Uma das principais empresas de transporte público do Estado, a Carris completa neste mês seis meses de atividade em Porto Alegre sob gestão privada com avanço em indicadores como tamanho da frota operacional, viagens realizadas e disponibilidade de ar-condicionado.
Dados oficiais indicam que a idade média dos veículos em circulação apresentou leve queda em comparação ao período de administração pública, mas se mantém acima do patamar nacional. A direção da empresa avalia que os usuários deverão experimentar uma melhoria mais significativa na prestação do serviço com a entrega de novas remessas de ônibus zero-quilômetro, o que deve ocorrer ao longo das próximas semanas.
O processo de desestatização envolveu uma companhia que já havia acumulado prêmios nacionais de qualidade na virada para os anos 2000, mas vinha sofrendo com a falta de recursos e de manutenção adequada. Uma reportagem publicada pelo Grupo de Investigação da RBS (GDI) em dezembro do ano passado revelou, com base em relatórios internos, que em média oito veículos precisavam de socorro mecânico a cada dia.
Como resultado desse sucateamento, faltavam condições até para cumprir todas as viagens programadas. Desde então, a nova gestão informa ter investido R$ 66,1 milhões na compra de 70 novos ônibus até o final do ano — dos quais 64 comuns e seis articulados.
Para isso, a empresa conta com R$ 39,7 milhões de um financiamento do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) garantido por meio do programa Novo PAC — Mobilidade Urbana do governo federal. Do reforço previsto, entraram em circulação 15 carros, e outros 41 devem ganhar as ruas até o próximo mês. O cronograma atrasou em razão da enchente, mas a Carris garante que a frota adicional está na Capital em revisão, emplacamento e liberação final pela Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC).
O conserto de pelo menos 30 ônibus e a entrega parcial dos novos equipamentos favoreceu um crescimento de 12% no número de viagens realizadas entre janeiro e junho deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado. Também aumentou o percentual de percursos realizados em relação ao que estava previsto (veja quadro com as informações completas abaixo). Alguns dados compilados pela EPTC a pedido de Zero Hora excluem o mês de janeiro por ter sido o período em que houve a mudança de gestão. Até o ano passado, devido a problemas mecânicos que imobilizavam parte da frota, não se conseguia cumprir todos os deslocamentos programados, e três linhas chegaram a ser temporariamente operadas por outras empresas.
As 15 novas unidades favoreceram a diminuição da idade média da frota de 9,8 anos para 8,9 anos. A cifra permanece acima da média nacional calculada em 6,3 anos no anuário de 2023 da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), que traz informações do ano anterior. No começo de 2024, a prefeitura de Porto Alegre estendeu a vida útil dos ônibus de transporte urbano para até 15 anos no caso de veículos comuns e 16 anos para os articulados. A legislação anterior limitava a 12 e 13 anos, respectivamente. Entre os dias 8 e 9 de julho, dois coletivos da empresa pegaram fogo ao circular pela cidade.
— Não houve uma mudança tão acentuada no perfil da frota ainda porque colocamos, até o momento, 15 veículos novos. Quando chegar a nova remessa, terá um impacto mais forte no usuário, que enxerga o seu dia a dia, não o sistema como um todo. Temos trabalhado muito em manutenção e limpeza, mas até o final do ano seremos uma empresa completamente diferente — garante o diretor da Carris, Octávio Bortoncello.
Conforme a nova Carris, que segue operando as mesmas 22 linhas anteriores à privatização, há previsão de se investir mais R$ 12,9 milhões na aquisição de outros 10 veículos nos próximos meses. A empresa estima que a idade média da frota deverá recuar para 4,9 anos em 2025.
— Uma frota mais nova é interessante, traz mais conforto, mas aumentar a frequência dos horários e reduzir a lotação dos veículos são coisas muito importantes para a percepção dos usuários — avalia o PhD em Transportes e diretor de Cidades da WRI Brasil, Luis Antonio Lindau.
Usuários esperam melhorias; empresa diz que encontrou situação "complexa"
Usuários de linhas da Carris ainda demonstram dificuldade de perceber mudanças mais significativas nas condições de serviço oferecidas pela empresa, apesar dos avanços em indicadores gerais. Os 15 veículos novos disponibilizados até o momento representam uma fração de 7% dos 219 ônibus operacionais existentes — classificação que indica o necessário para cumprir a tabela prevista. Somando-se a frota reserva, a cifra chega a 257 ônibus em condição "ativa", ou seja, apta a rodar.
— Não acho que melhorou. As linhas que eu pego, T4 e T10, ainda têm atrasos e superlotação — analisa a estudante universitária Anita Ribeiro, 18 anos.
A corretora de imóveis Kellen Gomes, 25, afirma que ainda não pegou algum dos veículos entregues mais recentemente.
— Os ônibus que eu costumo pegar são velhos. O T7 costuma estar lotado, já o 343 (Campus/Ipiranga) está razoável — opina Kellen.
O aposentado Luiz Carlos Verutsky, 67, também avalia que a idade média dos veículos segue muito alta:
— Pego mais o T1, e é muito difícil pegar um ônibus decente. Já consegui andar num dos ônibus novos, mas é raro. A maior parte ainda é de caco velho.
Em termos estatísticos, a proporção de reclamações formalizadas apresenta pequena variação. Oscilou entre 0,02% e 0,01% dos passageiros no ano passado, e se mantém em 0,01% nos últimos meses com dados disponíveis.
O diretor da Carris Octávio Bortoncello sustenta que a nova administração encontrou uma situação "complexa" ao assumir a gestão da companhia em janeiro, com alto número de equipamentos enguiçados e impossibilidade até de cumprir a tabela de horários devido aos problemas de conservação.
— Em março já conseguimos recuperar muita coisa. Agora ainda estamos vendo quais linhas necessitam de reforço, precisamos ver como o sistema vai se acomodar. Um sistema de transporte não depende só do operador, mas de toda a cadeia. Operacionalmente, já estamos em situação diferente, e estará ainda melhor ao final do primeiro ano — argumenta Bortoncello.
A Carris acrescenta que, desde 20 de junho, foram incluídas 62 viagens a mais em dias úteis nas linhas transversais T1, T4, T6 e T7 com o objetivo de reduzir o tempo de espera.