De uma mesa no canto do Bar Tuim, no Centro Histórico de Porto Alegre, na noite da última quinta-feira (19), o ex-governador Olívio Dutra, 82 anos, surpreendeu os clientes e garçons do tradicional estabelecimento que frequenta há anos. Depois de negar os primeiros pedidos enquanto o músico uruguaio Washington Gularte tocava violão, o político contou com o acompanhamento de uma milonga pampeana para recitar uma poesia.
“Quando o guasca deixa o rancho no abandono, o rancho vira tapera. Cria morcego e cupim. Mas nem sempre foi assim. Deixei meu rancho, um dia; flor de rancho! E me botei no rastro da aventura dessa china gaudéria…”, declamou o ex-governador, ao alcance da câmera do celular do garçom Marcos Lorival, trabalhador do Tuim há 13 anos.
Os versos são os primeiros da poesia “Tapera”, de Aparício Silva Rillo. O vídeo foi publicado no TikTok do garçom, intitulado “O Rancho do Gaiteiro”.
— Pedimos licença, puxamos o violão e tocamos. Em dado momento eu provoquei o Olívio. Ele se assustou, não estava esperando, mas encarou a milonga. E arrasou, declamou muito bem, fazia anos que não via ele — explica o músico e compositor uruguaio Washington Gularte, 63 anos.
— Pegou todo mundo de surpresa, ninguém nunca tinha ouvido ele (Olívio Dutra) cantar ou declamar desse jeito. Assim que ouvi que ele ia declamar, abri o celular, porque uma coisa é tu contar que tu viu, outra é tu gravar e mostrar. São imagens inéditas e históricas — celebra o garçom.
Gularte lembra que conhecia Olívio desde os anos 1980. O músico conta que participava da Casa do Poeta Riograndense, que realizava eventos chamados de "Cafezinho Poético-Musical". Nestes momentos, era comum encontrar o político, frequentador de ambientes culturais da cidade.
Para fechar a noite, Lorival revelou o esconderijo de uma gaita sua e convidou o uruguaio para uma versão acústica de Mercedita, de Ramón Sixto Ríos - já sem a participação vocal de Olívio.
— Mesmo com esta animação toda, mantivemos as regras e fechamos o bar às 21h — garante o gaiteiro.
O jeito foi continuar a noite em outros bares do Centro, esticando as notas mais graves das histórias de décadas passadas.
— Reencontrar ele (Olívio) fez a gente se lembrar de bons amigos e poetas de outros tempos — comenta o uruguaio.