De frente uma para a outra, Mariani de Borba Frank Athaíde, oito anos, e Laura Mendes da Silva, três anos, gargalhavam quando o skate ganhava velocidade na pista pública do bairro IAPI, na Capital. As duas dividiam um equipamento adaptado, com uso de um andador. As brincadeiras entre Laurinha e Mari podiam até passar despercebidas para o público que lotava o espaço. Mas representam aquilo que o projeto Skate Anima de Porto Alegre busca propiciar cada vez mais: a inclusão de crianças e adolescentes com deficiência, por meio da prática do skate.
Enquanto a filha "dava carona" para a amiguinha, Catiani de Borba Frank, 29 anos, acompanhava a cena ao lado do marido, Marcelo Guimarães Athaíde, 35 anos, emocionada. Mari, que nasceu prematura e possui paralisia cerebral, passou a participar do projeto há cerca de dois anos. A família de Novo Hamburgo foi convidada a levar a menina para praticar o esporte e, desde então, não perde uma atividade realizado pelo Skate Anima.
— Uma cena dessas para nós é linda demais. Ver ela brincando. Ela adora. Para nós é um sonho ter um projeto desses. É uma causa nossa, que eles adotaram. Que dedicam o tempo deles. É uma alegria pra todo mundo — diz a mãe, que confidencia já ter levado os parentes e até a professora de Mari para ver a filha se aventurando no esporte.
— Vai, vai! De novo! — ordenava Mari, aos risos, enquanto tinha o andador embalado por um dos integrantes do projeto.
— Para ela tem que ter emoção — diverte-se a mãe.
— Eu vou lá fazer uma foto dela — empolga-se o pai.
O projeto que permite a Mari unir brincadeira, esporte e inclusão, nasceu há cinco anos, durante um atendimento feito pelo fisioterapeuta Stevan de Melo Pinto, 39 anos, idealizador da inciativa. Em 2015, ele atendia Naiumy dos Reis, uma adolescente na época com 12 anos, que possui paralisia cerebral. Quando ela pediu a Stevan para que levasse seu skate para que ela pudesse aprender a andar, ele pensou que não havia compreendido direito. Ela insistiu. Estava decidida a aprender a andar de skate.
— Vi que ela queria andar de verdade. Era algo dela. Uma vontade — recorda.
Diante do pedido, o fisioterapeuta passou a matutar uma ideia para que a menina, que anda de cadeira de rodas, pudesse ficar em pé e experimentar o esporte. Decidiu adaptar o andador, que era usado nos treinos, e acoplar o skate embaixo. Assim, os dois foram para a rampa pela primeira vez e deram início as tentativas. Stevan não imagina a resposta que teria de Naiumy.
— Quando o skate ganhou velocidade, ela abriu um sorrisão. Se empolgou. Eu pensei: vou ter que transformar isso num projeto, para outras crianças. E é isso que estamos fazendo agora — diz.
Hoje com 16 anos, Naiumy segue apaixonada pelo esporte. A adolescente tem o próprio skate, que é transportado no carro da família e acoplado ao andador. Ela costuma andar na Orla do Guaíba e na escola.
— Vamos andar Nai? — convida Stevan, assim que Naiumy chega na pista.
— Vamos! — responda a adolescente, empolgada.
Para a mãe, Roberta dos Reis, foi uma surpresa ver a filha pela primeira vez andando de skate. Atualmente, ela é uma das incentivadoras do Skate Anima, do qual veste a camiseta.
— A sensação de liberdade que ela tem ao andar de skate é sensacional. A sensação de que ela pode tudo. Ela encontrou algo que ela se sente livre. É indescritível. Faz um bem para a autonomia dela. Ela sente vontade de fazer as coisas. E, além disso, ela me diz que se sente muito feliz em ver que outras pessoas que tinham a mesma vontade dela, mas não tinham essa oportunidade, hoje podem — diz a mãe.
Para Roberta, além de abrir as portas para o skate, o projeto também demonstra que as pessoas com deficiência podem participar de outros esportes.
— O projeto está aí para mostrar que eles podem — afirma.
— O skate é um esporte onde a inclusão acontece naturalmente. É um esporte que acolhe diferentes tribos. E é isso que acontece aqui — diz Stevan.
A primeira aventura de Leo
Na atividade na pista do IAPI neste sábado, um dos novatos era Leonardo Aguiar Saneripp Sileneck, 15 anos. A mãe Adriana Aguiar, 48 anos, que reside em Canoas, foi convidada a levar o filho para conhecer o projeto. Leo chegou ao local tímido, mas aos poucos foi se soltando e começou a se empolgar. Na primeira volta, foi empurrado pelo coordenador do projeto, Daniel Paniagua, 35 anos. Quando o skate ganhou velocidade, Leo abriu aquele sorriso que os integrantes do Skate Anima já conhecem.
— Estou encantada. Normalmente, o fim de semana a gente passa mais em casa. Poder fazer uma atividade assim, na rua, é muito bom — confidenciou a mãe, na volta do filho.
O projeto, segundo Daniel, permite que as crianças e adolescentes, com diferentes tipos de deficiência experimentem o esporte. O equipamento é adaptado de acordo com a realidade de cada um. Alguns necessitam de mais suportes e outros apenas de um encorajamento.
— A ideia é estar apto a atender todas as deficiências. E, claro, olhar as potencialidades da criança — diz Daniel.
Não é por acaso que o projeto é desenvolvido em uma pista pública, como a do IAPI. A ideia também é que isso fomente ainda mais a inclusão, permitindo que as crianças e adolescentes estejam em espaços públicos, com interatividade.
— Para a família é importante trazer essa criança para um ambiente de rua, frequentado por jovens. E para nós é recompensador trazer a cultura do skate para crianças que achavam que não podiam — afirma o coordenador.