Em uma eleição ancorada nas figuras populares de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), o aviltamento dos partidos políticos e a falta de identificação do eleitor médio com as suas existências novamente ficou explícita. O lulismo e o bolsonarismo deram o tom da disputa, acima de qualquer tradição partidária, e legendas históricas, notadamente PSDB, PSB, PDT e PTB, entre outras, saíram do pleito diminuídas. O Novo, que despontava como emergente, sofreu tombo e sequer atingiu a cláusula de desempenho. O MDB, outrora gigante fiador da governabilidade no Congresso, manteve-se como força intermediária.
A crise de imagem dos partidos políticos coincide com o processo de erosão da democracia representativa. Há diferentes olhares sobre o ponto de largada para esse cenário, mas parte deles converge apontando as manifestações de rua de 2013 como o início de tudo. Foi naqueles protestos massivos, que viriam a adquirir caráter agressivo, que a popularidade e a legitimidade de governos, lideranças, instituições e partidos políticos restou nocauteada. Jogados à lona, não conseguiram se reerguer desde então, amargando descrédito.
As causas para essa crise, perceptível nos dias de hoje, apesar dos expressivos resultados obtidos nas eleições por PT e PL, são diversas. A democracia está em transe, operada de forma direta por cidadãos organizados ou referenciados por entidades de fora do establishment político, impulsionados pela revolução digital. A política, cada vez mais, está sendo feita por organizações da sociedade civil. Os partidos perderam o monopólio da mediação político-eleitoral. Nos dias atuais, são concorrentes nessa relação as redes sociais, as igrejas evangélicas e os militares, que voltaram com força à política desde 2018, na onda do bolsonarismo.
– O eleitor virou as costas para a política tradicional e começou a se refugiar em centros de referência, novos polos de poder, como associações, federações, movimentos. Isso em função do descrédito da política tradicional. E a tecnologia tem aproximado o eleitor da esfera política, tem colocado o eleitor na mesa de debates. Isso não era possível no passado e retirou dos partidos a primazia da mediação do debate. Os partidos tinham grande visibilidade. Só eles eram ouvidos – destaca Gaudêncio Torquato, consultor e professor titular da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (USP).
Há quem diga que, no início dos anos 1980, o papel agora exercido pela internet, por templos religiosos e pelas Forças Armadas esteve nas mãos dos sindicatos de trabalhadores, que representaram uma revolução nas relações políticas sob a ditadura militar. Nesse sentido, sobretudo a tecnologia significa, atualmente, uma nova transição.
– A revolução tecnológica produziu efeito de destruição criadora nos modos de representação da democracia liberal. Tudo o que era parte do chamado establishment da democracia liberal, as instituições de mediação e filtros, perdeu peso. E a política foi reinventada. Passamos a ter expressão direta. Um ambiente tribalizado, emocional, e um certo radicalismo tomou as democracias. Essa é a questão estrutural. E temos um fenômeno mais brasileiro, a modelagem do nosso sistema político, que favorece a pulverização, a fragmentação excessiva dos partidos. Temos hoje 23 partidos no Congresso (bancadas eleitas), mas não temos 23 ideologias. Há siglas que são, basicamente, operadores de recursos públicos. É natural que a sociedade tenha desconfiança – analisa Fernando Schüler, cientista político e professor do Insper.
Temos hoje 23 partidos no Congresso (bancadas eleitas), mas não temos 23 ideologias. Há siglas que são, basicamente, operadores de recursos públicos. É natural que a sociedade tenha desconfiança.
FERNANDO SCHÜLER
Professor do Insper
O doutor em Sociologia Marcos Rolim tem diagnóstico semelhante com relação aos danos causados pelo formato do sistema eleitoral brasileiro. Nas eleições parlamentares, o sistema é de lista aberta: as vagas são asseguradas aos mais votados de cada sigla, até preencher o número de cadeiras conquistadas por cada legenda.
E o voto é diretamente na pessoa. Outro ponto de discussão é o financiamento público de milhares de candidaturas país afora. Antes de 2017, não havia cláusula de desempenho que exigisse um mínimo de votos para que os partidos gozassem de direitos como o acesso aos programas de rádio e TV e aos recursos financeiros. As disputas são personalistas, focadas em figuras, e não em ideias. Manter legendas em funcionamento, mesmo que de baixa representatividade, tornou-se uma operação financeira cobiçada. São fatores que favorecem a fragmentação partidária.
