Passados quase seis anos do incêndio no segundo piso do Mercado Público - a serem completados neste sábado (6) - o discurso sobre a reabertura do espaço é de otimismo frente a entraves superados. Todavia, ainda não há data ou sequer previsão de que o espaço seja reaberto. O que é certo é que o Mercado vai comemorar 150 anos, em outubro, ainda parcialmente interditado em razão da ausência de instalações elétricas.
O estágio atual, na visão da Associação do Comércio do Mercado Público Central de Porto Alegre (Ascomepc), é bem melhor do que já foi. Desde 2013, a situação mais crítica foi entre o final de 2016 e setembro de 2017, período em que as obras pararam completamente por falta de recursos - até ali, provenientes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Na ocasião, o Ministério Público entrou em ação para assegurar que as obras necessárias para a obtenção do Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (PPCI), principal entrave à reabertura na época, fossem realizadas pela prefeitura.
Por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta, a Ascomepc assumiu as obras em troca do abatimento de uma suposta dívida com a prefeitura, sub judice por não ser reconhecida pelos permissionários.
- Fui ao Jornal do Almoço anunciar que as obras recomeçariam, mas o major Lunardi (Ederson Lunardi, então chefe da Divisão de Segurança Contra Incêndio do Corpo de Bombeiros) assistiu à entrevista, me ligou e recomendou que parássemos. A legislação de PPCI para chamados prédios pré-existentes recém havia mudado para algo muito mais simples - conta Adriana Kauer, presidente da associação.
Feita sob a comoção do incêndio na Boate Kiss, a lei de prevenção naquele momento exigia de prédios como o Mercado itens como uma cisterna subterrânea. A mudança permitiu que prédios históricos fizessem as chamadas "compensações". Na prática, saem instalações caras e faraônicas e entram medidas mais simples e supostamente mais eficientes, como um número alto de extintores - mais de 200 - e de brigadistas capacitados entre os funcionários do Mercado - são 116, somadas duas modalidades treinamento.
As obras já executadas permitiram ao Mercado receber um PPCI provisório em março passado e um prazo até novembro para as adequações restantes: alarmes de incêndio, detectores de fumaça e uma rampa de acessibilidade. Tudo certo para retomar o uso do segundo andar até o final de 2019, segundo Adriana, "não fosse um detalhe". A parte elétrica do segundo piso terá de ser refeita. Já foi acertado que a Ascomepc também realizará essa obra, mas não se sabe o prazo e a que preço.
- Como o PPCI executado foi mais simples do que o previsto, contávamos até com uma sobra de caixa para fazermos ou um elevador ou uma nova escada rolante. Agora, com essa da parte elétrica, é possível que gastemos até mais do que o orçado inicialmente para o PPCI, que era cerca de R$ 1,5 milhão - declara Adriana.
Segundo a Ascomepc e a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, a CEEE analisa diferentes projetos para a obra. A associação protocolou também um pedido de orientações, para não desperdiçar recursos e não violar leis de patrimônio histórico, pois o Mercado Público é tombado em três esferas. Até lá, resta ao porto-alegrense aguardar os desdobramentos. Preferencialmente sentado.
Parceria com iniciativa privada causa desconfiança e crítica do MP
Paralelamente às obras do segundo piso, tramita na prefeitura a elaboração de uma parceria público-privada (PPP) para a gestão do Mercado Público. A prefeitura, todavia, pouco fala sobre o assunto. Em resposta a oito perguntas enviadas por GaúchaZH, a secretaria de Parcerias Estratégicas, responsável pelo assunto na prefeitura, respondeu apenas que recebeu o resultado do Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) no último dia de maio e que está "ajustando o material para colocação em Consulta Pública, o que deve ocorrer entre julho e agosto". Já a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, por meio de nota, classificou como "indispensável mudar o modelo de gestão" do Mercado, mas não esclarece em que pontos devem ser mudados.
O andamento da PPP em meio a um Termo de Ajustamento de Conduta causa preocupação no Ministério Público. Já com dois expedientes abertos referentes à obra do PPCI, o MP promete abrir um terceiro sobre a PPP. Até audiência a ser marcada para a segunda quinzena de julho, pedirá que a prefeitura esclareça dados como os limites da ação do município e o balanço financeiro do Funmercado, fundo municipal criado na década de 1980 que deve ter saldo revertido em melhorias ao próprio Mercado.
- Temos em execução um termo de acordo com base no que se tinha naquele momento, para o PPCI. Se a prefeitura lança uma PPP para trazer um investidor e, segundo eles, requalificar o Mercado, isso vai impactar na situação - declara Heriberto Roos Maciel, promotor de Justiça de Habitação e Defesa da Ordem Urbanística.
Junto a permissionários, a PPP é vista com desconfiança. O principal receio, segundo eles, é que, ao trazer um parceiro da iniciativa privada com objetivo de obter lucros, que o Mercado deixe de ser competitivo nos seus preços, o que seria o principal diferencial frente a supermercados comuns. Há também reclamações de falta de transparência.
- A gente não tem como ser a favor de uma coisa que a gente não conhece. Assim como não pode ser contra. Esse processo está andando e nós não somos participantes dele - declara Adriana.