O Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) é daquelas contas certeiras que chegam todo começo de ano. Porém, há quem não o pague, prejudicando a arrecadação das prefeituras e contribuindo para a impressão de que o imposto nunca retorna aos que o pagam.
Somando o valor que se deixa de arrecadar, em média, em 12 cidades da Região Metropolitana questionadas pela reportagem, a inadimplência do IPTU representou cerca de R$ 217,7 milhões a menos nos cofres públicos em 2018.
Existem municípios, inclusive, nos quais o número de inadimplentes é maior do que o de pagantes. Em Alvorada, 58% dos proprietários não quitaram o IPTU no exercício anterior, o que deixou de injetar nos cofres públicos cerca de R$ 25 milhões, conforme o secretário da Fazenda municipal, Marcelo Machado.
Em Viamão, a parcela de não pagadores também é alta, chegando à casa dos 54%. Com isso, só no ano passado, deixaram de ser arrecadados R$ 20 milhões.
Na Capital, a porcentagem de não pagadores é a menor em relação às outras cidades pesquisadas – ficou na casa dos 7,31% no ano passado. Em média, Porto Alegre não recebe cerca R$ 50 milhões referentes à quitação do IPTU todos os anos, de acordo com informações da Secretaria Municipal da Fazenda (SMF).
A administração da Capital credita a menor inadimplência da Região Metropolitana a um trabalho ostensivo de cobrança que vem sendo realizado nos últimos anos. Segundo a SMF, o processo inicia por um contato pessoal com o devedor. Depois, se a situação persiste, o contribuinte é negativado – incluído em sistema de proteção ao crédito –, passa por protesto extrajudicial e, após, por cobrança judicial. Não havendo regularização, o leilão do imóvel do inadimplente pode ocorrer.
Desânimo e indignação de moradores
Para quem mora em Alvorada, cidade com a maior inadimplência entre as consultadas, a falta de pagamento se deve ao sentimento da população em não ver o dinheiro aplicado na cidade. Dono de um antiquário no bairro Maringá, José Carlos Pereira, 63 anos, acredita que a inadimplência no município está diretamente ligada ao que os moradores veem nas ruas.
– A cidade tem um problema muito grande com buracos e problemas na realização de serviços básicos. Algo que não é recente. Então, sem ver o dinheiro do imposto sendo aplicado nas ruas, o morador deixa de pagar – relaciona José.
A doméstica aposentada Edith Barcellos Nunes, 71 anos, não gosta de desembolsar anualmente quase R$ 400 de IPTU. Moradora do bairro Formosa, ela critica, principalmente, as condições das ruas e da rede de esgoto pluvial da comunidade onde vive:
– Quando chove, enche a rua rápido. E se for muita água, até invade as casas.
Moradora do Caminho de Meio, no limite entre Alvorada e Viamão, Osvaldina Dias Brigoni, 68 anos, segue a mesma linha dos outros moradores ouvidos pela reportagem. No caso dela, que vive há 43 anos na cidade, buracos na rua e alagamentos são as maiores incomodações.
– Pago IPTU sempre e nunca nem prometeram asfaltar minha rua. Quando chove, entra água em casa. A sensação é de abandono – desabafa Osvaldina.
Desemprego e prioridade a outras contas
Responsáveis por organizar a arrecadação dos recursos do IPTU, as secretarias municipais da Fazenda indicam fatores que levam a população a deixar de pagar o IPTU. Os pontos mais relevantes, segundo os municípios, são a priorização de outras contas pelos cidadãos ou até uma cultura da cidade de ter uma inadimplência maior, como ocorre em Alvorada. Segundo o responsável pela Fazenda do município, Marcelo Machado, o índice já foi até maior. Para reverter o quadro, a prefeitura trabalha oferecendo descontos aos moradores que quiserem regularizar a situação. Isso também ocorre em outras cidades, onde o pagamento antecipado do exercício atual têm desconto.
– Do ponto de vista de priorização, também tem gente que vai precisar optar entre comida, luz, água, roupas. Enfim, essa situação em famílias mais carentes também afeta o pagamento – acredita Marcelo.
A crise financeira do país que, por consequência, gera um número alto índice de desemprego também é citada pela cidade como uma das razões para o alto número de devedores.
Cai arrecadação, serviços públicos são reduzidos
A falta de pagamento afeta diretamente serviços públicos essenciais. Conforme as prefeituras, o dinheiro que deixa de ser arrecadado precisa ser coberto por recursos de outras áreas. Em Canoas, por exemplo, o não pagamento do IPTU deixou de levar R$ 37 milhões aos cofres da prefeitura. Sem receber repasses do Estado para administrar os gastos na área da saúde, a prefeitura tem custeado os atendimentos dos canoenses e dos pacientes de 156 municípios para os quais é referência. Desde o segundo semestre de 2018, segundo a administração, mais de R$ 40 milhões – quantia próxima do que se perdeu com a inadimplência do IPTU – foram deslocados de outras áreas para a saúde.
A falta de quitação do imposto faz com que os serviços planejados pelas cidades sejam realizados em menor escala. É o que diz a prefeitura de Gravataí, onde a inadimplência “afeta diretamente o volume de serviços públicos dispostos ao cidadão, especialmente na manutenção de infraestrutura e limpeza urbana”. Além disso, em nota, a administração também apontou as áreas de saúde e educação como vítimas da falta de dinheiro do IPTU. É o mesmo discurso da prefeitura de Viamão, onde a inadimplência “gera redução dos serviços e investimentos que poderiam ser feitos em saúde, educação, segurança e Infraestrutura”.