Diante da resistência do nível do Guaíba, que segue estacionado acima de cinco metros em parte da região central de Porto Alegre, estações de tratamento de água e de bombeamento pluvial na área permanecem fora de operação.
Essa paralisação em unidades-chave do sistema impede a chegada de água na torneira de parte da população residencial, de hospitais e o enxugamento do rio que se formou onde antes ruas e avenidas costuravam e ligavam o coração da cidade. Também impede o retorno de famílias para suas casas, deixa outras ilhadas e afeta serviços públicos.
Na região, a casa de bombas número 16, na Rótula das Cuias, e a Estação de Tratamento de Água Moinhos de Vento (ETA), estão paradas em razão da inundação. A profundidade do maquinário, o peso dos equipamentos e a altura da água prejudicam o acesso e o conserto mais célere, segundo o Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), que tem dificuldade em projetar a retomada da operação e abastecimento nesses locais.
Até as 17h desta quarta-feira (8), quatro das seis ETAs seguiam operando em regime parcial, com capacidade reduzida. Já no âmbito das casas de bombas, apenas quatro das 23 estruturas espalhadas pela cidade seguiam funcionando.
ETA Moinhos de Vento
A ETA Moinhos de Vento abastece pontos importantes da região central da cidade, como hospitais e órgãos de serviços públicos. Com operação suspensa desde sábado (4), essa unidade apresenta ambiente complexo para reparo, segundo o Dmae. Isso ocorre pelo fato da profundidade do local que abriga os equipamentos que garantem a operação da estação, segundo o diretor-geral do departamento, Mauricio Loss:
— O ponto de captação do sistema Moinhos de Vento é bem baixo. Então, ele está bem afogado. Estamos buscando alternativas de isolar aquela estação de bombeamento, tentar drenar a água, avaliar também essa questão de motores, de painéis, o que ficou danificado, para que a gente possa substituir e voltar à operação.
Loss explicou que uma manobra de solda na área foi estudada, mas impossibilitada pelo alagamento na estrutura. Diante do fato de a estação estar inundada e com equipamentos encharcados, Loss não descarta a necessidade de troca do maquinário. Em razão disso, afirma que é difícil estimar prazo para retomada da operação na ETA Moinhos de Vento:
— Estamos também traçando outras alternativas, já pensando em trocas de motores, enfim, tudo mais. Estamos atuando e ainda não temos uma previsão exata, mas estamos fazendo de tudo para voltar essa operação até o final de semana.
Órgãos abastecidos pela ETA Moinhos de Vento
O diretor-geral do Dmae informa que entre as 149,8 mil unidades atendidas pela ETA Moinhos de Vento estão instituições de primeira necessidade importantes, como os hospitais Fêmina, HPS, Moinhos de Vento e Santa Casa, e outros órgãos públicos. Para mitigar os efeitos do desabastecimentos em alguns desses locais, existe uma operação emergencial, segundo Loss:
— Seguem sendo abastecidos por pipas, mas também temos ali, enfim, Tribunal de Contas, temos tantos outros órgãos que ficam nessa região mais central, a própria prefeitura, o governo do Estado, que acabam tendo essa dificuldade de abastecimento.
Abastecimento na Capital
O Dmae estima que as quatro estações de tratamento de água em operação são responsáveis por cerca de 85% do abastecimento da Capital. No entanto, não quer dizer que esse percentual da população está recebendo o serviço, porque as unidades operam com capacidade reduzida e locais mais altos demoram a ter acesso. Portanto, o Dmae não consegue, no momento, estabelecer o percentual de pessoas sem água na cidade. O diretor-geral do departamento esclarece que a água que chega nas residências é potável e pode ser consumida:
— Nós garantimos a potabilidade da água. A população pode perceber uma água um pouco mais turva, um pouquinho mais escura, ou também com um pouquinho de gosto. (...) Mas a população pode sim ficar muito tranquila em consumir essa água.
