Figura conhecida entre juízes, promotores, advogados e servidores do Foro Trabalhista de Porto Alegre, o engraxate Alexandre Dresch, de 44 anos, que atende os frequentadores do prédio desde 2012, começou a preocupar os clientes e conhecidos que passavam por ali desde o começo deste ano.
Sempre alegre e disposto, Alemão — como é chamado — apareceu para o trabalho com um inchaço no lado direito do rosto, abaixo da mandíbula. Sem ter como custear um tratamento odontológico particular, buscou atendimento em hospitais da rede pública e na assistência odontológica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Em nenhum deles teve o problema resolvido.
— Fui no (centro de saúde) Santa Marta, a dentista mexeu no dente, mas não resolveu. Na Faculdade de Odontologia (da UFRGS), disseram que não podiam resolver. No HPS, fizeram uma tomografia, constataram que era problema no dente, mas disseram que não podiam fazer nada. No Conceição, nem medicação para dor eles me deram — queixa-se.
Sensibilizado com a condição do engraxate, um grupo de advogados trabalhistas montou e divulgou uma vaquinha para arrecadar R$ 3 mil para ajudar no tratamento de Alemão. Em três dias, somando contribuições online com dinheiro doado presencialmente, a meta foi batida.
Mas nem precisava. Ao tomar conhecimento da finalidade da arrecadação, por intermédio de um grupo no WhatsApp, o dentista José Luiz Fraquelli se ofereceu para fazer de graça os tratamentos de canal necessários em seu consultório.
— Quando entrei no link, vi que era tratamento odontológico e disse "cancela essa vaquinha e manda o cara aqui que assumo ele".
Na primeira consulta de Alexandre, nesta segunda-feira (15), o dentista iniciou o tratamento de canal em um dos três dentes que precisarão do procedimento. No entanto, identificou que o inchaço no rosto pode não ser um problema odontológico.
— Por isso, acionei um outro paciente meu, funcionário do Hospital de Clínicas, para ver se conseguimos uma consulta para ele no setor de cabeça e pescoço — relata.
Acolhimento é rotina para Alemão
A corrente de contribuição começou entre os advogados, mas recebeu o apoio de juízes e demais servidores que conhecem e convivem com Alemão diariamente.
— Cobro R$ 10 pelo serviço, mas o pessoal sempre dá um pouco mais. No fim do ano, passo uma caixinha e eles doam uma gorjeta, para ajudar. E também me convidam para a festa de fim de ano dos advogados — regozija-se.
Há pelo menos seis anos, ele instala seu caixote e uma cadeira na sombra de uma árvore que fica em frente ao prédio do foro e dedica-se a embelezar os sapatos de magistrados, procuradores, promotores, advogados, peritos e demais funcionários que o procuram
— É uma pessoa com situação de vida extremamente difícil, mas sempre com um sorriso no rosto — conta a juíza Valdete Severo, titular da 4ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.
O advogado Felipe Carmona, que criou a vaquinha online, disse que, como o tratamento foi doado, os recursos arrecadados pelo crowdfunding serão doados diretamente a Alemão, para a compra de medicamentos utilizados no tratamento do engraxate, que mora em uma casa alugada no bairro São José.
— Vou consultar todas as pessoas que doaram, já que o pedido foi para o tratamento dentário. Mas acredito que ninguém ficará contra (a doação)— afirma Carmona.
Alemão diz que pretende usar os recursos para adquirir medicamentos para o tratamento dentário. O que restar, será guardado para gastos de saúde futuros:
— Sinto muita gratidão por todos eles aqui da Justiça.Não sei nem como agradecer. Se não fosse eles, não sei o que faria.