Em entrevista na manhã desta terça-feira (30) ao programa Bom Dia Rio Grande, da RBS TV, o secretário de Desenvolvimento Social de Porto Alegre, Léo Voigt, comparou as condições das pousadas da rede Garoa com as residências dos porto-alegrenses. Segundo o secretário, baratas e ratos vistos nas outras pensões mantidas pela empresa também estão presentes em outros imóveis da Capital. A Garoa é a organização responsável pela pousada onde 10 pessoas morreram em um incêndio na Avenida Farrapos.
— Barata e rato tem no entorno das nossas casas todas. Para a assistência social, as pousadas eram vistoriadas e as condições eram dignas, corretas e adequadas. As pessoas saíam das circunstâncias de rua e iam para um espaço individual com quarto exclusivo, banheiro e cozinha compartilhada. Nesse lugar, elas tinham liberdade e autonomia de horários e frequências, inclusive o uso de vícios, e por isso havia grande adesão. Não era que nós convivíamos com algo intolerável, nós vistoriávamos e encontrávamos as condições mínimas necessárias para poder abrigar — afirmou Voigt.
Em uma matéria publicada no sábado (27), a RBS TV entrou em outras pensões mantidas pela empresa, utilizando uma câmera escondida. Durante a visita, verificou-se que em uma das pensões da rede, localizada na Rua José do Patrocínio, no bairro Cidade Baixa, a mobília consistia apenas de um colchão velho, que parecia estar apodrecendo, e um pequeno armário. O cheiro era forte no cômodo e, quase na entrada do quarto, havia lixo espalhado pelo corredor.
— Na quinta-feira anterior ao acidente, recebi no meu celular uma reclamação dos vizinhos da pousada Garoa da Sete de Setembro, afirmando que na marquise externa estava cheia de lixo. Os moradores do andar de cima estavam jogando lixo pela janela, deixando a área suja. Recebi a foto na quinta-feira às 11h45min da manhã e a encaminhei para o serviço da Fasc (Fundação de Assistência Social e Cidadania), dizendo: "Pessoal, olhem aqui, os vizinhos estão reclamando da sujeira na pousada Garoa, na marquise externa". Às 17h, recebi outra foto mostrando a marquise limpa. Ou seja, assim que constatamos qualquer irregularidade, tomamos providências imediatas — disse o secretário.
A Pousada Garoa teve o contrato renovado pela prefeitura em dezembro do ano passado. Na ocasião, o vínculo foi estendido por mais 12 meses, segundo o colunista Jocimar Farina. O contrato original foi assinado em novembro de 2020 com duração de seis meses e posteriormente renovado de forma repetida.
O documento previa a contratação de vagas de hospedagem para atender a Fasc. O público-alvo era a população mais vulnerável, que sofre risco social como desemprego e dificuldades de acesso às demais políticas públicas.
Pelo período inicial contratado, a empresa receberia até R$ 197 mil para 360 vagas. Na renovação do vínculo, em dezembro do ano passado, o valor foi revisto para R$ 2,7 milhões.
O serviço de hospedagem deveria prever distanciamento de 1,5m. Os hóspedes deveriam ter atendimento de necessidades fisiológicas e de higiene pessoal, com privadas e chuveiros com água quente, além de materiais de banho e higiene como toalha, sabonetes, papel higiênico, roupa de cama. Os quartos deveriam ser ventilados. A pousada também deveria realizar serviço de sanitização, desinsetização e desratização em todos os ambientes do estabelecimento.
— Nós não somos um órgão de fiscalização, somos um órgão de cuidado, proteção, acolhimento e educação. Temos mais de 240 contratos na cidade com ONGs e empresas para atender à população. Além disso, há o fiscal de serviços, cuja função é supervisionar e elaborar um relatório, sendo que o proprietário da pousada deve assiná-lo ao final e estar presente durante a vistoria, o que implica um aviso prévio. Isso é necessário para entrarmos em um espaço privado, já que, mesmo com um contrato, não temos autorização para invadir a empresa a qualquer momento. Não somos um órgão de polícia, fiscalização fazendária ou sanitária. Nosso papel é construir uma rede de cuidados para as pessoas — explicou Voigt.
O local não possuía Plano de Proteção contra Incêndio (PPCI) para funcionamento de pousada. Em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, o comandante do Batalhão Especial de Segurança Contra Incêndio do Corpo de Bombeiros, tenente-coronel Joel Dittberner, afirmou que o prédio onde funcionava a pousada teve um PPCI aprovado em 2019 para que operasse como escritório.
Ainda conforme Dittberner, os donos do estabelecimento nunca acionaram a corporação para que fosse feita uma vistoria no local, o que permitiria a emissão do alvará. Além disso, nunca teria tido denúncias a respeito da falta de PPCI do local. Ele disse ainda que a empresa chegou a ser notificada em 2022 por irregularidades em outra unidade da rede.
— O que está sendo dito é que a pousada Garoa tinha um problema tão estrutural que acabou incendiando por conta própria. Agora, que tipo de maquiagem estão planejando fazer? Uma reforma estrutural? Um complexo plano de PPCI que ninguém consegue cumprir e que, aliás, apenas adiam indefinidamente a implementação dessa lei. Se tivessem realizado uma reforma para atender às exigências do fiscal, a fiscalização já teria ocorrido antes mesmo de ser iniciada. Nós frequentamos esses espaços regularmente para cuidar da população ali, para acessá-la. Portanto, estamos familiarizados com esses locais e sua situação — pontuou o secretário.