O déficit de professores na rede municipal de ensino de Porto Alegre tem causado transtornos. Embora os professores desdobrem-se para cobrir a falta de colegas, procurando manter os estudantes na escola durante todo o turno de aulas, isso nem sempre é possível, e os alunos acabam muitas vezes liberados antes do horário previsto.
Uma das instituições mais afetadas, a Escola Municipal de Ensino Fundamental São Pedro, situada na Lomba do Pinheiro, zona leste da Capital, conta com 12 professores a menos do que o ideal (carga horária de 20 horas semanais). Na sexta-feira, cinco turmas foram dispensadas. Em média, seis são liberadas antes todos os dias.
O drama vivido por professores e alunos da instituição é apenas um exemplo do que acontece há mais de dois meses. Em março, já no primeiro dia letivo, pais e responsáveis por 76 alunos do primeiro ano do Ensino Fundamental fizeram manifestação em frente à Escola Municipal Emílio Meyer, bairro Medianeira, depois de informados de que não poderiam deixar os alunos na instituição, em razão da falta de oito professores.
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Conforme a Secretaria Municipal de Educação (Smed), o déficit atual é de aproximadamente 250 profissionais, entre professores e monitores. As disciplinas com maior carência são Português, Matemática, História, Educação Física e os anos iniciais do Ensino Fundamental. Na Educação Infantil, conforme a Smed, também há falta de docentes. No total, o município tem cerca de 4 mil professores.
Segundo o órgão, um ajuste no quadro foi realizado recentemente, com a realocação de profissionais de funções administrativas para escolas nas quais o déficit é maior, mas a carência na rede continua. Nos próximos meses, a secretaria analisa a possibilidade de novas nomeações, uma vez que há profissionais aprovados em concurso que ainda não foram chamados.
Questionada por ZH, a Smed informou, por meio de sua assessoria, que há banco de concursados para todas as áreas, mas admitiu que não há previsão de chamada de concursados. Conforme dados da Secretaria de Gestão, responsável pelas nomeações, o cadastro de concursados tem um total de 5.877 professores.
Diretor da Escola Municipal de Ensino Fundamental Especial Professor Elyseu Paglioli, Marco Aurélio Ferraz afirma que, semanas depois de receber da Smed a garantia da nomeação de professores e de que, em razão de a instituição lidar com estudantes com necessidades especiais, os primeiros nomeados iriam para a escola, o caso sofreu uma reviravolta. Na última segunda-feira (22), em encontro com os diretores das escolas de Ensino Fundamental, o prefeito Nelson Marchezan alegou dificuldades financeiras. Disse que a prefeitura deverá chegar ao fim do ano com déficit de R$ 659 milhões e não garantiu a ampliação do quadro de profissionais.
– O prefeito afirmou que não sabe como vai pagar os salários e que não tinha como nomear novos professores – lamentou Ferraz.
Na ocasião, Marchezan também afirmou que a previsão é de que falte dinheiro ainda em maio.
– A prefeitura está quebrada. Queria muito dar outras notícias, mas tenho que falar a verdade – disse o prefeito da Capital.
Mesmo que nomeações sejam realizadas, a situação só tende a melhorar, na melhor das hipóteses, em 30 a 60 dias, tempo necessário para que sejam cumpridos os passos entre a eventual chamada dos concursados pelo município e a sua efetiva presença nas salas de aula. Mas, com ou sem nomeação, garante a Smed, todas as aulas terão de ser recuperadas. "A escola deve indicar no calendário o plano de recuperação das aulas para cada turma que não foi atendida", informa a assessoria do órgão.
Diante da escassez de professores, as instituições viram-se como podem para tentar atender os alunos. Em muitos casos, no horário previsto para a disciplina em que não há professor, os estudantes têm aulas de outras matérias. Os problemas são avaliados caso a caso pelas direções das instituições.
A situação é ainda mais complexa em instituições como a Escola Municipal de Ensino Fundamental Especial Professor Elyseu Paglioli, que atende a alunos com deficiência que, além de atenção especial na alimentação e na rotina escolar, necessitam de atividades complementares como vídeos, dança e desenho. Com a falta de docentes, os profissionais ligados às atividades extracurriculares acabam remanejados. Com isso, os alunos ficam sem as ações complementares.
– Está difícil – comenta o diretor Marco Aurélio Ferraz. – Nos últimos anos, perdemos cinco docentes sem reposição.
Segundo ele, atualmente, faltam quatro professores na escola, mas cinco profissionais estão em processo de aposentadoria, em licença-prêmio ou em férias, o que também prejudica a rotina da instituição.
A situação gera revolta entre os pais. A mãe de uma estudante elaborou um abaixo assinado, com base na Lei de Inclusão (LBI – 13.146/2015), que garante o direito das pessoas com deficiência a terem atendidas todas as suas necessidades, prevendo sanções ao seu descumprimento. Ela levará o documento ao Conselho Tutelar e ao Ministério Público Estadual.
Outra instituição em dificuldades é a Escola Afonso Guerreiro Lima, na Lomba do Pinheiro, que atende 1,2 mil alunos. Conforme o diretor, Samuel Martins, há déficit de docentes para 50 horas semanais de Português, 40 de Matemática e 20 para professor referência de anos iniciais. Além disso, uma professora de 40 horas está se aposentando e outras duas entrarão em licença gestante, resultando em um déficit de 120 horas.
– Quando tem professor que ainda pode, dentro do turno da sua carga horária, dar uma aula, a gente encaixa ele ali. Quando não tem, alguém da supervisão ou o diretor, em horário administrativo, vai dar aula. Mas, quando quem falta é o professor referência, temos que dispensar a turma – explica Martins. – O estresse é diário.