O Ministério Público ingressou nesta terça-feira (28) com Ação Civil Pública contra a prefeitura de Porto Alegre com objetivo de declarar a nulidade da concorrência feita para conceder a gestão do Mercado Público à iniciativa privada.
Na medida, o MP afirma que foram violados uma série de princípios no procedimento feito pelo executivo municipal e pede que em caráter liminar e urgente a Justiça determine a suspensão do processo licitatório. Três promotores assinam a ação.
A prefeitura lançou o edital de concessão em 5 de junho. As propostas podem ser apresentadas até a sexta-feira (31), quando os envelopes seriam abertos. Mas na sexta-feira (24) uma medida cautelar do Tribunal de Contas do Estado (TCE) suspendeu o processo a partir de representação do Ministério Público de Contas.
Com a Ação Civil Pública de Tutela do Patrimônio Público, o executivo municipal tem mais um obstáculo pela frente. A medida do MP teve como base informações apuradas por um inquérito civil que foi instaurado em novembro de 2019. O objeto do inquérito era "investigar a legalidade, legitimidade e economicidade de promover a concessão da administração do Mercado Público por parte do Poder Executivo Municipal".
Para a os três promotores que assinam a ação, "a decisão do Poder Executivo Municipal contém vícios procedimentais e substantivos que tornam o edital ilegal e, portanto, inválido". Os fundamentos jurídicos do MP são:
- Desvio da finalidade do emprego de concessão de uso de bem público. O MP entende que o contrato administrativo de concessão de uso não é o instrumento jurídico adequado para o tipo de negócio jurídico pretendido pela prefeitura.
- Inexistência de lei que regule o negócio pretendido pelo município. Para os promotores, o executivo municipal se baseou apenas em regras da lei orgânica, que carecem de “regras claras definindo o conceito, o conteúdo normativo, a finalidade, os limites e o procedimento da concessão de uso de bem público”.
- Falta de autorização da Câmara Municipal. O MP destaca que a lei orgânica do município prevê que esse tipo de negócio precisa ser aprovado pela Câmara. Este, aliás, também foi o mesmo argumento do TCE para suspender a licitação.
- Violação ao princípio da soberania popular e ao princípio da gestão democrática da cidade pela ausência de efetiva participação da população no processo de decisão.
- A realização da concorrência em meio à pandemia e à crise econômica instalada viola o princípio do interesse público, o princípio da isonomia entre as empresas interessadas em participar do processo licitatório e o princípio da seleção da proposta mais vantajosa para o Poder Público.
O MP também destacou na petição o risco para permissionários do negócio pretendido pela prefeitura: "o início da vigência da concessão está associado à revogação de todas as permissões de uso das bancas, boxes e demais espaços comerciais do Mercado Público pelos atuais permissionários, com a transferência da posição contratual de comando à empresa concessionária, fato que gerará enorme insegurança jurídica e econômica para os permissionários".
Os promotores registraram ainda que mesmo havendo a decisão por parte do TCE suspendendo o procedimento, está mantida a necessidade de concessão da liminar pela Justiça pelo fato de que a medida do TCE pode ser revertida. A suspensão decorreu de uma decisão monocrática do conselheiro Cezar Miola, que pode ser revertida pelo colegiado do tribunal.
Para o MP, se essa decisão for revertida, resultará na "retomada da tramitação do processo licitatório que, como vimos, é manifestamente ilegal e pode provocar danos jurídicos e econômicos graves à população, ao patrimônio público e aos atuais permissionários dos espaços do Mercado Público".
Ao discorrer sobre o histórico e a importância do Mercado Público para a cidade, os promotores elogiaram a gestão anterior à de Nelson Marchezan pelos esforços na recuperação do prédio e criticaram o fato de a atual gestão não ter avançado em nada para a restauração e recuperação do imóvel, atingido por um incêndio em 2013. O texto diz que o "descaso e a inação" da prefeitura podem ser medidos pelo fato de que a única medida que adotou desde 2017 foi a de repassar à Associação de Permissionários do Mercado Público a responsabilidade por executar obras estruturais que faltam.
— A situação atual do Mercado Público, que desde 2013 não conseguiu se recuperar completamente de um grave incêndio, não decorre de uma suposta incapacidade congênita do Estado de administrar com competência o Mercado Público ou bens públicos em geral, mas de uma decisão deliberada de uma específica administração do Poder Executivo Municipal de manter-se completamente omissa na conclusão das obras de recuperação do Mercado Público, que já se encontravam em fase final quando a gestão teve início — escreveram os promotores.
A ação civil é de autoria dos promotores Cláudio Ari Mello, da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público, e Débora Regina Menegat e Heriberto Ross Maciel, da Promotoria de Habitação e Defesa da Ordem Urbanística.
Procurada, a Procuradoria-Geral do Município (PGM) afirmou que ainda não foi notificada. Assim que tiver a citação, a PGM afirma que tomará as medidas cabíveis para manter o procedimento licitatório, assim como vem fazendo junto ao Tribunal de Contas do Estado (TCE).