Há duas formas de conhecer o Parque Estadual de Itapuã, um santuário ambiental em Viamão, a 57 quilômetros de Porto Alegre: por baixo, costeando as praias, ou por cima, desbravando os morros. Das quatro trilhas oferecidas ao público, a da Visão é a mais procurada por quem gosta de caminhar mato adentro, subir os cumes e ter uma vista prestigiada do local que em 1991 tornou-se unidade de conservação.
Contando ida e volta, a trilha da Visão soma 2,9 mil metros de extensão e tem duração de 2 horas e 30 minutos, em média. Confere um visual quase panorâmico do parque, cuja área total é de 5,57 mil hectares. Com picos de 193 metros de altitude, permite ver, de um lado do morro, o município de Barra do Ribeiro banhado pelo Guaíba; do outro, Palmares do Sul e as águas de Lagoa dos Patos.
A trilha não é indicada para crianças. As pessoas que fazem o passeio são obrigadas a colocar perneiras, que protegem as pernas até a área dos joelhos, para se proteger de animais peçonhentos como cobras, escorpiões e aranhas. Também são orientadas a levar água, lanche, filtro solar e repelente. Seu nível de dificuldade é considerado moderado.
A trilha foi liderada pelo biólogo Alex Sandro da Silva, um dos cinco condutores locais cadastrados na Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) para organizar os passeios. Nativo da região, ele trabalha há 23 anos no Parque Estadual de Itapuã e passou por curso de formação para aprofundar os conhecimentos sobre a fauna e a flora do local.
A planta que mostra a pureza do ar
O trajeto é ladeado por cactos de diferentes tamanhos, barbas-de-velho caindo dos galhos das árvores com suas folhagens esbranquiçadas — ou barbas-de-pau, como também são chamadas —, e bromélias com folhas pontudas e espinhentas. Alex fez uma parada para que o grupo contemplasse uma figueira centenária.
— As figueiras são quase um ecossistema que favorece a fauna e a flora. São camas dos bugios, que com frequência sobem aqui para dormir. Também suportam plantas como bromélias, que ficam apoiadas sem serem parasitas, além das barbas-de-pau, que servem de indicador da pureza do ar — explicou o biólogo.
Quem frequenta o morro por onde passa a trilha da Visão pode respirar tranquilo: as barbas-de-velho estão espalhadas por toda a área. A trilha sonora é peculiar e, para ouvidos menos acostumados, pode ser confundida com o uivo do vento.
— Estão ouvindo? É o ronco dos bugios. O macho alfa de um grupo de bugios faz isso para demonstrar aos animais dos outros grupos que o território é dele — contou o biólogo.
Um canto quase secreto
Um dos pontos mais interessantes da trilha fica na Pedra da Marca, uma área sensível e escondida que abriga a maior concentração de cactos bolas do parque, que não podem ser pisoteados.
O local ganhou esse nome por causa de uma pedreira de granito rosa que pode ser avistada tanto do Guaíba quanto da Lagoa dos Patos. No passado, serviu de sinalização para as embarcações da Marinha do Brasil. Nos anos 1970, foi explorada para extração, algo que só encerrou quando o parque passou a ser preservado.
— Na década de 1970, o ambientalista José Lutzenberger fazia marcas com tinta vermelha na rocha para não cortarem mais a pedra. Ele comprou briga com quem vinha aqui extrair granito para fazer paralelepípedo ou pedra para construção — disse o biólogo.
A antes de se envolver com o Parque de Itapuã, Alex afirma que também ganhou dinheiro extraindo pedras da região, profissão herdada do pai e que foi ganha-pão de muitas famílias.
Chamadas de armadilhas fotográficas, câmeras presas aos troncos de árvores servem para registrar a presença dos animais que frequentam a mata, principalmente os mais exóticos e ameaçados de extinção, como jaguatiricas. Segundo Alex, pegadas de tatu, graxaim e mão-pelada também costumam aparecer nas bordas de uma piscina natural onde os animais param para tomar água.
Passando por uma espécie de pórtico natural formado por cactos e barbas-de-velho surge a Pedra da Visão, de onde se enxerga a Praia de Fora, a maior do parque, com quase 16 quilômetros de extensão banhados pela Lagoa dos Patos. Dali do alto também é possível ver a Lagoa Negra, a única do Rio Grande do Sul com águas escuras.
Memória afetiva
Fã de trilhas, o auxiliar de serviços operacionais Luciano Fagundes, 45 anos, quis fazer o trajeto da Visão para rever a Praia de Fora, onde passou verões durante a adolescência. Antigamente, o balneário abrigava milhares de casas, removidas quando o parque virou unidade de conservação. Hoje, a faixa de areia está inacessível para o público.
— Eu vinha com meus pais e avós na Praia de Fora quando era liberada, lá nos anos 1980. Depois que fechou, nunca mais vim. Ainda está linda — disse Fagundes.
Para Alex, conduzir as pessoas durante as trilhas no parque é uma forma de fazê-las entender a importância de preservar Itapuã, que oferece os últimos resquícios de Mata Atlântica na Região Metropolitana.
— É gratificante fazer isso. No passado, eu tive uma profissão que agredia o meio ambiente, que é a extração do granito rosa. Hoje, sinto que estou reparando o que fiz. As pessoas se afastaram da natureza. O homem tem que fazer parte da natureza para poder preservá-la. Se as pessoas não entenderem a importância da natureza, não vamos conseguir preservá-la.
Além do passeio até a Pedra da Visão, o parque também oferece as trilhas da Fortaleza, da Onça e do Araçá. Também há um projeto piloto para uma única trilha que compreende todos os quatro passeios.
As caminhadas são feitas de quarta a domingo, mediante agendamento, sempre lideradas por condutores locais como Alex, que compartilham conhecimentos sobre a fauna, flora e a história do parque. Custam R$ 35 ou R$ 45, dependendo do trajeto. A entrada no parque também é cobrada.
Trilhas no Parque Estadual de Itapuã
Parque Estadual de Itapuã: Rua Dona Maria Leopoldina de Fraga Cirne, s/n°, em Itapuã, Viamão
As trilhas funcionam de quarta a domingo, mediante agendamento com os condutores locais
WhatsApp (51) 9 9617-6138/ Instagram @condutoresitapua / e-mail condutoresitapua@gmail.com
Ingresso para entrada no parque: R$ 21,65 (inteira) e R$ 10,83 (meia-entrada).
Valores para participar das trilhas: R$ 35 ou R$ 45, dependendo da extensão do passeio