No quesito transporte cicloviário, Porto Alegre encerra 2018 com números berrantes como o laranja das suas bicicletas compartilhadas. Maurício Villar, diretor da Tembici, empresa que opera o sistema do BikePOA desde fevereiro, faz uma comparação. Em cidades de uso intenso do sistema de compartilhamento como Barcelona, a média diária de cada bicicleta é de quatro viagens por dia. Uma média acima de três — como a de Paris, por exemplo — é em geral comemorada. Na capital gaúcha, cada bike faz 6,5 viagens por dia. A cidade tem algumas particularidades que puxam essa média para cima.
— Em São Paulo, por exemplo, há os horários de pico de uso, no início da manhã e no final da tarde. Obviamente, é quando o pessoal está se deslocando para o trabalho, para a escola ou retornando para casa. Porto Alegre apresenta, além desses horários, dois tipos de uso inusitados: pessoas que pegam a bicicleta para deslocamentos curtos no meio do dia — pagar uma conta, por exemplo — e os que usam no final do dia para lazer. Muitos, inclusive, para passear na orla ao entardecer — conta Villar.
O ranking de popularidade das estações do BikePOA mostra isso. Graças ao movimento para lazer, intenso sobretudo aos finais de semana, as estações líderes em uso foram a Iberê, com 94,3 mil entradas e saídas em 2018, e a da Rótula do Gasômetro, com 67 mil.
Em dias de semana, as líderes são a estação Mercado, no Centro Histórico, e a UFRGS Arquitetura, no campus central da universidade. Elas somaram, respectivamente, 56,7 mil e 60,8 mil viagens. Esse dado é particularmente comemorado pela prefeitura.
— Há um forte pico na estação Mercado, que vai das 7h até as 9h30min, quando as pessoas estão chegando ao Centro Histórico pelo Terminal Parobé ou via Trensub. Depois desse horário, a estação é ultrapassada por essa da UFRGS. O que isso significa? Que as bicicletas não estão servindo apenas para bonito. As pessoas efetivamente contam com elas como um meio de transporte para o dia a dia — declara Antônio Vigna, da Coordenação de Projetos Cicloviários da EPTC, que acompanha o uso das mais de 400 bikes em tempo real do seu computador.
Se os dados são recebidos com festa, há também certa frustração de não poder acompanhar no mesmo ritmo a evidente adesão do porto-alegrense ao transporte em duas rodas com a construção de ciclovias e outras obras viárias. Enquanto o número de viagens teve um crescimento constante ao longo do ano que passou — de 13,2 mil em março para 88,1 mil em novembro — e o número de assinantes cadastrados chegou a 270.321, foram construídos 2,6 quilômetros de ciclovia em 2018. Os trechos mais significativos foram os 650 metros da Avenida Goethe, que serviram para interligar a Vasco da Gama ao Parcão, e a Rua Nestor Ludwig, ao lado do estádio Beira-Rio.
Na Avenida Ipiranga, a ciclovia avançou um quilômetro, entre a Silva Só e a Lucas de Oliveira, embora o trecho a partir da Rua Alcides Cruz ainda precise de conclusão dos guarda-corpos. A prioridade máxima, agora, é concluir o 1,7 quilômetro restante da avenida, possibilitando o trânsito até a PUCRS. Mas, para 2019, houve um recente banho de água fria nos planos da prefeitura. Uma das empresas que liberariam recursos para a conclusão da ciclovia como contrapartida a obras na cidade adiou o investimento. A lei prevê que a empresa faça a contrapartida até 60 dias antes de receber o habite-se. Por isso, o recurso pode vir somente em 2021.
— É um direito da empresa. Não há nada de errado nisso. Para viabilizar as obras até lá, um alternativa é apostar em desburocratizar projetos de adoção ou doação de ciclovias, como é feito com canteiros, praças etc — diz Vigna.
O custo para “fechar” a Ipiranga é estimado em R$ 1,2 milhão. Somente em guarda-corpos, feitos de plástico compactado, o custo é de R$ 350 por metro, o que significa R$ 595 mil para todo o trecho. Em busca de uma alternativa mais barata, a solução pode passar, mais uma vez, pelas bicicletas laranjas do BikePOA. Dessa vez para entender o comportamento do ciclista porto-alegrense e traçar ciclorrotas.