Casas de bombas
Até as 17h desta quarta-feira, o número de casas de bombas em operação seguia o mesmo: quatro das 23 unidades. São as Estações de Bombeamento de Águas Pluviais (Ebaps) 7 (que protege as regiões de Santa Maria Goretti e Vila Sesi), 11A e 11B (que protegem o Hipódromo e a Vila Hípica), e 19 (Vila Planetário). Por volta das 17h30min, a reportagem de GZH recebeu relatos de possível problema na casa de bombas número 19. Uma equipe do Dmae estava em deslocamento para o local por volta das 18h para averiguar o que ocorria na região.
Das 19 casas de bombas que seguem fora de operação, uma das situações mais complexas é observada na Ebap número 16, localizada na região da Rótula das Cuias, responsável por proteger, principalmente, o bairro Cidade Baixa. Na última segunda-feira (6), a energia dessa estação precisou ser desligada pela CEEE Equatorial em razão de perigo de choques elétricos na área. Com essa suspensão, a água que inundava o centro da Capital se espraiou com velocidade pelos bairros Menino Deus e Cidade Baixa durante a tarde de segunda-feira e segue estacionada na região.
O diretor-geral do Dmae explica que o restabelecimento da operação na casa de bombas número 16 é complexa em razão de dois fatores: altura da água na região e tamanho e peso do maquinário nessa estação. Isso dificulta também o acesso de equipes do Dmae, que ainda não conseguiu avaliar o tamanho do estrago e necessidade de reparo:
— O nosso foco é a estação de número 16, que é muito importante para essa região bem central da cidade. Então, a gente está ali atuando, buscando alternativas de isolamento, de drenagem, e ali é uma área que foi bem alagada. Então, pode ser sim que tenhamos que substituir alguns motores, painéis, para voltar a operação, mas ainda não temos uma previsão.
Casas de bombas em funcionamento
O diretor-geral do Dmae afirmou que as quatro Ebaps em funcionamento ainda correm risco de parada. Isso ocorre diante da eventual necessidade de desligamento de energia por motivos de segurança de tráfego em áreas alagadas, segundo o dirigente.
Professor do Departamento de Hidromecânica e Hidrologia do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Fernando Dornelles afirma que o fato dessas casas de bomba estarem em regiões menos afetadas pela inundação diminui parte do risco de parada. Eventual paralisação ocorreria por outros fatores, como falha mecânica e corte de energia elétrica na região.
O diretor-geral do Dmae também cita essa questão mecânica, que pode ser prejudicada pela alta demanda absorvida pelas casas de bomba que seguem em operação:
— Elas não são dimensionadas para isso, teriam que ter um certo descanso. Então, pode ser que haja queima de algum motor, alguma coisa assim que também reduza ali a quantidade de água bombeada naquela região.
Busca por soluções
Loss afirma que o Dmae segue atuando para tentar manter a operação dessas quatro casas de bombas que seguem em ação, com foco na manutenção do maquinário.
O professor Fernando Dornelles afirma que algumas medidas de contenção poderiam ser adotadas em eventuais casos de ameaça de alagamentos:
— Seria possível fazer uma ensecadeira. Botar sacos de areia ao redor dela e proteger contra inundação. Seria uma alternativa, assim, emergencial. Mas tudo vai depender também da altura, né.
Nas casas de bombas inundadas, a operação é mais complexa. Loss afirma que o Dmae segue com foco em tentativa de drenagem e uso de geradores, mas esclarece que a opção por energia móvel é complicada. Equipes tentam manobra com gerador na casa de bombas número 12 por se tratar de uma região mais alta, com área seca no entorno. Nas demais, o ambiente é mais hostil, segundo o diretor-geral:
— Nos outros locais, todas as casas de bombas estão inundadas e ilhadas, né? Tudo ao redor está molhado. A gente não consegue então alocar o gerador. E também temos dificuldade para conseguir óleo diesel.
Futuro e prevenção
O professor do IPH afirma que, para evitar novos episódios, é necessário avançar em regulação para que os sistemas de proteção contra cheias garantam sua eficácia, com comportas herméticas, casas de bombas confiáveis, altura e integridade dos diques. Uma solução seria criar legislações em moldes parecidos com os observados em barragens, repensando e exigindo parâmetros atualizados para sistemas de diques. Esse modelo exigiria protocolos rígidos visto que a falha do sistema “causa enormes prejuízos, assim como a ruptura de barragens”.