– Se tivéssemos seis ou sete partidos no Congresso, todas as linhas ideológicas estariam representadas. Mas temos 15 ou 20 partidos que não representam nada. São instrumentos de disputa política para garantir poder de oligarquias. Não se sabe o nome desses partidos ou o seu programa. São siglas de aluguel – avalia Rolim.
Se tivéssemos seis ou sete partidos no Congresso, todas as linhas ideológicas estariam representadas. Mas temos 15 ou 20 partidos que não representam nada. São instrumentos de disputa política para garantir poder de oligarquias. São siglas de aluguel
MARCOS ROLIM
Doutor em Sociologia
Reduzir os partidos com bancada no Congresso, além de contribuir para dar mais identidade programática, facilitaria a governabilidade. Com a coesão facilitada para que o presidente da República consiga uma maioria que lhe permita governar, seria reduzida a intensa negociação em que apoio nas votações é trocado por nacos da máquina e do orçamento público, práticas que se desmoralizam desde o pós-redemocratização.
– Os partidos estão numa perda progressiva de representatividade. Cada vez mais, o vínculo com o eleitorado enfraquece. Eles poderiam aumentar as condições de governabilidade se, no Brasil, fosse estabelecido um modelo como o francês, que dissocia a eleição do presidente da eleição dos parlamentares. Porque o presidente eleito entra na disputa na eleição parlamentar para fazer a sua bancada. Isso funciona na França. O presidente eleito se vê na necessidade de disputar politicamente a base parlamentar. No nosso sistema, já recebe um Congresso pronto – discorre o filósofo Denis Rosenfield.
Cláusula de desempenho: uma solução possível
Todos os pensadores ouvidos pela reportagem de GZH têm um ponto de convergência sobre uma das formas de reduzir a fragmentação partidária: manter em vigor a Emenda Constitucional 97/2017, cujo texto acabou com a possibilidade de coligação nas eleições parlamentares e estabeleceu a cláusula de desempenho. Isso representa um patamar mínimo de votos ou de eleitos que os partidos têm de alcançar para a Câmara. Na eleição de 2022, 16 dos 32 partidos que disputaram o pleito ficaram abaixo da cláusula de desempenho, de 2% dos votos válidos. Com isso, perderão acesso ao fundo partidário e ao horário eleitoral no rádio e na TV. Para recuperar esses direitos, as legendas têm de fazer fusões ou incorporações, o que reduz o número de agremiações. Outras organizações que ultrapassaram com folga a cláusula discutem fusões com o objetivo de ficarem mais fortalecidas.
A régua é crescente e, a partir da eleição de 2030, a cláusula de desempenho será de 3% dos votos válidos. Ou seja, a tendência é de que o enxugamento de siglas persista no médio prazo.
– As pessoas não sabem disso, mas os EUA têm centenas de partidos. Só que, na prática, são só dois: Democratas e Republicanos. As regras de representação são restritivas e criam uma realidade de bipartidarismo. No Brasil, tivemos tempos de liberdade plena e nenhuma cláusula de desempenho que criasse partidos efetivos. Temos agora essa cláusula, e espero que não seja alvo de modificação legislativa – diz Rolim.
Embora haja concordância quanto à manutenção da cláusula de desempenho, há divergência sobre produzir um sistema político que substitua o atual de lista aberta e nominal, um modelo considerado incentivador do personalismo e encarecedor de campanhas.
O eleitor virou as costas para a política tradicional e começou a se refugiar em centros de referência, novos polos de poder, como associações, federações, movimentos. Isso em função do descrédito da política tradicional. E a tecnologia tem aproximado o eleitor da esfera política, tem colocado o eleitor na mesa de debates.
GAUDÊNCIO TORQUATO
Professor da USP
Para Schüler e Rosenfield, o caminho é o voto distrital, mecanismo em que os Estados seriam divididos em subterritórios e os candidatos ao parlamento concorreriam para ser os representantes dessas regiões. Ou seja, em vez de pedir votos no Rio Grande do Sul inteiro, fariam isso na Região Metropolitana, na Campanha, na Serra ou no Norte, dependendo da sua base eleitoral.
