Representantes da Unesco - agência para Educação, Ciência e Cultura da Organização das Nações Unidas - estarão na sexta-feira (12) em Porto Alegre para acompanhar o trabalho de recuperação de cerca de um milhão de processos judiciais atingidos pela enchente. Tratam-se de documentos armazenados no arquivo-geral do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4), no bairro Anchieta. No local, a água atingiu três metros de altura.
O arquivo-geral do TRT4 reúne três millhões de processos. A maioria com trânsito em julgado, portanto, não cabem mais recursos judiciais. Porém alguns deles constam sob "arquivamento provisório", ainda com validade legal.
— Temos aqui uma demanda média de 50 a 60 pedidos por dia de desarquivamentos. Para encaminhamento de aposentadorias, de algum benefício previdenciário ou para dar andamento à execução de determinado crédito — explica Anita Job Lübbe, juíza do trabalho e integrante do comitê do Programa Nacional de Gestão Documental e Memória do Poder Judiciário, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O interesse da Unesco é observar como está sendo feita a recuperação dos documentos. O Tribunal Regional da 4ª Região possui, desde 2013, o selo “Memória Mundo” da agência da ONU, em razão do valor histórico de parte do acervo. No local, há processos que datam entre 1935 e 2000. No Brasil, apenas cinco tribunais possuem a certificação.
De um milhão de processos atingidos pela água, cerca de 20 mil já entraram na fila de recuperação. Até o momento, a resposta é positiva no resgaste dos documentos.
— Existem dois tipos de perda: a perda do papel em si e a perda da informação. Eu posso, eventualmente, perder algumas folhas do papel, mas o que está nele estamos tendo condições de ver e preservar toda a informação. É um alívio e uma satisfação dizer que está sendo possível salvar — afirma a juíza do trabalho Anita Job Lübbe.
Os processos ficaram em contato com a água de 4 de maio a 5 de junho, quando servidores do Tribunal Regional do Trabalho tiveram acesso ao acervo. Os documentos estão distribuídos por três pavilhões, numa área de três mil metros quadrados. Somente aqueles que são desarquivados passam por digitalização.
Como é feita a recuperação
O trabalho de restauro prioriza os processos judiciais que caíram no chão. Isso porque ainda há riscos envolvendo movimentar peças armazenadas nas prateleiras, que podem tombar para o lado. Uma triagem é feita e classifica os processos por grau de danos. O ambiente no pavilhão conta com o uso de desumidificadores.
Os processos são higienizados com uso de produtos químicos. A maior parte dos estragos ocorre nas capas, que são substituídas. Uma curiosidade são danos provocados pela presença de óleo e sais nos papéis. A hipótese é isso seja resultado do vazamento de insumos de empresas e indústrias vizinhas ao arquivo-geral, que também foram alagadas.
De forma manual, servidores folheiam os processos página por página, com uso de pinças e secadores de cabelo. Na sequência, os processos são colocados para secar pendurados em varais.
O desafio de recuperar tantos documentos chama a atenção de outros órgãos públicos. Na quarta-feira (10), uma equipe do Ministério Público Federal de Brasília esteve no arquivo-geral do TRT4 para conhecer o trabalho.
— Nem no Poder Executivo, nem no Legislativo, nem no Judiciário já se teve algo desse tamanho no país — avalia Konrad Amaral, arquivista do Ministério Público Federal de Brasília.