Uma década depois de a Câmara Municipal de Porto Alegre aprovar um projeto de lei que estabelecia incentivo para adequação e conclusão de prédios inacabados no Centro Histórico, pouca coisa mudou. A proposta feita à época pelo Executivo pretendia finalizar os chamados "esqueletões" — obras que foram iniciadas, porém jamais concluídas na região central da cidade.
A prefeitura de Porto Alegre, por meio da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus), informa que não possui estimativas de quantos imóveis estão atualmente nesta situação na cidade. A lei, aprovada em 2013, previa prazo de um ano para os proprietários reiniciarem as obras incompletas. Como não houve procura de interessados, a legislação perdeu a validade em 2014.
No entanto, o projeto listava quatro imóveis que poderiam ser beneficiados pela lei. Todos tinham situação semelhante. Tiveram obras iniciadas e se encontravam em diferentes estágios de construção. Desse total, apenas um prédio foi concluído. Os outros três seguem com futuro incerto (confira mais abaixo quais são e como está o contexto legal de cada um).
Um deles era o Esqueletão, como é conhecido o Edifício Galeria XV de Novembro. Com 19 pavimentos e situado na Rua Marechal Floriano Peixoto, esquina com a Avenida Otávio Rocha, teve sua obra iniciada em 1956. Entre muitos problemas judiciais envolvendo dezenas de pessoas, donos das lojas do térreo, herdeiros, posseiros e até fantasmas (proprietários que não existiam), apenas em 2023 a Justiça autorizou a prefeitura a demolir o prédio, o que deverá acontecer no próximo ano.
A Lei dos Esqueletos, como ficou conhecida, possibilitava a manutenção do projeto que foi abandonado ou sua readequação. Isso considerando as regras válidas do regime urbanístico da época da aprovação original, o que envolvia questões polêmicas ainda hoje, como altura da edificação, afastamentos, taxa de ocupação e recuos.
Em 2013, o Executivo justificava que os proprietários não conseguiam dar seguimento às obras — ociosas, subutilizadas ou ocupadas por atividades provisórias e inadequadas — em função dos parâmetros estabelecidos pelo Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (PDDUA).
O receio era de que a situação se perpetuasse caso não ocorresse intervenção e incentivo do poder público, dando ao setor privado a possibilidade de concluir as obras. Para tentar reverter esse cenário, a Lei nº 11.531 foi sancionada em 31 de dezembro de 2013.
O ex-vereador João Carlos Nedel, que sugeriu o projeto de lei e atualmente assessora o titular da Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária de Porto Alegre, lamenta que a legislação não tenha surtido efeito prático.
— A lei tinha um prazo para a construção ser reiniciada, que era de um ano. Decorrido esse prazo, nenhum interessado pediu esse benefício, nem reiniciou a construção, e não foi pedida prorrogação do limite — afirma.
Era possível se requerer o pedido de adequação do projeto arquitetônico até um ano após a publicação da lei, devendo a obra recomeçar num prazo máximo de 180 dias após a aprovação do projeto e licenciamento. Também houve a redução do prazo para a conclusão das obras de cinco para três anos, a contar a partir do licenciamento.
Confira o texto da lei neste link.
Sinduscon afirma que lei ajudou e cita complexidade do tema
Procurado, o Sindicato das Indústrias da Construção Civil no Rio Grande do Sul (Sinduscon-RS) avalia que a lei "ajudou", mas ressalta que o assunto envolve aspectos complexos, não sendo algo tão simples de ser resolvido.
O Sinduscon lembra, ainda, que o próprio Esqueletão segue em discussão e elogia a prefeitura por ter feito a parte dela na ocasião da criação da lei. A entidade não tem outros dados sobre os prédios inacabados.
— Não temos um acompanhamento específico disso — observa a vice-presidente Sandra Axelrud Saffer.
Veja a situação dos prédios citados no projeto original
A prefeitura menciona que a Lei 11.531/2013 não citava especificamente os quatro imóveis listados no projeto original, mas explica como está a situação de cada um deles neste momento. Confira abaixo:
- Com frente para a Rua Marechal Floriano Peixoto, nºs 10, 16,18 20 e Avenida Otávio Rocha, 49 - Projeto aprovado, mas sem carta de habitação.
- Com frente para a Rua Coronel Fernando Machado, 860, e Rua Duque de Caxias, 1.247 (ao lado do Museu Julio de Castilhos) - Análise do projeto em andamento, com licenciamento em tramitação na equipe técnica da Secretaria de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade.
- Com frente para a Rua Duque de Caxias, 1.195, e Rua Espírito Santo, nºs 70 e 76 - Projeto indeferido, em junho de 2023, em virtude da não comprovação de documentos dentro do prazo solicitados pela equipe de Licenciamento e Monitoramento Ambiental da Secretaria de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade. A reportagem procurou o proprietário, que não retornou os contatos para explicar o que será feito no local.
- Com frente para a Avenida Júlio de Castilhos, 585, e Rua Comendador Manoel Pereira, 182 - Projeto concluído, com carta de habitação emitida em junho de 2020. Tem carta para uso de auditório vinculado a templo religioso.
A prefeitura da Capital diz também, por meio de nota, que a região central recebe incentivos urbanísticos:
"Esses imóveis tiveram avanços e novas tramitações, conforme informações acima. Em relação aos avanços na região, reforçamos que o Centro Histórico de Porto Alegre está recebendo incentivos urbanísticos, com o Programa de Reabilitação do Centro Histórico, visando retomar a função habitacional, a recuperação dos espaços públicos e a revitalização das atividades econômicas da área".