– A forma de superar a pulverização é o voto distrital, seja puro ou misto (parte distrital e parte proporcional). Isso baratearia as campanhas porque se dariam nos distritos. É um modelo consagrado que politiza a eleição. Você vai, nos distritos, comparar a posição de cada candidato e partido. Os perfis são conhecidos e não precisa de grande estrutura. Retoma o sentido originário das democracias, o encontro face a face, em vez desse populismo eletrônico que tomou conta – avalia Schüler.
Ele ainda defende o fim do financiamento público das campanhas. Argumenta que há “boas experiências” no país de financiamento coletivo e cita como exemplos os casos do PSOL e do Novo, siglas de programas e perfil ideológico estabelecidos e que têm a prática de auxiliar na sustentação da vida dos partidos com contribuições de pessoas físicas.
A questão do financiamento público é um ponto complexo. Por um lado, seu fim pode levar os partidos a terem de se sustentar, o que seria desejável do ponto de vista da economicidade e da moralidade. Por outro viés, a democracia tem um custo e é possível prever asfixia financeira de legendas relevantes sem acesso ao recurso público, ainda mais em cenário de reconhecida crise de identidade e de erosão institucional. A democracia poderia se fragilizar ainda mais, privilegiando partidos que têm acesso a doadores afortunados.
– O sistema que temos de votação em lista aberta e nominal é uma desgraça. Se a gente olhar aqui mesmo na América Latina, todas as democracias mais consolidadas têm votação em lista fechada. Cada partido escolheria os seus candidatos, com seus critérios. Se eu tenho de votar numa lista, e não em uma pessoa, o argumento só pode ser político. E não individual. A campanha seria feita de propostas, porque tenho de convencer as pessoas a votar na minha lista. Hoje a preocupação na política é trazer pessoas conhecidas e que podem ser boas de votos, como pastores, celebridades e youtubers. É isso o que queremos? O voto partidário traria campanhas mais baratas. Não está errado o financiamento público. Errado é financiar milhares de candidaturas individualmente – avalia Rolim.
O voto em lista fechada é aquele em que a legenda define previamente uma nominata de candidatos em ordem de prioridade. O eleitor vota somente no partido, e as vagas parlamentares são destinadas aos mais bem colocados na lista, de acordo com as cadeiras conquistadas pela sigla.
O vácuo pós-Operação Lava-Jato
Na avaliação de especialistas, a Operação Lava-Jato foi um marco na desestabilização de agremiações que já vinham desgastadas e que receberam golpe definitivo com a revelação de esquemas de corrupção.
– A Lava-Jato desmonta o sistema partidário na forma como foi constituído no pós-redemocratização. É curioso que o partido mais atingido, o PT, com o impeachment de Dilma Rousseff e a prisão de Lula, foi o que mais resistiu. Outras siglas praticamente desapareceram. E aí veio o Bolsonaro, que é mais um movimento do que um partido. Bolsonaro ocupa o vácuo produzido pelo desmonte partidário causado pela Lava-Jato – analisa o cientista político Carlos Borenstein.
A Lava-Jato desmonta o sistema partidário na forma como foi constituído no pós-redemocratização. E aí veio o Bolsonaro, que é mais um movimento do que um partido. Bolsonaro ocupa o vácuo produzido pelo desmonte partidário causado pela Lava-Jato.
CARLOS BORENSTEIN
Analista político
O PT, na eleição de 2022, ampliou sua bancada de deputados e elegeu Lula para o terceiro mandato presidencial em uma disputa histórica. Pesquisa Datafolha publicada em outubro de 2022 mostrou que 35% da população aponta o PT como o partido com o qual simpatiza. Depois, aparece o PL com 20% da preferência e, após um abismo, surgem PSDB (3%), PSOL (3%), MDB (3%), PDT (2%) e Novo (2%). Uma fatia de 35% dos brasileiros declarou não ter simpatia por nenhum.
