Antes de completar quatro meses no cargo, o juiz Eduardo Fernando Appio, 53 anos, foi afastado do posto de titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, cadeira anteriormente ocupada pelo agora senador Sérgio Moro (União Brasil-PR) no auge da Lava-Jato. Appio foi retirado do cargo em decisão cautelar do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) após ter sua conduta investigada e ter, supostamente, ameaçado o filho do desembargador federal Marcelo Malucelli.
Eduardo Appio assumiu a titularidade da 13ª Vara em fevereiro, após o juiz Luiz Antônio Bonat, então no posto, ser promovido a desembargador do TRF-4. Na época, os processos que tramitavam em Curitiba correspondiam a 40% do acervo original da operação. Apesar de ter opiniões críticas à condução da Lava-Jato, Appio destacava que não "enterraria" a operação:
— A Lava-Jato na minha mão não vai morrer, não vou ser o coveiro oficial da Lava-Jato, de forma alguma. Eu não aceito esse papel histórico.
Desafeto de Moro e do deputado cassado Deltan Dallagnol, artífices da operação, Appio assumiu o rótulo de "garantista" (termo que se sobressaiu justamente em meio à Lava-Jato; indica um perfil jurídico que prioriza a garantia de prerrogativas individuais), e se tornou um crítico declarado de métodos da operação.
— Mesmo no auge da Lava-Jato, quando havia essa tsunami popular em favor da operação, eu me sentia muito à vontade, como professor, para fazer uma crítica ao que estava acontecendo, porque entendia que havia excessos — disse na ocasião.
As críticas renderam ataques públicos de Dallagnol, que acusou o juiz de alinhamento com um programa ideológico de "esquerda". Na época, Appio negou vinculação a qualquer partido ou movimento político e rebateu o deputado:
— Todo político de extrema direita acredita que o mundo é vinculado à esquerda.
Afastamento
A retirada de Appio do cargo se deu após representação feita pelo desembargador Marcelo Malucelli, que se envolveu em imbróglio no caso do advogado Tacla Duran – ex-advogado de defesa da antiga Odebrecht que acusa Moro e Deltan de agir de maneira ilegal. A Corte regional suspeita da ligação de Appio com ameaças narradas pelo filho do desembargador, o advogado João Malucelli. João é sócio do escritório Wolff Moro, em Curitiba – do qual também constam como sócios a deputada Rosângela Moro e seu marido, o senador Moro.
O procedimento estava sob sigilo. Após a decisão pelo afastamento de Appio, o TRF-4 decidiu dar publicidade ao caso, que está sob relatoria do corregedor regional, desembargador Cândido Alfredo Silva Leal Júnior. O juiz terá 15 dias para apresentar defesa prévia.
Após a decisão vir a público, Dallagnol chamou o magistrado afastado de juiz militante. Em tuíte, o ex-procurador da República fez referência ao fato de o magistrado ter usado a expressão "LUL22" como sigla de acesso aos sistemas da Justiça Federal no Paraná. Horas antes, Appio havia dito que usou a sigla como uma forma de "protesto isolado contra uma prisão que considerava ilegal" e que, à época em que usava tal identificação, trabalhava com direito previdenciário e o hoje presidente estava detido no bojo da Lava-Jato.
O afastamento foi divulgado publicamente horas após o magistrado afirmar ter admiração por Lula. Appio disse que o presidente "é uma figura histórica, muito importante para o país". Frisou, no entanto, que tal "admiração não interfere em nada em suas decisões".
Biografia
Especialista em Direito Constitucional e natural de Erechim, norte do Rio Grande do Sul, o juiz afastado assumiu a vaga de Luiz Antônio Bonat, que sucedeu Moro e agora foi promovido a desembargador do TRF-4. Antes de assumir o cargo, Appio estava na 2.ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Paraná, onde cuidava de questões de Direito Tributário.
Maratonista desde 15 anos, o juiz corre todos os dias:
— Sou viciado em endorfina — afirma.
Também é fã de cinema e literatura. O autor favorito é Philip Roth e o diretor é Elia Kazan.