O prefeito Sebastião Melo foi taxativo, em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, quanto ao aumento do preço da passagem de ônibus em Porto Alegre, que será apreciado e votado nesta terça-feira (15), a partir das 15h, no Conselho Municipal de Transportes (Comtu):
— Não assinarei uma passagem de R$ 5,20 para a população de Porto Alegre — disse.
O valor atual é de R$ 4,55, sem reajuste há dois anos, e a nova tarifa proposta representaria um acréscimo de 14,3%. Após a avaliação do Comtu, o processo é encaminhado ao prefeito, que define o valor e a data para entrada em vigor.
De acordo com a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), o valor é calculado dividindo o custo do sistema pelo número de passageiros pagantes.
Em março, a prefeitura assinou um acordo com as empresas de ônibus, com mediação do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania de Porto Alegre (Cejusc) do Tribunal de Justiça. A medida resultou em um aporte de quase R$ 16 milhões da administração municipal às concessionárias para cobrir o déficit provocado pela pandemia — em contrapartida, o valor da passagem não subiu.
À Rádio Gaúcha, Melo afirmou que "o sistema de transporte faliu antes da pandemia e foi ladeira abaixo na pandemia". O prefeito argumentou que, no ano passado, foram repassados mais de R$ 100 milhões ao sistema, além dos R$ 16 milhões acordados em 2021.
— Tenho tentado convencer os empresários de que temos que repactuar o sistema no sentido mais amplo da palavra. O que está aí não dá para sustentar. O que está lá no Comtu é R$ 5,20. Não assinarei uma passagem de 5,20 para a população de Porto Alegre. Pretendo produzir uma audiência pública — afirmou Melo.
O prefeito destacou os efeitos da crise, como o alto índice de desemprego e os salários não atualizados. Para o enfrentamento do problema, ele acredita ser fundamental a discussão sobre a retirada dos cobradores dos coletivos, o que resultaria, segundo Melo, em uma diminuição de R$ 0,80 no valor da passagem, mas reconhece que o tema suscita conflitos:
— Se fala em tirar os cobradores, é guerra. Se fala em tirar isenção, é guerra. Se fala em construir alternativas extratarifárias, é guerra. A cidade é maior do que o prefeito. Temos que discutir, cada um tem que ter um fatia de responsabilidade. (...) Não tem condições de eu botar 14% (de aumento) na passagem, vou pegar os trabalhadores em cheio. Vamos discutir esse assunto, tem que botar alternativas. Temos que repactuar esses contratos. Ou nós enfrentamos isso agora, ou vamos passar quatro anos tratando esse tema desse jeito.
As limitações de caixa também foram salientadas pelo prefeito:
— É preciso que a gente encontre alternativas. O dinheiro público está curto, está faltando para todos os lados. Não tenho como tirar R$ 2 milhões, R$ 3 milhões todos os meses e botar no transporte.
Alternativas em estudo
A privatização da Carris é vista por Melo como ponto fundamental para aliviar a situação do transporte público na Capital. De acordo com o prefeito, o projeto de venda da empresa está pronto, e ele espera contar com a colaboração dos vereadores.
— Eu até topo fazer o seguinte: o dinheiro que estou botando na Carris, botar no sistema. Acho razoável. Mas eu não acho razoável botar R$ 6 milhões na Carris, que transporta 22% (dos passageiros). Eu até toparia fazer um acordo. Estou fazendo um desabafo público: até toparia botar no sistema o dinheiro que boto na Carris. Boto 100% no sistema. Mas botar R$ 6 milhões na Carris, que transporta 22%, e mais o sistema privado... Não tem como fazer isso.
Além de extinguir a função dos cobradores, Melo cita outras possibilidades para solucionar os problemas do setor, como mudança dos horários das viagens e dos veículos utilizados, além de acabar com determinadas isenções de pagamento de usuários.
— Tudo o que for possível e constitucional, eu vou fazer. Para os cobradores, a proposta inicial que tenho defendido é fazer um acordo gradativo. Por que os empresários têm tanta dificuldade de botar preços diferenciados em horários diferenciados? Por que a dificuldade de colocar carros menores em horários que não têm passageiros? Você teria uma operação com custo menor. Se você tem um carro grande que anda vazio, você tem um custo grande. Os empresários (dizem) "não, isso não dá certo". Integrar o sistema de transporte coletivo com lotação, os empresários de transporte também não querem. (...) Tudo que você bota na mesa, para os empresários, não pode. Não dá para ser assim.
Para marcar a solidez de sua posição, Melo cogitou até uma possível suspensão do serviço à população:
— A crise vai se estabelecer, e se tiver que parar, que pare. Eu não vou botar dinheiro no sistema desse jeito todo mês.
Questionado sobre o tempo para que o impasse seja resolvido, o prefeito reafirmou que não aceitará a tarifa de R$ 5,20, argumentando que o percentual de aumento é superior ao da inflação, mesmo que se considere o acréscimo no preço dos combustíveis.
— Eu quero, primeiro, detalhamento dos custos, das planilhas. Não vai chegar aqui na minha mesa e vou assinar, entendeu? Eu acho que a inflação é razoável. Pegar a inflação dos dois anos... Acho que o começo de conversa para esse tema é a inflação. Ano passado não teve (aumento), você perdeu passageiro, a cidade está em pandemia, a cidade está transportando 50%, 55% da sua capacidade. Quem diz que é para botar dinheiro público, eu quero saber: de onde eu tiro dinheiro público? É muito fácil dizer "bota dinheiro público e continue pagando as outras contas".