A resiliência do PT, apontam analistas, é fruto da existência de um histórico programa partidário que produz identificação, sobretudo dos mais pobres, nos dias atuais. Ronsefiled, por exemplo, considera a doutrina do PT atrasada, mas reconhece que é dos poucos partidos que reproduzem esse comportamento. Isso causa certo engajamento. Além disso, o PT é o principal produto da revolução anterior do sistema político brasileiro, a do surgimento dos sindicatos de trabalhadores. Foi naquele nascedouro que Lula e o PT pularam à frente de Leonel Brizola e do PDT no campo da esquerda já na eleição de 1989. Apesar disso, o PT também não escapa à crise dos partidos. A mesma pesquisa Datafolha mostra que a legenda sofre rejeição de 39% do eleitorado – ou seja, tem mais detratores do que simpatizantes. As vitórias nas urnas em 2022 não escondem que, hoje, o lulismo é maior do que o PT. Outro fator reconhecido pelo próprio Lula é que a campanha presidencial superou o tradicional arco de alianças petistas e contou com a adesão de centristas e até setores da direita que viam em Bolsonaro uma ameaça à democracia.
– Se olharmos ao longo da história, há poucos exemplos de partidos com enraizamento social. O último exemplo é o PT, mas hoje ele é dependente da figura do Lula. Nos Estados, o PT ganhou onde o Lula é mais forte – diz Borenstein.
O PL, que saiu da eleição com a maior bancada da Câmara, é considerado um típico caso de força do bolsonarismo. Se Bolsonaro pedir desfiliação logo mais, como fez após a eleição de 2018 ao sair do PSL, a tendência é de a sigla ser esvaziada. Entre analistas, a certeza é de que o PL sofrerá diminuição na próxima janela partidária, com a migração para outras legendas de deputados do Centrão que desejam apoiar o governo Lula. Ou seja, a bancada do PL tem menos a ver com a força partidária e mais com Bolsonaro.
O PSDB, nesse enredo, representa a decadência mais acentuada: foram apenas 13 deputados federais eleitos em 2022, ante 54 em 2014. A partir de dificuldades de renovação dos quadros, dos estragos da Lava-Jato e de erros no pós-eleição de 2014, a histórica legenda, parte importante na criação do Plano Real, passou a definhar, deixando de polarizar a disputa nacional com o PT.
– O meu partido, infelizmente, entrou em parafuso. Hoje a posição do PSDB é não ter posição. Como um partido que tem democracia no nome não teve posição diante da maior ameaça à democracia desde a Constituinte de 1988 (referência a Bolsonaro)? O povo brasileiro se mostrou altamente politizado. Quem não tem posição, tende a definhar. Integrantes da bancada votaram pelas pautas mais radicais do bolsonarismo, como a PEC do voto impresso. Parlamentares do PSDB exerceram seus mandatos na órbita do bolsonarismo, outros foram contra isso, mas o fato é que o partido não conseguiu tomar posição – diz o ex-senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), que faz parte do núcleo de tucanos históricos.
Ele avalia ter espaço para seguir buscando a consolidação de uma terceira via que seja alternativa ao lulismo e ao bolsonarismo, seja com a fundação de um partido de centro, a criação de federação ou a fusão de agremiações já existentes. Aloysio aponta que a reeleição de Eduardo Leite (PSDB) no Rio Grande do Sul é uma prova de que a polarização pode ser quebrada.
– Eduardo rompeu a polarização diante do PT, que é forte no Estado, e de uma expressão ruidosa do bolsonarismo, com o Onyx Lorenzoni (PL). No plano estadual gaúcho, a terceira via se materializou. Mas eu não saberia dizer qual é o futuro do PSDB. Precisa de posição política. Quem não é nada, vira nada. Aí cada deputado vai buscar sua emenda, uma obra para o seu município, e tende a desaparecer. Exceto se alguém recuperar essa liderança que está jogada no chão – pondera Aloysio.
Nichos conceituais para voltar a ter força
Prepondera entre analistas certo consenso de que os partidos políticos somente irão voltar a gerar identificação popular se produzirem doutrina política, apresentarem planos para o país e tomarem posição no xadrez atual. É preciso abandonar as posturas muristas, antagônicas ou camaleônicas, que mudam conforme as conveniências.
