Confusão, amontoamento de pessoas, demora. Essas são queixas do criminalista gaúcho Lúcio de Constantino em relação às audiências de custódia dos 1.087 presos em flagrante por envolvimento em atos antidemocráticos e nas depredações das sedes dos três poderes, registrados no último domingo (8). Os detidos foram enviados ao sistema penitenciário do Distrito Federal.
Constantino, conhecido advogado de Porto Alegre e professor de Direito Penal, está em Brasília para defender quatro clientes que foram detidos no acampamento bolsonarista que existia em frente ao Quartel-General do Exército, no Distrito Federal.
Eles foram presos no dia seguinte aos atos provocados por manifestantes inconformados com o resultado das eleições e que depredaram dependências do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal.
Num primeiro momento, esses presos ficaram contidos num ginásio da Academia da Polícia Federal, onde passaram por triagem. Mais de 500 acabaram liberados por serem idosos, gestantes e pessoas com comorbidade.
— A realidade é que o esquema para audiências não tem boa organização. São muitas pessoas presas e, em consequência, muitos advogados. Hoje tínhamos mais de cem advogados na entrada do Presídio da Papuda, no Centro de Detenção Provisória-2 (CP-2, onde estão detidos 696 homens), tentando se cadastrar para falar com seus clientes presos. Muitos sequer conseguiram avistar os presos — reclama Constantino.
Outras 391 mulheres estão presas na Penitenciária Feminina do Distrito Federal (conhecida como Colmeia) e também passarão por audiência judicial.
Todos os presos passaram por um processo de triagem médica e foram vacinados contra a covid-19 — nos casos em que ainda não haviam recebido as doses. Os presos bolsonaristas estão separados dos demais detentos e não têm acesso a celular.
As celas têm tamanhos diferentes. Por isso, cada uma recebeu um número diferente de detentos. Dentro de cada uma dessas celas há banheiro disponível. As camas são de concreto, sem artefato que possa ser retirado. Os detidos terão direito a quatro refeições e a tomar banho de sol uma vez por dia.
Já começaram as audiências de custódia (que verificam se a prisão ocorreu de forma tranquila, sem constrangimento ou lesão ao preso). Elas são virtuais. Em cada sessão, participam um juiz, um promotor, um advogado de defesa e o preso.
As sessões desse tipo costumam levar cerca de 20 a 30 minutos. Mais de 30 magistrados foram convocados, além de igual número de representantes do Ministério Público, para acelerar os trabalhos. Só do Rio Grande do Sul, oito procuradores da República participam do mutirão de interrogatórios.
Constantino relata que as prisões têm sido confirmadas pelos magistrados.
— Nessas audiências estão convertendo o flagrante em prisão preventiva. Até agora não se tem notícia de que tenham posto algum preso em flagrante em liberdade.
O advogado, que designou três profissionais do escritório para atuarem em Brasília neste caso, diz que seus clientes não participaram dos atos e vídeos vão mostrar que eles não estavam lá. Entre eles estão cirurgiões e advogados. Conforme Constantino, os clientes foram para o Distrito Federal para participar de manifestação. Eles foram detidos no acampamento bolsonarista, um dia depois.
O advogado também considera que, mesmo para os casos de pessoas flagradas cometendo depredações, não está tipificado o caso de terrorismo.
— Ouvimos entrevistas de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) classificando os presos como "terroristas". Pensamos em levantar suspeição sobre esses magistrados, já que sequer foram analisadas as participações individuais de cada um dos presos nos atos. No caso dos meus clientes, se envolveram em política, não em baderna e muito menos em terrorismo. Caso sejam objeto de prisão preventiva, vamos ingressar com habeas corpus — defende Constantino.