizer se o surto está em declínio ou em crescimento?" A prefeitura municipal de Santa Maria ignorou os questionamentos e não enviou qualquer tipo de resposta.
Também na terça-feira, GaúchaZH solicitou esses dados durante entrevista com a diretora do Centro Estadual de Vigilância em Saúde, Marilina Bercini. Ela afirmou que dispunha das informações, mas que não tinha como repassá-los naquele momento. Deixou em aberto a possibilidade de fornecê-las na sequência. Na quarta, a assessoria de comunicação da Secretaria Estadual da Saúde comunicou, por e-mail, que os dados não serão tornados públicos: "Sobre a curva dos casos por semana, não será possível repassar o gráfico, pois a análise está sendo reavaliada pela equipe de investigação".
O que diz o informativo divulgado nesta quarta-feira pela autoridades
— A doença pode ser transmitida pela ingestão de água ou alimentos contaminados (hortifrutigranjeiros, carnes mal passadas e outros alimentos crus)
— As populações mais suscetíveis são: gestantes (em função da transmissão para o feto), imunodeprimidos e crianças com menos de dois anos
— Recomenda-se a fervura da água por pelo menos um minuto. Após a fervura, cronometrar mais um minuto
— Alimentos devem ser devidamente cozidos ou assados
— Recomenda-se que a carne seja congelada em freezer a -12°C, por pelo menos 48 horas antes do cozimento
— A ingestão de alimentos crus de qualquer natureza deve ser evitada
— A manipulação de alimentos crus deve ser seguida de lavagem das mãos e uso de álcool gel
— Após a manipulação de terra ou areia, lavar bem as mãos e utilizar álcool gel
— Casais que desejam ter filhos, avaliem a possibilidade de postergação da gestação para um momento posterior ao controle do surto
— Ao perceber sintomas como febre, dor de cabeça, dor no corpo ou ínguas no pescoço, o serviço médico deve ser procurado imediatamente. Evite a automedicação