Uma das obras viárias mais importantes do Rio Grande do Sul, iniciada há quase uma década, a nova ponte do Guaíba não foi totalmente concluída. Parcialmente inaugurada em dezembro de 2020, ainda restam quatro alças para serem entregues, mas uma data de conclusão é incerta. Enquanto isso, famílias das vilas Areia e Tio Zeca, que estão no caminho dos trabalhos, na zona norte de Porto Alegre, esperam por realocação para outras moradias e convivem com a falta de perspectiva sobre seus futuros.
Tatiane de Souza Telles, 29 anos, vive com o marido, uma filha e um filho bem próximo da nova ponte. Grávida, diz que desde o cadastro feito em 2014 pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), nunca mais bateram em sua porta para tratar do assunto.
— Minha primeira opção seria ir para Canoas. Como segunda hipótese, pensava no Centro Histórico ou no bairro Humaitá — menciona, dizendo que mora na região há 10 anos.
No encontro das ruas Voluntários da Pátria e Dona Teodora, é possível ver partes das alças inacabadas. Algumas exibem ferros retorcidos e peças de concreto. No local, fica o canteiro de obras da construção, com visíveis sinais de abandono. Materiais ainda estão espalhados pelo chão à espera de sua utilização final.
O açougueiro David Silva, 35 anos, vive com a esposa e três filhos de frente para as alças inacabadas em uma casa na Rua Voluntários da Pátria. Ele também cita o cadastramento de 2014 como o evento mais significativo. Conta que chegou a participar ainda de uma reunião, mas que depois da retirada das máquinas e de outros equipamentos dali, nada mais foi dito para os moradores.
— Para mim, seria melhor sair. Já teve caminhão e moto que colidiram aqui na parede da minha casa, porque tem muito movimento — compartilha.
Em agosto de 2023, as obras foram incluídas no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 3), anunciado pelo governo Lula. O Dnit assegura que 97% dos trabalhos estão concluídos (confira mais abaixo o que a autarquia federal vinculada ao Ministério da Infraestrutura alega sobre a situação da travessia).
A dona de casa Maria Cristina, 44, mora na Rua Dona Teodora desde 2012. Afirma que nunca mais foi procurada para discutir sua mudança depois da realização do cadastro, quase 10 anos atrás. Vive com o marido e dois filhos na casinha com um quintal modesto.
— Estavam falando em nos mandar para a Restinga. Eu não vou para lá. Se isso acontecer prefiro voltar para a minha terra, Cachoeira do Sul — avalia.
O reassentamento das vilas Areia e Tio Zeca deve custar entre R$ 76 milhões e R$ 89 milhões. Cada família teria direito de comprar uma casa no valor entre R$ 152 mil e R$ 178 mil, dependendo do número de seus moradores. Seria o que se conhece por uma compra assistida.
Mais de 600 famílias vivem na área, um ponto conhecido pela situação de extrema vulnerabilidade social.
A travessia da nova ponte do Guaíba tem 13,6 quilômetros, com total de cinco quilômetros de trecho em aterro e 7,3 quilômetros entre pontes, alças e viadutos. Ao contrário da outra mais antiga, não tem vão móvel. Ou seja, as embarcações conseguem passar sob ela sem necessidade de interrupção do trânsito de veículos. A estimativa é de que 50 mil veículos utilizem a travessia diariamente.
A reportagem entrou em contato com a construtora Queiroz Galvão, responsável pelas obras e líder do Consórcio Ponte do Guaíba, para saber como está a situação do contrato e quando os trabalhos seriam finalizados. A empresa respondeu que não se manifestaria.
O que diz o Ministério dos Transportes
O Ministério dos Transportes também foi procurado para atualizar a situação. Veja, abaixo, o que a pasta federal respondeu por nota:
"Os acessos da 2ª ponte sobre o Rio Guaíba devem ser incluídos no projeto de concessão das rodovias BR-116/158/290/392/RS, previsto para ocorrer ainda em 2024.
As obras das alças, bem como os custos de reassentamento das famílias, estão sendo avaliados dentro a estruturação do projeto. Como está em fase de estudos, não há definição de prazos de obras e dos serviços complementares".
O que diz o Dnit
A reportagem de GZH encaminhou alguns questionamentos ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) sobre o andamento das obras na nova ponte do Guaíba. Confira, abaixo, a nota que a autarquia encaminhou como resposta:
"O DNIT informa que a conclusão das obras da Nova Ponte do Guaíba, bem como o reassentamento das famílias, integra objeto de estudo do Ministério dos Transportes para concessão. A ponte está 97% concluída e em operação, restando a conclusão de apenas quatro ramos de acesso junto à Freeway. Até o momento, foram investidos cerca de R$ 770,5 milhões na construção da Nova Ponte do Guaíba".