Janelas quebradas, paredes pichadas, pombas no telhado e mato crescendo na laje do prédio que já abrigou uma fábrica na Rua Voluntários da Pátria. O cenário onde inicia o walking tour Viva + 4º Distrito sintetiza bem a história da região, composta pelos bairros Floresta, São Geraldo, Navegantes, Farrapos e Humaitá.
O 4º Distrito já foi o motor do desenvolvimento da Capital, uma das potências industriais do país. Mas viveu uma debandada de fábricas e moradores na segunda metade do século passado, ganhando ares hostis — que vêm aos poucos sendo transformados com a chegada de famosos bares, cervejarias e empresas de inovação.
Realizada nas tardes de sábado, desde o começo de setembro, a caminhada histórica do 4º Distrito se propõe a contar o que aconteceu nos últimos 150 anos por ali. Desenvolvida com o hub de inovação BS Project e o projeto @quartopoa, o tour é feito por dois guias de turismo do Viva + Poa, os mesmos que fazem o roteiro das macabras lendas urbanas do centro da Capital.
— A gente já tinha vontade de trabalhar outros bairros, e aqui encontramos empreendedores muito motivados para fazer o tour acontecer — conta Tamara Dias, 35 anos.
O prédio em ruínas onde começa o roteiro era uma fábrica de tecidos entre 1913 e 1927. Chegou a ter 100 funcionários, produzindo, principalmente, meias e moletons. Depois, ainda foi uma indústria de móveis e uma transportadora, e hoje serve especialmente como locação para fotos e filmagens — coisa que o grupo de participantes mais fez por ali na tarde de sábado (9).
As antigas fábricas das Indústrias Renner e da Fiateci também são citadas no percurso a pé de três quilômetros. Na Avenida Cairú, o grupo vê o prédio onde ficava a Neugebauer, a primeira fábrica de chocolates do Brasil. E na esquina com a Avenida Rio Grande, pausa para falar sobre o que já foi um dos grandes cinemas do 4º Distrito, comparando o imóvel já modificado com uma foto do que era há quase 100 anos.
— O Cine Theatro Navegantes foi inaugurado em 1923, tinha capacidade para quase 1.100 pessoas. Os filmes eram em preto e branco e mudos. Tinha uma banda perto da tela fazendo a sonoplastia — conta o guia Evandro Costa, 28 anos.
O guia explica que o 4º Distrito foi desenvolvido em um conceito de "bairro-cidade", com moradia, trabalho, lazer, estudo e tudo o que era preciso para viver. Por isso, uma das paradas ocorre em frente à antiga sede do Clube Gondoleiros, fundado por imigrantes italianos, vindos em boa parte de Veneza.
Hoje um moderno coworking, o prédio foi por muito tempo o epicentro da vida social do 4º Distrito, conta Tamara.
— Aqui aconteciam os matches todos — brinca ela, fazendo referência aos aplicativos de paquera usados hoje.
O walking tour termina na fábrica-bar da Cubo, com degustação de cerveja. O sócio-proprietário Frederico Ottoni apresentou três cervejas da casa: a Festbier (tradicional lager alemã servida nas Oktoberfests, com sabor maltado), a Goiabinha (que leva goiaba, hibisco e sal) e a Cidade Jardim (uma Saison com notas de leveduras belgas e adição de amoras frescas, maturada em carvalho francês). De tira-gosto, nada de amendoim: as pessoas podem pegar na mão e até comer uma porçãozinha de malte.
A maior parte do público que faz o tour é composta por moradores de Porto Alegre ou Região Metropolitana que querem conhecer mais da história do 4º Distrito, mas às vezes aparecem alguns turistas. Alemã, a estudante Lara Hoffmann, 23 anos, veio visitar os pais Stephan, 61 anos, e Ute, 61, que moram na Capital há dois anos, e acabou levando a família inteira para o roteiro.
— A gente mora aqui perto, no bairro Auxiliadora, e conhecia pouco do 4º Distito. Achei muito interessante, informativo. Mesmo aqui na cervejaria, eu não bebo, mas gostei de descobrir que tem — diz Ute.
As inscrições para o walking tour são feitas pela internet, e o preço é de R$ 85 por pessoa (incluindo a degustação de cerveja). Além do uso de máscara durante a caminhada, é obrigatório apresentar o comprovante de vacinação contra a covid-19, com ao menos uma dose da vacina.