Cinco dias após o fechamento de bares pela prefeitura de Porto Alegre, proprietários e frequentadores promoveram, nesta quinta-feira (24), uma “batucada” em defesa da ocupação dos espaços urbanos da Capital. O ato reuniu dezenas de jovens na Rua Mariante, em frente ao bar Pito na Rua, um dos três estabelecimentos do bairro Rio Branco interditados no último sábado (19).
De acordo com a Secretaria Municipal de Segurança (SMSEG), as interdições ocorreram após uma série de denúncias de poluição sonora, perturbação ao sossego dos moradores e obstrução do passeio público. Além do Pito, foram fechados os bares Metz e El Aguante. Em nota, os bares alegaram que não foram notificados previamente pelo Executivo.
Na publicação de chamamento para o ato desta quinta-feira, divulgada pelas redes sociais, os bares questionam se “pra se divertir em Porto Alegre tem que ir até o Quarto Distrito?” e acusaram a prefeitura de praticar “uma política de gentrificação” que “quer acabar com os bares culturais da cidade”.
A movimentação se concentrou no canteiro central da rua, entre o Pito e o Metz, a partir das 19h. Pelo menos três viaturas da Brigada Militar foram posicionadas no entorno e permaneceram durante toda a mobilização, que foi pacífica.
Vizinhos participaram do ato
O administrador Douglas Oliveira, 31 anos, mora há mais de dois anos no bairro Rio Branco. O apartamento do jovem fica a poucos metros do Pito e ele garante que nunca teve problemas com barulho ou com lixo deixado pelos frequentadores.
— A abertura dos bares aqui trouxe uma segurança que há muito tempo eu não sentia em Porto Alegre, para andar na rua à noite, ver movimento, ver pessoas. O grande motivo de eu estar aqui é porque eu quero que isso continue. Eu nunca ouvi barulho algum e moro do lado do bar. Nunca vi lixo, porque os próprios donos dos bares recolhem. No meu prédio, eu questionei se eles ouvem barulho, e ninguém reclamou. Uma vizinha ainda agora me perguntou o que era essa manifestação e ela comentou que nunca ouve barulho — diz o morador.
Na avaliação da jornalista Clarissa Ponte, 40, que é mãe de dois filhos pequenos com os quais caminha diariamente pelo bairro, a movimentação dos bares traz mais segurança ao Rio Branco.
— É muito grave os bares terem sido lacrados. As pessoas estão impedidas de acessar os seus ambientes de trabalho, até para, talvez, resolver alguma questão que a prefeitura ou que os vizinhos mais próximos reclamem, de isolamento acústico — sublinha.
Proprietária do bar Pito, Luisa Silveira Nora, diz que a interdição ocorreu de forma arbitrária e aponta dificuldades dos empreendedores para conseguir contato com a prefeitura.
— A gente foi interditado sem ter nenhuma multa de fato. Recebemos alguns autos de infração relativos ao barulho, recorremos e foi isso. Nunca nos informaram nenhuma diretriz do que fazer. Essa interdição se deu por meio da Secretaria do Meio Ambiente. Nossa advogada buscou a Secretaria do Meio Ambiente, que por sua vez disse que era competência da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, que por sua vez disse que seria com a Secretaria de Segurança. Então, a gente está tendo muita dificuldade de ter acesso e entrar em contato com a prefeitura — diz a empreendedora.
Segundo Luisa, quando ocorreu a interdição, não foi informado um telefone de contato pelo qual fosse possível recorrer em regime de plantão. Ela explica que foi apresentada a possibilidade de implementação de um plano de mitigação de ruídos, algo que, segundo ela, é inviável, no momento.
— Como que a gente vai fazer um plano de mitigação de ruídos se a gente não consegue nem entrar no bar? Chegou essa decisão sem nenhuma possibilidade de defesa, o que me parece totalmente desproporcional. Se a gente ficar com os nossos estabelecimentos fechados por mais tempo, eles podem falir — ponderou Luisa.
Os proprietários de estabelecimentos devem se reunir nesta sexta-feira (25) com vereadores para buscar uma solução. O caso já foi discutido anteriormente em audiências públicas na Câmara Municipal, mas o impasse continua.
A prefeitura se manifestou por meio de nota (veja na íntegra abaixo), afirmando que "as três interdições cautelares efetuadas no bairro Rio Branco na tarde de sábado, 19, seguem o que determina o Código de Posturas de Porto Alegre". No texto, a Secretaria Municipal de Segurança também elencou as ocasiões em que ocorreram as abordagens nos estabelecimentos.
Veja a nota da prefeitura
A Diretoria-Geral de Fiscalização (DGF), da Secretaria Municipal de Segurança (SMSEG), esclarece que as três interdições cautelares efetuadas no bairro Rio Branco na tarde de sábado, 19, seguem o que determina o Código de Posturas de Porto Alegre, fixado pela Lei Complementar nº 12, de 7 de janeiro de 1975.
Um dos estabelecimentos comerciais interditados, registrado na categoria de “restaurantes e similares”, foi alvo de 30 denúncias por poluição sonora entre os dias 16 de fevereiro e 31 de julho de 2023. Todos os chamados foram feitos por meio do 156. O local passou por inspeções nos dias 12 e 19 de maio e, em 21 de maio, foi orientado quanto ao volume da música. O som só teve a intensidade reduzida quando os fiscais acionaram a Brigada Militar.
Já o segundo empreendimento, registrado na mesma categoria, foi alvo de dois autos de infração por obstrução do passeio público em 3 de agosto. Outras 13 denúncias foram protocoladas por meio do número 156 - seja em razão do uso irregular do passeio público, ou poluição sonora. Além das autuações efetuadas no início do mês, a DGF promoveu ações de orientação no local nos dias 1º e 6 de junho, retornando no dia 20 do mesmo mês para encerrar uma atividade com música ao vivo na calçada.
O terceiro estabelecimento, autuado em 5 de agosto, é alvo de quatro ações devido à poluição sonora e horário de funcionamento. As interdições cautelares foram realizadas em um horário próximo ao início da operação dos bares para que não houvesse a necessidade de dispersão dos clientes.