No bairro Maringá, em Alvorada, a principal avenida da comunidade é asfaltada. Mesmo que haja alguns pontos com problema, o pavimento está presente. Porém, basta dobrar na primeira esquina para encontrar o chão batido. E é assim em boa parte do município da Região Metropolitana.
Porém, há um outro lado nessa história. Para que os serviços sejam executados, a cidade precisa de verbas. E na conta de Alvorada, um número compromete o orçamento. Trata-se do nível de inadimplência do Imposto Territorial e Predial Urbano (IPTU). Lá, mais da metade da população não quita o imposto anual.
Conforme dados da prefeitura municipal, no exercício de 2019, 55% dos alvoradenses ignoraram o carnê do IPTU. Essa porcentagem representa, em média, R$ 30 milhões a menos nos cofres públicos. Para se ter ideia do que isso significa, em junho do ano passado, a prefeitura de Alvorada anunciou o asfaltamento de 16 vias da cidade, com investimento de R$ 5 milhões. Com o dinheiro que deixou de ser arrecadado, seria possível custear essa mesma obra outras seis vezes.
Outros locais
Não é a primeira vez que Alvorada lidera o ranking da inadimplência do IPTU – a reportagem publicou levantamentos semelhantes em 2017 e 2019, e o resultado foi o mesmo. Porém, a cidade não está sozinha na lista.
A reportagem procurou as 12 cidades da Região Metropolitana. Contando com Alvorada, em cinco municípios o índice de devedores do IPTU supera os 30%. O único local onde o número está abaixo dos dois dígitos é Porto Alegre, onde 8,4% dos contribuintes não pagaram o imposto em 2019.
Eldorado do Sul e Viamão não responderam até o fechamento desta edição. Já São Leopoldo e Canoas não divulgaram os números exatos. Somadas as oito cidades que enviaram os dados, a falta de pagamento do IPTU representa cerca de R$ 155 milhões a menos nos cofres públicos.
O dinheiro que deixa de ser arrecado faz falta. Os tributos, incluindo o imposto sobre terrenos e residências, tem uma vinculação constitucional obrigatória: 25% tem de ser destinados à área de educação e outros 15% à saúde, como explica, em nota, a prefeitura de Canoas. Os outros 60% podem ser direcionados para outros setores, principalmente obras e manutenções.
“O imposto que pagamos dificilmente volta pra cá”
Na cidade que lidera esta indigesta competição, quem paga o imposto não vê o dinheiro retornar em melhorias. No bairro Maringá, citado no início da reportagem, o operador de empilhadeira Elemar Souza, 56 anos, está indignado com o mato que cresce na Rua Eça de Queiroz. A pista é usada como desafogo do trânsito quando alguma obra ocorre na Avenida Maringá, via paralela à Eça de Queiroz. Entretanto, não há asfalto, calçamento ou saibro.
– Tem que ficar muito esburacado para aparecer uma patrola aqui. É sempre uma dificuldade para conseguir retorno dos pedidos que fazemos à prefeitura. Conseguir atendimento para retirada de lixo da rua ou poda de uma árvore que são tarefas quase impossíveis – reclama Elemar, que junto com a sua mãe e vizinha, a comerciária aposentada Maria Lourdes de Souza, 75 anos, desembolsou cerca de R$ 900 de IPTU em 2019.
Vizinho de Elemar, o instalador de esquadrias Silvano Vidal, 34 anos, aponta para o poste na porta de sua casa, na Travessa Lajes, dizendo que esperou 90 dias para conseguir trocar a lâmpada da iluminação pública que estava queimada.
– Acho que só vão asfaltar aqui no dia em que os moradores fizerem uma vaquinha para pagar a obra – critica Elemar.
Em outro bairro de Alvorada, o Intersul, a comunidade não se conforma com a falta de pavimentação nos arredores do Colégio Estadual Olga Benário Prestes:
– Tem que ver quando chove, a criançada andando no meio do barro para conseguir chegar na aula – critica a enfermeira Carla Bride, 43 anos, vizinha da escola.
Para o auxiliar de pressão desempregado Heleno Rodrigues, 41 anos, também vizinho da escola, a falta de retorno do imposto para moradores é visível:
– É só olhar ao redor para ver que o IPTU que pagamos dificilmente volta para cá.