Quando Sakae Suzuki começou a vender sashimi e yakissoba em Porto Alegre, a gauchada não fazia ideia do que era. A imigrante japonesa foi provavelmente a responsável por introduzir o peixe cru na terra do churrasco.
Começou em um restaurante minúsculo na Rua Vigário José Inácio, no Centro Histórico. Era um desafio ensinar a clientela a usar pauzinhos de madeira para comer. E como ela praticamente não falava português, às vezes deixava escapar repreensões que não soavam lá muito simpáticas.
— Fregueses antigos perguntam se ainda estou "brabo" — diverte-se a japonesa de 81 anos, 1m45cm de altura e um sorriso (pelo menos aparentemente) angelical.
Quem se lembra dela dessa época é o escritor Luis Fernando Verissimo.
— Ela cresceu pelos seus próprios méritos, com muito trabalho, sacrifício e talento empresarial — afirma o escritor.
Com Tadao Ecchuya, falecido em 2016, ela abriu o Restaurante Sakae's no número 690 da Rua Castro Alves — o sushi mais antigo da cidade, desde 1973. Foi o sócio e companheiro que adaptou a casa de alvenaria para receber os clientes, construindo desde o balcão de madeira ao laguinho no pátio, com pedras que pegou na rua.
Mas essa é a parte feliz da história de Sakae. A imigrante chegou a passar fome depois que chegou no Brasil. O primeiro marido, que veio com ela do Japão, abandonou ela com três filhos pequenos. Para piorar, era alvo de xenofobia: de dentro do bonde, alguns homens atiravam restos de frutas nela quando passava de bicicleta para entregar tofu na casa de outros japoneses.
— Era uma mulher, imigrante, sem marido, com três filhos, sem saber falar português. Mas é uma baita de uma guerreira, não desistiu nunca — conta a nora Virgínia Reis.
Sakae chegou ao Brasil em 1961, em uma viagem de navio que durou 47 dias. Veio enviada pelo governo japonês, para trabalhar na roça. Os primeiros dois anos de serviço foram dedicados a pagar a passagem: plantou no Cantagalo, área rural de Viamão, e em Esteio, antes de morar na Capital.
Acabou conhecendo bem Porto Alegre. A neta, Sophia Ainy Suzuki, 18 anos, que já trabalha no Sakae's, define a avó como um GPS. A família está tendo trabalho para mantê-la em casa em época de coronavírus. A paixão de Sakae é ir ao restaurante: gosta de fazer as entradinhas, atende os clientes que vem há três, quatro décadas e, quando veem, está na cozinha lavando a louça.
Ela só quer que essa fase passe logo.
— Como vou ficar olhando pro teto? — questiona.