O Congresso tenta blindar as verbas do orçamento secreto, prática adotada por diversos parlamentares para receber emendas não rastreáveis em troca de apoio a propostas do governo federal no Legislativo, do bloqueio planejado pela área econômica do governo do presidente Jair Bolsonaro nas contas públicas neste ano. Nesta terça-feira (29), a Comissão Mista de Orçamento (CMO) aprovou um projeto de lei que mexe nas regras para a execução do orçamento e alterou a proposta para proteger essas emendas dos cortes e ainda ampliar o uso dessas verbas para obras em estradas indicadas pelos próprios parlamentares.
O movimento reforça a pressão de parte do Congresso pela liberação de recursos antes das eleições, enquanto o Ministério da Economia propõe contenção dessas despesas no primeiro semestre do ano. No projeto original, o governo queria incluir as emendas no corte planejado para as despesas federais neste ano, segundo apuração do jornal Estado de S. Paulo.
O projeto ainda dependerá de votação no plenário. Na semana passada, a equipe econômica anunciou um bloqueio de R$ 1,72 bilhão no orçamento de 2022 para cumprir o teto de gastos e conter a pressão pelo aumento de despesas. Nesse caso, a quantia só será liberada quando o Executivo descartar o risco de descumprimento da regra fiscal. Os alvos do corte devem ser anunciados nesta quarta-feira (30). Pelas regras em vigor, o governo poderá bloquear as emendas.
O relator do projeto, deputado Juscelino Filho (União-MA), retirou as emendas e autorizou apenas o corte nas despesas discricionárias sob o guarda-chuva dos ministérios. É uma maneira de proteger as verbas de maior interesse dos parlamentares, além de evitar que o governo segure a liberação de emendas em ano de eleições. Há uma pressa do Congresso para o pagamento dos recursos, que só podem ser liberados até o dia 1º de julho em razão da lei eleitoral.
Além de proteger as emendas, o relator também incluiu um dispositivo para autorizar a destinação de verbas parlamentares para obras em estradas vicinais, aquelas que fazem ligações de rodovias federais, estaduais e municipais. Atualmente, a LDO proíbe a entrega de verbas para ações que não sejam de competência da União. O Congresso, porém, incluiu essa autorização nos dois últimos anos para irrigar redutos políticos de deputados e senadores.
Pressão
O movimento de parte do Congresso é mais uma pressão na disputa por verbas com o Executivo, já que os parlamentares também se movimentam para derrubar vetos do presidente Jair Bolsonaro ao orçamento. "O modal rodoviário é responsável por parcela considerável do transporte de cargas e passageiros e as estradas vicinais viabilizam a chegada de insumos aos centros produtivos e também a saída de produtos no país", justificou o relator.
A estratégia dos parlamentares é usar recursos do orçamento secreto para essas obras. Para este ano, estão previstos R$ 2,9 bilhões em gastos para "apoio a projetos de desenvolvimento sustentável local integrado", dos quais R$ 1,86 bilhão está vinculado ao relator-geral do orçamento, que comanda a distribuição de emendas não rastreáveis. Nos dois últimos anos, foi nessa ação que o Congresso destinou verbas para despesas investigadas via orçamento secreto, como a compra de máquinas agrícolas.
Fundo eleitoral
O projeto aprovado na CMO também inclui na LDO a autorização para o corte em impostos federais sobre os combustíveis sem compensação fiscal, regulamenta o pagamento de precatórios e evita que o governo tenha de aumentar o fundo eleitoral para R$ 5,7 bilhões neste ano.
A proposta tenta resolver um impasse entre técnicos, integrantes do Executivo e parlamentares sobre o tamanho da verba para financiar as campanhas políticas neste ano. O orçamento de 2022 autoriza R$ 4,96 bilhões para o chamado "fundão", valor recorde e mais do que o dobro destinado nas últimas eleições, em 2020. O recurso é usado para financiar campanhas de candidatos na disputa de outubro. O aumento foi encabeçado pelos partidos do centrão, bloco de siglas sem ideologia que atualmente apoia o governo federal, e teve o apoio de algumas legendas da oposição.
No ano passado, o Congresso aprovou um dispositivo na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022 que definia o valor do fundo eleitoral com base em um porcentual de recursos da Justiça Eleitoral, uma fatia das emendas parlamentares de bancada e recursos oriundos do fim da propaganda partidária no rádio e na TV.
O cálculo apresentado na ocasião apontava para R$ 5,7 bilhões, mas o valor aprovado no orçamento foi de R$ 4,96 bilhões. O entendimento final dos consultores do Congresso foi de que a verba relativa ao fim da propaganda partidária, calculada em R$ 800 milhões, já estava incorporada no orçamento da Justiça Eleitoral, que também serviu de base para o montante.
Após a mudança, integrantes do governo ainda apontaram uma brecha para que o fundo eleitoral tivesse que ser fixado em R$ 5,7 bilhões, mesmo após governo e Congresso terem fechado o acordo para deixar o "fundão" em R$ 5 bilhões. O projeto altera o dispositivo da LDO para estabelecer que o cálculo de referência é um teto, e não um valor fixo.