A Assembleia Legislativa retoma, nesta terça-feira (4), a apreciação em primeiro turno da Proposta de Emenda à Constituição da Imutabilidade que aborda a dificuldade em alterar os símbolos do Estado. Um dos propositores do projeto, o deputado Rodrigo Lorenzoni (PL) falou ao Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, desta terça-feira (4), assim como um dos opositores à proposta, deputado Matheus Gomes (PSOL).
— Para nós alterarmos ou fazermos uma discussão ampla sobre a mudança de alguns de nossos símbolos, nós fazemos, hoje, isso por meio de uma lei ordinária. Uma lei ordinária pode ser votada com quórum mínimo, e aprovada por uma maioria simples dos presentes com 15 votos. Ou seja, nós entendemos que 15 votos não são a representação adequada para alterar os símbolos que representam a nossa cultura e a nossa história. Então, o objetivo dessa Proposta de Emenda à Constituição, foi justamente buscar uma maior proteção e justamente que haja uma maior discussão sobre este tema, para que nós possamos evidentemente deliberar — disse Lorenzoni que apresentou a PEC junto a outros 19 parlamentares.
O texto começou a ser debatido na AL na última terça-feira (27), mas a votação não pôde ser concluída devido à falta de quórum. O projeto é uma reação às críticas de movimentos negros ao trecho do Hino Rio-grandense que diz: “Povo que não tem virtude acaba por ser escravo”.
Organizações sociais, com apoio de parlamentares, argumentam que o trecho tem conotação racista, já que não foi a falta de virtude que fez os negros serem escravizados.
— Primeiramente, é importante que o povo gaúcho saiba que nesse momento não há qualquer proposta de alteração do hino ou de outros símbolos do Estado do Rio Grande do Sul. Quem criou essa pauta foi o deputado Lorenzoni e fez isso com um caráter altamente antidemocrático, com um viés autoritário na sua ideia, porque a PEC trata sobre imutabilidade dos símbolos, o que é algo incompatível com o regime democrático. Imutabilidade dos símbolos só existe em ditaduras, em regimes totalitários, porque os símbolos se modificam da mesma forma que a sociedade se modifica. E a simbologia do Estado do Rio Grande do Sul, da nação brasileira, ela foi pensada com um propósito, unir, integrar, agregar o povo gaúcho. Então, à medida que seja necessário pensar em modificações, esse é o curso natural — rebateu Matheus Gomes, que ainda completou:
— Ontem nós tivemos uma audiência pública na Assembleia Legislativa, em que a nova presidente do movimento tradicionalista gaúcho, a historiadora Ylva Goulart, declarou que o movimento tradicionalista gaúcho é contra a ideia de imutabilidade dos símbolos, diz que está disposta a abrir uma mesa de estudos e pesquisa sobre a questão negra no Rio Grande do Sul, que inclua o tradicionalismo, músicos, historiadores, para fazer o debate. E o que o deputado queria, ao propor essa PEC, era justamente impedir o debate.
Outra matéria relacionada aos símbolos do Estado, proposta pelo deputado Luiz Marenco (PDT), por meio de um acordo fechado na semana passada prevê a fusão das duas propostas. Uma emenda protocolada na última sessão leva para dentro da PEC o elemento central do projeto de Marenco: a realização de um referendo, caso alguém deseje alterar o hino, a bandeira ou o brasão. Para ser aprovada, a PEC requer um mínimo de 33 votos favoráveis em dois turnos de votação. Perguntado se considera que o trecho do hino tem conotação racista, Lorenzoni respondeu:
— Evidentemente que não. E não só eu, como a maior parte dos historiadores que têm condições de analisar isso sem nenhum tipo de sectarismo, como faz o deputado Matheus, entendem o contexto e que não há nenhuma alusão à cor da pele — disse o parlamentar do PL.
— Hoje, no Brasil e no mundo, há um debate real da sociedade sobre a necessidade de a gente repensar símbolos que remetam ao período do colonialismo e da escravidão. E infelizmente, por muitos anos, a história do negro gaúcho foi apagada (...) o povo gaúcho valoriza a sua história e nós precisamos continuar debatendo. O que o deputado propôs foi encerrar o debate com uma canetada, decretar o fim da história do Estado do Rio Grande do Sul — completou Matheus Gomes.
Ouça a entrevista com Matheus Gomes (PSOL) e Rodrigo Lorenzoni (PL) na íntegra:
Proposta exigiria mais votos para mudar o hino
No momento, não há qualquer projeto de lei tramitando com objetivo de alterar o hino. Pela legislação atual, uma eventual tentativa de mudança dependeria da aprovação – com maioria simples – de um projeto de lei na Assembleia Legislativa. Seria preciso apoio de metade dos deputados, mais um.
A PEC que está em discussão, se aprovada, torna mais difícil alterar o hino. Ao incluir a defesa dos símbolos no texto da Constituição Estadual, exigiria que somente com maioria absoluta (três quintos dos deputados) fosse possível alterar esses elementos.
Emenda prevê referendo para mudar o hino
A PEC que dificulta a mudança nos símbolos é de autoria do deputado Rodrigo Lorenzoni (PL) e outros 19 parlamentares. Além dessa proposta, há outro projeto sobre o mesmo tema, de autoria do deputado Luiz Marenco (PDT), aguardando votação.
Um acordo político fechado na terça (27) prevê a fusão das duas propostas. Uma emenda protocolada na última sessão leva para dentro da PEC o elemento central do projeto de Marenco: a realização de um referendo, caso alguém deseje alterar o hino, a bandeira ou o brasão.
Neste caso, a população seria chamada a opinar sobre a proposta, em formato semelhante a uma eleição, podendo rejeitar ou ratificar o projeto por maioria.
Primeiro dia de debate
Ainda que a votação tenha sido adiada, a PEC dos símbolos começou a ser debatida na sessão de terça. Primeiro a falar, o autor da proposta disse que o objetivo não é inviabilizar as transformações nos símbolos, mas garantir o amplo debate.
— Entendemos que hoje há uma proteção frágil, pois uma lei ordinária, com maioria simples, pode alterar esses símbolos. Não há aqui intenção de bloquear qualquer discussão de mudanças, apenas garantir que a discussão possa ser feita de forma ampla — afirmou Lorenzoni.
Na justificativa da proposta, os autores da PEC também dizem que os símbolos não podem ser mudados conforme os ventos políticos. “Citamos os frequentes ataques e distorções que têm sido desferidos ao Hino Farroupilha, se tornando uma realidade que ameaça sua estrutura e letra, por mera panfletagem semântica”, diz trecho da justificativa.
Integrante da bancada negra da Assembleia, o deputado Matheus Gomes (PSOL) argumentou, na terça, que o debate sobre a letra do hino não se trata de disputa entre esquerda e direita, mas da defesa de ideias humanistas.
— “Povo que não tem virtude acaba por ser escravo”. Em qual circunstância histórica isso se justifica? Em qual circunstância a escravização se justifica por ausência de virtude? A escravização é um dos piores atos da humanidade — disse Gomes.
O parlamentar também argumentou que o movimento tradicionalista vem se transformando e tende a incorporar o debate sobre a letra do hino.
— Eu não creio que CTGs estão parados no tempo. Pelo contrário, debatem, pensam. Há 20 anos, tivemos no Desfile Farroupilha atos homofóbicos. Mas, há três anos, tivemos uma mulher trans à frente dos festejos. Houve mudanças — acrescentou Gomes.