Existe um túnel escondido e abandonado às margens da Avenida Wenceslau Escobar, na Zona Sul. Cavado nas rochas da Vila Conceição, por aquele fosso passava uma locomotiva a vapor no começo do século passado, levando gente da região central de Porto Alegre para fazer piqueniques e tomar banho nas águas do Guaíba.
A Estrada de Ferro do Riacho, ou Trenzinho da Tristeza, como era chamado carinhosamente, surgiu no final do século 19, inicialmente para transportar esgoto. Mas logo passou a fazer transporte de passageiros, virando um dos mais agradáveis passeios da Capital.
O trem foi decisivo para o sucesso da Zona Sul e, mais especificamente, da praia da Pedra Redonda. Isso porque, com os banhistas, veio a demanda por restaurantes, hotéis, tendas de sorvetes e refrescos.
A historiadora Janete da Rocha Machado ouvia da avó, Georgina, as histórias do trenzinho.
– Ela adorava fazer o percurso do Cristal até a Pedra Redonda. Dizia que ia para apreciar o rio e paquerar os rapazes da Via Férrea. E para isso usava seu melhor vestido, aquele domingueiro, e nunca esquecia os sapatos de salto.
Ali na praia de Pedra Redonda, quando o trem chegava ao ponto final dos trilhos, o retorno se dava por meio de uma plataforma giratória. Era uma operação manual feita pela força dos homens da Via Férrea e de alguns passageiros mais prestativos Virava a máquina no sentido bairro-Centro, deixando pronta para a viagem de volta.
A vó Georgina, por exemplo, quando chegava no famoso restaurante dos Pabst que ficava onde é hoje a Sociedade de Engenharia do Rio Grande do Sul (Sergs), tomava suco de grapete apreciando o Guaíba.
O trem era composto por uma locomotiva maria-fumaça pequena, movida inicialmente a vapor produzido por lenha, depois por carvão mineral, que puxava dois ou três vagões. Além da estação na Praça Comendador Souza Gomes, conhecida como Pracinha da Tristeza, também havia a Estação do Riacho (junto à Ponte de Pedra) e a Estação Ildefonso Pinto, ao lado do Mercado Livre, no Centro. Em 1933, a locomotiva foi incorporada à Viação Férrea do Rio Grande do Sul e, em 1936, devido à concorrência dos ônibus, encerrou o transporte de passageiros.
Que lugar é este?
Esta matéria faz parte do especial "Que lugar é este?", que começa como uma provocação aos leitores do jornal Zero Hora e das redes sociais de GZH a partir do detalhe de uma foto para, então, ter a história do local ou dos personagens envolvidos contados no site.
O fosso citado no começo desse texto ainda pode ser visto a partir da charmosa ponte da Rua Picasso. Mas a vista não chega a ser alentadora: a passagem está tomada de garrafas plásticas, latas de cerveja, caixas de papelão e outros tipos de lixo descartado incorretamente.