– Os partidos precisam reprogramar suas identidades inspirados em doutrina e ideologia. É o caminho para conquistar a adesão do eleitor. Hoje o brasileiro não consegue distinguir PSDB, PL, MDB ou PP. O que cada um prega? Acredito que estamos entrando numa era mais doutrinária. Se quiserem credibilidade, é necessário buscar nichos conceituais, sob pena de seguirem a receber o desprezo da sociedade – teoriza Gaudêncio Torquato.
Pela esquerda, analistas apontam o PSOL como sigla que produz doutrina e engajamento, sobretudo em pautas econômicas e de direitos humanos. A legenda cresceu na eleição de 2022. Há partidos de extrema-esquerda profundamente ideológicos, como PCB e PSTU, mas trata-se de diminutos grupos radicais que repelem o eleitor médio com suas pautas.
Pela direita, o Novo é indicado como um partido de reconhecida doutrina liberal. Apesar disso, caiu de oito para apenas três deputados federais em 2022. A causa do esvaziamento de um partido que despontava como emergente passa, dentre outros motivos, pela força do bolsonarismo, que capturou todo o eleitorado de direita, não deixando espaço para liberais clássicos ou moderados.
– O Novo foi esmagado pelas grandes estruturas – opina Torquato.
No plano estadual gaúcho, a terceira via se materializou (com a vitória de Eduardo Leite). Mas eu não saberia dizer qual é o futuro do PSDB. Precisa de posição política. Quem não é nada, vira nada. Aí cada deputado vai buscar sua emenda, uma obra para o seu município, e tende a desaparecer. Exceto se alguém recuperar essa liderança que está jogada no chão.
ALOYSIO NUNES
Ex-ministro e senador tucano
Para Rosenfield, a “direita liberal desapareceu sob Bolsonaro”. Por fim, há ainda a avaliação de que o bolsonarismo é um eixo emissor de doutrina, baseada em valores familiares, religiosos e ufanistas. Na maioria das demais legendas, prepondera o vazio, a ausência de propostas claras e os posicionamentos de ocasião.
Embora analistas tenham convicção de que a ideologia é o caminho, a complexidade do cenário torna isso imprevisível e envolve diversos outros fatores políticos, sociais e de linguagem. O ex-presidenciável Ciro Gomes (PDT) lançou um Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) e falou dele repetidamente, com ideias pormenorizadas para o país impressas em um livro, mas houve pouco eco. A população não escutou, Ciro acabou a eleição em quarto, registrando seu pior desempenho em corridas ao Palácio do Planalto. O PDT sobreviveu, mas encolheu, se comparado com a eleição anterior.
A longeva crise dos partidos não significa que serão extintos amanhã ou depois. A democracia brasileira garante a eles a organização do pleito eleitoral de forma que, apesar do momento de deslegitimação, eles continuarão tendo protagonismo. O necessário, avaliam especialistas, é que se adaptem aos novos tempos para recuperar a respeitabilidade e a representatividade.
– Não existe democracia sem os partidos, só que eles são parte da sociedade e precisamos que eles assumam as parcelas de pensamento dessa sociedade. As demandas sociais só serão legitimamente consolidadas por meio dos partidos dentro do Congresso. São eles que vão fazer as leis. Os partidos são o filtro da democracia – avalia Torquato.
Carlos Borenstein concorda com o diagnóstico de erosão, mas prefere afirmar que o período é de transição.
– Ao mesmo tempo em que existe a crise, os partidos se tornam atores relevantes na medida em que cabe a eles discutir os candidatos que vão disputar o pleito. Eles têm a função de organizar o processo eleitoral. E, depois, em que pese a fragmentação, os partidos são importantes para a governabilidade – afirma Borenstein.
Logo, o cientista político entende que o período é de transformação: uma delas é a passagem de legendas historicamente analógicas para o mundo digital. O bolsonarismo, mais semelhante a um movimento, já nasceu na esfera das redes.
– Os partidos precisam renovar a linguagem, mas isso traz o risco de eles passarem a investir industrialmente na produção de desinformação. A gente viu nessa campanha os principais candidatos tendo os seus produtores de fake news. Acredito que a solução virá via aprendizado. A democracia não vai voltar para a caixinha na qual estava há 30 anos. O eleitor ganhou poder e vai expressar isso. Será uma democracia mais intensa e mobilizada. Não acredito no fim da democracia. Ela vive uma crise de crescimento – diz Fernando Schüler.