As recentes chuvaradas que assolaram Porto Alegre levaram a prefeitura a fazer alterações no projeto do trecho 2 da orla do Guaíba. Previsto para ser concedido à iniciativa privada em 2024, o empreendimento situado entre a Rótula das Cuias e o Arroio Dilúvio terá elevação no terreno. Com isso, a cota de inundação, atualmente em 3 metros, será elevada no local para 3m30cm.
O objetivo é prevenir eventuais alagamentos na região após a chuva da última semana elevar o nível do Guaíba a 3m46cm, maior marca desde a histórica enchente de 1941. Segundo a secretária municipal de Parcerias, Ana Pellini, a recomendação para alterar o projeto partiu do Dmae.
— Na verdade, a água não chegou até ali. O alagamento afetou bem mais o trecho 3 da Orla, inundando as quadras. O trecho 2 é mais alto, mas tivemos que adaptar para ficar mais seguro — afirma Ana.
Edital em 2024
Orçado em R$ 400 milhões, o projeto para o trecho 2 prevê a construção de um centro de eventos, um anfiteatro, uma marina pública e um farol-mirante. Além das alterações para elevar a cota de inundação, a prefeitura está readequando o espaço de área construída em função da descoberta de uma linha de transmissão de alta tensão que percorre o local.
A secretária espera concluir todas as obrigações legais e burocráticas até o final do primeiro semestre de 2024, lançando o edital no início do segundo semestre. Ela não acredita que os alagamentos recentes possam afetar o interesse de investidores na parceria público-privada, cujo período administração da área será de 35 anos.
— Não creio que possa afetar o leilão. Hoje está alagado, mas amanhã já não está mais — diz Ana Pellini.
Cais Mauá
Mais adiantado, o processo de concessão do Cais Mauá já tem datas marcadas. A apresentação das propostas ocorre até 14 de dezembro e o leilão será uma semana depois, dia 21, na B3, em São Paulo.
O edital já prevê um novo modelo de proteção contra cheias, prescindindo de parte do muro da Mauá. A iniciativa prevê a derrubada de um trecho de 750 metros do paredão de concreto, desde o fim da linha do trensurb até a Usina do Gasômetro. No local, será erguida uma contenção fixa de 1m26cm de altura, entre o Guaíba e os armazéns.
Atrás dessa mureta haverá uma barreira móvel de 1m74cm, concebida para ser acionada caso o primeiro bloqueio não seja suficiente para conter o avanço das águas. Somadas, as estruturas alcançam 3m de altura, mesmo nível do muro da Mauá.
— As enchentes da última semana chamam a atenção, claro, mas toda a concepção do projeto já considerava esse risco. Essa preocupação foi trazida para a modelagem, tanto que agora se já houvesse essa primeira barreira, de 1m26cm, os armazéns não teriam sido alagados — pontua o secretário estadual de Parcerias e Concessões, Pedro Capeluppi.
Busca por investidores
O primeiro leilão do Cais Mauá, realizado no final de 2022, não recebeu propostas. Nas últimas semanas, Capeluppi tem participado de eventos e palestras para divulgar a concessão. Segundo o secretário, a inundação vista no início da semana não deve afastar investidores.
— Quem vai entrar em uma parceria público-privada de 30 anos analisa com muito cuidado todos os detalhes e faz uma avaliação de risco. Todo mundo sabe que ali existe a ameaça de cheias, mas também sabe que há mecanismos de proteção — afirma Capeluppi.
Para o presidente do Sindicato da Construção Civil do Estado (Sinduscon-RS), Cláudio Teitelbaum, projetos semelhantes em cidades como Belém (PR) e Rio de Janeiro (RJ) demonstram a viabilidade de exploração do cais sem riscos de desastres climáticos.
— O projeto do Cais Mauá já prevê elevação da passarela junto à Orla. É uma primeira barreira mais alta, que aumenta a cota de alagamento. Esse projeto traz mais segurança do que o anterior e as empresas já estão considerando isso — diz Teitelbaum.
A seção gaúcha do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB-RS) tem visão distinta. A copresidente da entidade, Clarice Oliveira, lembra que a região é uma zona aterrada, antes ocupada pelo Guaíba. De acordo com Clarice, os alagamentos atuais evidenciam o potencial de cheias no local, um risco que pode ser ampliado com novas construções na Orla.
— Ficou evidente que o nível do Guaíba sobe. A cidade avançou sobre o rio e por vezes ele volta. Quem investiu no trecho 1 da orla está tendo um prejuízo que não estava na conta. Esse cálculo terá de ser feito por quem quiser disputar o trecho 2 — alerta Clarice.